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Na semana passada, o Federal Reserve de Nova York publicou um texto em seu blog sobre o "erro de 1937", um prematuro aperto fiscal e monetário que interrompeu a trajetória de recuperação econômica e prolongou a Grande Depressão. Como aponta Gauti Eggertsson, autor do post (e com quem já trabalhei em algumas pesquisas), as condições atuais da economia norte-americana – produção crescente e aumento de alguns preços, mas nível de desemprego ainda muito alto – são bem parecidas com aquelas apresentadas em 1936-37. Assim, será que as autoridades políticas e econômicas cometerão o mesmo erro?

Eggertsson diz que não e que os economistas de hoje são mais bem informados. Eu discordo. Na verdade, sob alguns aspectos importantes, os Estados Unidos já repetiram o erro de 1937. Foi o erro de 2010: um enfoque voltado para questões distantes do desemprego, uma abordagem cuja estupidez tem sido provada pelos recentes dados econômicos. A situação poderia estar pior, é verdade – mas há grandes chances de que ela venha mesmo a piorar.

Lá atrás, em 2009, quando o primeiro pacote de estímulos econômicos foi colocado em prática, alguns de nós alertamos que ele era muito pequeno e de duração muito curta. Os efeitos do estímulo começariam a desaparecer em 2010. Como crises fi­­nanceiras costumam ser seguidas por longos períodos de fraca atividade econômica, era improvável que, em tão pouco tempo, a economia tivesse entrado numa fase de recuperação vigorosa e sustentada. No início de 2010, já era óbvio que a preocupação fora justificada. Mesmo assim, surgiu um enorme consenso entre autoridades políticas e analistas de que nada mais deveria ser feito para criar empregos – pelo contrário, deveria haver uma guinada em direção à austeridade fiscal.

Esse consenso foi alimentado com histórias assustadoras a respeito de uma iminente perda de confiança, por parte do mercado financeiro, sobre a dívida dos EUA. Cada pequeno aumento nos juros era interpretado como um sinal de que os "justiceiros dos títulos" haviam começado o ataque. Tal interpretação era frequentemente reportada como um fato, nunca como uma hipótese duvidosa.

Por exemplo, em março de 2010, o Wall Street Journal publicou um artigo, intitulado "Medo da dívida faz taxas subirem", reportando que os juros cobrados nos títulos de longo prazo dos EUA estavam mais altos e afirmando – sem evidência alguma – que a elevação, para cerca de 3,9% ao ano, era reflexo das preocupações em torno do déficit orçamentário norte-americano. Na realidade, a alta provavelmente refletia alguns meses de bons números no mercado de trabalho, que haviam aumentado temporariamente o otimismo dos investidores.

Não interessa. Convencionou-se que o déficit, e não o desemprego, deveria ser considerado o Inimigo Público n.º 1 – algo refletido e reforçado pela cobertura jornalística, que se distanciou do desemprego e ficou concentrada em questões da dívida pública. A criação de empregos estava definitivamente fora da agenda.

Agora aqui estamos, no meio de 2011, e qual é a situação? Bem, os justiceiros da dívida continuam a existir somente na imaginação dos falcões do déficit. Os juros em títulos de longo prazo flutuam com o otimismo e o pessimismo em relação à economia. Uma recente onda de notícias ruins fez as taxas caírem para cerca de 3% ao ano, não muito acima do mínimo histórico.

O noticiário, de fato, tem sido ruim. A esperança de uma forte recuperação econômica dissipou-se junto com a eficácia do pacote de estímulos. Sim, há geração de empregos – mas num ritmo que mal consegue acompanhar o crescimento da população. O porcentual de norte-americanos adultos trabalhando, que despencou entre 2007 e 2009, praticamente não avança desde então. Além disso, os números mais recentes sugerem que até a modesta e insuficiente abertura de vagas começa a desaparecer. Portanto, como eu já disse, os EUA cometeram uma nova versão do erro de 1937, retirando o apoio fiscal cedo demais e perpetuando o alto nível de desemprego. Mas coisas piores podem ocorrer em breve.

Do lado fiscal, os republicanos exigem o corte imediato de gastos para aprovar a elevação no limite de endividamento dos EUA e evitar um calote. Caso obtenham sucesso com essa chantagem, a economia do país, já bastante enfraquecida, irá se arrastar ainda mais. Simultaneamente, um coro barulhento exige que o Fed e outros bancos centrais ao redor do mundo elevem os juros para combater uma suposta ameaça inflacionária. Como indica o artigo do Fed de Nova York, o aumento dos últimos meses em índices de preços ao consumidor – que já dão sinais de arrefecimento – refletiu fatores temporários, mas o núcleo da inflação permaneceu baixo. Economistas inteligentes como Eggertsson entendem isso. Porém, o Banco Central Europeu está aumentando as taxas de juros e o Fed está sob pressão para fazer o mesmo. Novas tentativas para ajudar a expansão econômica parecem fora de questão.

O erro de 2010 pode ser seguido por um erro ainda maior. Mesmo que isso não aconteça, o fato é que a resposta política à crise foi e continua sendo altamente inadequada. Aqueles que se recusam a aprender com o passado estão condenados a repeti-lo. É o que ocorre nos EUA. O país pode não estar atravessando uma reedição completa Grande Depressão, mas esse consolo é muito pequeno para milhões de famílias norte-americanas que sofrem num atoleiro econômico sem fim a vista.

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