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A mudança de posicionamento do judiciário brasileiro sobre a legalidade de download de arquivos na internet é "um marco preocupante" para a liberdade de informação, avalia o especialista em Direito Digital Luiz Henrique Souza. Nessa semana, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) ordenou que a empresa Cadari Tec­nologia da Informação, desenvolvedora do programa "K-Lite Nitro", parasse de fornecer seu produto.

O programa utiliza redes P2P (peer-to-peer), que são sistemas que permitem a conexão direta entre vários usuários da internet, facilitando a busca e troca de arquivos de música, filmes, jogos ou seriados de tevê – independentemente de os arquivos serem ou não protegidos pela lei de Direito Autoral (9.610/98). Uma das redes P2P mais conhecidas é a eDonkey, criada em 2000 na Alemanha, cujo ícone é um burrinho.

A polêmica decisão do TJ ocorreu após o agravamento de um pedido de liminar para que a empresa parasse de distribuir o seu programa. "Na prática, a decisão do desembargador Xisto Pereira está culpando a tecnologia. Essa demonização da tecnologia é perigosa para a sociedade. O que deve ser julgado é a conduta do cidadão ou da empresa. A tecnologia é neutra; é o ato de organizar a pirataria que pode ser condenável", diz Souza, que integra o escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, dedicado a questões ligadas à tecnologia.

Duas metáforas ilustram a mudança de visão da Justiça. Até então, a tecnologia era considerada neutra, porque pode ser utilizada para fins lícitos ou ilícitos a partir da intenção do usuário, equiparando-se a um fabricante de facas – um produto que pode ser utilizado para o bem (na culinária, por exemplo) ou para o mal (como arma branca em um ato ilícito). Já o desembargador, ao conceder a liminar, preferiu comparar o software a um bar que comercializa ao mesmo tempo refrigerantes e entorpecentes. Sendo o primeiro legal e o segundo ilegal, "é evidente que se impõe a cessação de toda atividade como forma de terminar a conduta ilegal", diz em sua fundamentação. "É uma jurisprudência perigosa", ressalta Souza.

Ainda segundo o especialista, a resposta para as questões relativas à pirataria não deve ser jurídica, e sim promovida pela revisão do modelo de negócios online. Ele compara a decisão do TJ-PR com uma promovida em abril pela corte sueca, que responsabilizou os responsáveis pelo site indexador de torrents (uma tecnologia de P2P) The Pirate Bay pela violação de direitos autorais. Assim como no programa paranaense, o site não hospedava os arquivos protegidos, mas organizava o "conteúdo sensível" para a ação dos usuários. "Nos dois casos, a acusação fez um estudo aprofundado, com farta produção de provas, no qual comprovou-se que a empresa lucrava indiretamente com a pirataria."

O advogado Carlos Hapner, que representa a Associação Protetora dos Direitos Intelectuais Fonográficos (Apdif) na ação, confirmou que foi fundamental para a decisão o fato de a principal fonte de renda da empresa Cadori ser a publicidade on-line, obtida com o volume de visitas ao site da empresa. "Ele explora a tecnologia para obter lucro com lesões financeiras a terceiros. Explorar P2P não é errado, o problema é o vínculo do enriquecimento ilícito baseado no empobrecimento do artista", diz Hapner, referindo-se aos direitos autorais não pagos.

O empresário Nelson Cadori, réu na ação, confirmou à reportagem que a principal receita da empresa provém dos acessos ao site iplay (www.iplay.com.br), página de "entretenimento e publicidade on-line", que hospeda jogos. Antes da proibição,o software K-Lite Nitro também estava disponível para download no site.

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