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No mês de março, mais de 14 milhões de norte-americanos estavam desempregados, de acordo com a definição oficial – ou seja, estavam procurando trabalho sem conseguir encontrá-lo. Outros milhões estão tendo que se contentar com empregos de meio período, pois não acham vagas de tempo integral. E não estamos falando de dificuldades passageiras. O desemprego de longo prazo, tão raro no passado dos Estados Unidos, tem se tornado bastante comum. Cerca de 4 milhões de norte-americanos estão fora do mercado de trabalho há um ano ou mais.

Diante desse quadro desolador, esperava-se que o problema do desemprego, e o que fazer para solucioná-lo, fosse um dos principais focos da coletiva de imprensa concedida pelo presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), Ben Bernanke, na última quarta-feira. Deveria ter sido. Mas não foi.

Após a coletiva, a agência de notícias Reuters baseou-se nos comentários de Bernanke para montar uma "nuvem de palavras", representação visual da frequência com que o presidente do Fed usou certas expressões. A nuvem é dominada pela palavra "inflação". "Desemprego" aparece no fundo, em letras bem menores.

Essa ênfase equivocada não foi inteiramente culpa de Bernanke, uma vez que ele respondia a perguntas – que se concentraram muito mais na inflação do que no desemprego. Mas o enfoque é, por si só, um sintoma de como Washington perdeu interesse pelo sofrimento dos desempregados. E o Fed, que deveria adotar uma posição firme contra o erro nas prioridades, em vez disso, está se deixando levar pela multidão.

Deixem-me explicar: uma das principais responsabilidades do Fed é a gestão econômica de curto prazo. A instituição usa seu poder sobre as taxas de juro para esfriar a economia quando há superaquecimento, que aumenta o perigo de inflação, e também para aquecer os negócios quando o ambiente financeiro está frio demais, situação em que o risco de desemprego cresce. E o Fed já indicou de maneira mais ou menos explícita o que considera um cenário ideal, nem muito aquecido nem muito frio: inflação a 2% ao ano, ou um pouco abaixo disso, e desemprego em 5%, ou um pouco acima.

Mas esse é um retrato econômico que não dá sinais de que vá ocorrer tão cedo. As últimas projeções do Fed mostram inflação baixa e desemprego elevado até quando se pode prever. É verdade que a inflação de 2011 deve ficar um pouco acima da meta, mas Bernanke explicou (e eu concordo) que essa alta é temporária e está ligada à elevação no preço das matérias-primas. Os índices que medem a inflação de fundo permanecem bem abaixo da meta, e as projeções mostram que a pressão sobre os preços deve cair com força no ano que vem e continuar fraca pelo menos até 2013.

Enquanto isso, conforme já mencionei, o desemprego – apesar de abaixo do pico de 2009 – permanece devastadoramente elevado. E o Fed prevê melhora lenta nesse campo, com uma taxa de desemprego no fim de 2013 ainda por volta dos 7%. Esses dados parecem sugerir a necessidade de mais ação. Mas Bernanke indicou que já fez tudo o que podia. Por quê?

O presidente do Fed poderia ter argumentado que lhe faltam ferramentas para fazer mais, que ele e seus colegas já não têm tanto poder sobre os rumos da economia. Mas não. Pelo contrário, Bernanke afirmou que as recentes compras de títulos públicos de longo prazo feitas pelo Fed, as chamadas operações de "flexibilização quantitativa", foram eficazes. Então por que não insistir nessa medida? A resposta do presidente do Fed foi profundamente desanimadora. Ele declarou que mais intervenções desse tipo poderiam levar a uma alta inflacionária.

É preciso ter em mente que as previsões do próprio Fed mostram que a inflação ficará abaixo da meta pelos próximos anos, portanto um pouco de pressão sobre os preços seria, na verdade, algo bom – e não um motivo para evitar o combate ao desemprego. As projeções podem, é claro, estar incorretas, mas o erro pode apontar tanto para cima como para baixo.

A única maneira de compreender a aversão de Bernanke a novas medidas é dizer que ele morre de medo de estourar a meta de inflação, ao mesmo tempo em que se mostra muito menos preocupado caso o índice fique abaixo do alvo – mesmo que a inação monetária signifique condenar milhões de norte-americanos ao pesadelo do desemprego de longo prazo.

Por que isso? Para mim, o presidente de Fed está se deixando intimidar pelos "inflacionistas": os sujeitos que continuam enxergando inflação fora de controle no futuro próximo, ainda que tudo indique que eles estão equivocados. Ultimamente, esses "inflacionistas" usaram o preço do petróleo como evidência em seu favor, mesmo que – como o próprio Bernanke salientou – a cotação do produto não tenha nada a ver com a política do Fed. A forma como o barril de petróleo entrou nessa discussão levou o economista Tim Duy a sugerir, com sarcasmo, que o Fed não consegue mais atacar o desemprego "porque alguns povos do Oriente Médio estão buscando a democracia".

Eu resumiria de forma diferente: o Fed não consegue mais atacar o desemprego porque Ron Paul é hoje o presidente da subcomissão de política monetária da Câmara dos Deputados dos EUA. Esqueça a independência do Fed. E esqueça também o futuro dos norte-americanos sem emprego, cada vez mais desesperados.

Tradução: João Paulo Pimentel

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