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Funcionários da Volvo em greve: setor automotivo é um dos mais atingidos pela crise. | Suelen Lima/Simec
Funcionários da Volvo em greve: setor automotivo é um dos mais atingidos pela crise.| Foto: Suelen Lima/Simec

O resultado ruim do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, que será divulgado pelo IBGE na próxima sexta-feira (29), ainda não é o fundo do poço da crise que o país enfrenta. A debilidade da atividade econômica deve se acentuar neste segundo trimestre, antes de iniciar uma curva de recuperação para, apenas em 2016, ser superada.

A retração da economia neste primeiro semestre se deve a uma combinação de confiança baixa e cortes de gastos públicos, refletida em indicadores ruins de inflação, produção industrial, desempenho dos setores de comércio e serviços, e níveis de emprego. Na última semana, o Banco Central divulgou que o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), considerado uma prévia do resultado do PIB, recuou 1,98% no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período de 2014.

A lentidão com que o ajuste fiscal está sendo feito e a expectativa de inflação ainda acima da meta de 4,5% para 2016 estão atrasando a retomada, que deve vir somente quando os juros caírem. O saneamento das contas públicas tem sido dificultado pela rebelião política do Congresso, que está exigindo esforços intensos do governo para aprovar iniciativas como a Medida Provisória (MP) 665, que restringe o pagamento de seguro-desemprego e é considerada vital para o ajuste fiscal.

Este ano ‘já foi’. Nossa avaliação é de que a atividade econômica só deve exibir uma melhoria mais nítida na virada deste ano para o próximo

Fernando Sampaio, diretor de macroeconomia da LCA Consultores.

Deve piorar

A visão corrente entre os analistas é de que os efeitos desses problemas tendem a se intensificar nos próximos meses. “O pior está por vir. No segundo trimestre, devemos ver números mais negativos do que os atuais. Acredito que teremos recessão mais profunda, com aumento do desemprego. Estamos em plena ladeira abaixo”, opina o economista Mauro Rochlin, professor de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O contingenciamento de despesas de R$ 70 bilhões do governo federal anunciado na última sexta-feira (22) deve ser outro fator a retardar o reaquecimento da economia, na opinião do ex-diretor do BC e atual chefe da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas. “Teremos forte contração de gastos do governo e, provavelmente, juros ainda mais altos, o que deve fazer do segundo trimestre ainda mais difícil para a chamada ‘economia real’, que envolve emprego, indústria e comércio”, diz.

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Uma série de indicadores econômicos tem mostrado resultados ruins em abril, quando se inicia o novo trimestre. É o caso do Índice de Confiança da Indústria, medido pela FGV, que recuou sucessivamente em abril e maio, chegando ao menor patamar da série histórica. Já a venda de veículos caiu ao menor nível do ano em abril – o setor passa por um período de ajustes como o que está ocorrendo na Volvo, em Curitiba, onde há mais de uma semana uma greve paralisa a produção. A companhia cortou um turno de trabalho e quer fazer um acordo para evitar demissões.

Isso se reflete na expectativa do mercado, condensada no Relatório Focus, divulgado pelo Banco Central (BC) e que indica expectativa de que o PIB se contraia 1,2% este ano, para crescer 1% em 2016. “Este ano ‘já foi’. Nossa avaliação é de que a atividade econômica só deve exibir uma melhoria mais nítida na virada deste ano para o próximo”, diz Fernando Sampaio, diretor de macroeconomia da LCA Consultores, que projeta PIB trimestral negativo de 1,9%, sobre o igual período de 2014.

Recuperação depende de queda dos juros

Os dois elementos decisivos para a recuperação da economia são inflação e juros, que estão diretamente relacionados. A política monetária tem sido conduzida no sentindo de combater a alta de preços. Quando a inflação começar a retroceder, haverá margem para que os juros caiam, melhorando o ambiente de negócios e restaurando a expectativa dos agentes econômicos.

O maior problema foi o represamento de preços administrados, sob responsabilidade estatal, como os de luz e gasolina, que criaram um grande passivo, repassado de uma única vez aos consumidores. “O governo deixou que a inflação fugisse do controle e, agora, é necessário ter austeridade na politica monetária. O Banco Central tem discurso forte de que a taxa de juros seguirá alta enquanto for necessário, e isso complica a atividade econômica”, explica José Kobori, professor de finanças do Ibmec/DF.

O mercado acredita que as ações de combate à inflação tendem a surtir efeito, permitindo o relaxamento dos juros. A Selic atual está em 13,25% ao ano e, conforme a expectativa do mercado, deve recuar para 11,75% no próximo ano. O movimento acompanharia o recuo da inflação, hoje em 8,31% (percentual acumulado em 12 meses) e com perspectiva de cair para 5,50% ao fim de 2016.

Outro elemento que pode estimular a recuperação é o novo patamar do dólar, que se apreciou – após anos em um nível considerado excessivamente baixo para a economia doméstica. Isso ajuda a indústria nacional, já que torna mais caros itens importados.

O perfil de endividamento do governo também é visto como um alento. “Não nos parece que estamos entrando em uma nova fase de instabilidade, como em meados dos 1980 e 1990. Naquela ocasião, tínhamos reservas de divisa muito baixas; e, agora, o BC está bem servido. Então, o problema de falta de dólares não está colocado, e isso simplifica a resolução dos problemas”, avalia Fernando Sampaio, diretor de macroeconomia da LCA Consultores.

Iniciativa privada demanda novas concessões

Os esforços para controlar a inflação e promover ajuste fiscal são importantes, mas considerados insuficientes pelo mercado para devolver o dinamismo à economia nacional. “O governo tem de fazer o ajuste, mas não pode esperar terminá-lo para estimular o aumento de competitividade das empresas; senão, nossa recuperação vai demorar muito”, afirma o gerente de pesquisa e competitividade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca.

Uma das ações consideradas prioritárias é retomar a concessão de projetos à iniciativa privada, por meio de parcerias público-privadas (PPPs). “O setor de infraestrutura tem claramente demanda reprimida. O governo precisa disciplinar projetos que a interessem, como os de portos, aeroportos, estradas e usinas”, diz o economista Mauro Rochlin, Professor de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Ele teme, porém, que isso não ocorra, em razão de pressões internas do PT. “O partido parece entender que o que está sendo feito apenas é um remendo transitório, como se nada realmente precisasse ser mudado na política econômica”.

Outras medidas consideradas importantes são a aprovação de regras mais flexíveis para a terceirização de mão de obra, conforme projeto que tramita no Senado; e a redução da burocracia, em diferentes níveis da atividade produtiva. A CNI trabalha com uma agenda de demandas bastante ampla, mas considera esses pontos os mais factíveis, neste momento. “Hoje, é mais fácil avançar nos projetos de infraestrutura, porque se usaria dinheiro privado, e trabalhar contra a burocracia, pois o governo reduziria os próprios gastos e também se beneficiaria”, opina Fonseca.

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