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Dicas

Conheça algumas orientações da jornalista na internet

• Se a lista de ingredientes é longa e recheada de termos como emulsificante, espessante e corante, o produto tem altos teores de imitações e pouca comida.

• Chocolate de verdade tem gosto de cacau, que é deliciosamente amargo e muito mais saudável que os doces que o mercado chama de chocolates.

• Pare de se preocupar (como a maioria dos brasileiros) em ser mimado por marcas "famosas". Produtos de qualidade são os que mostram transparência e boa composição, não os mais caros ou conhecidos.

• Aventure-se cozinhando em casa em vez de comprar alimentos industrializados. É a melhor forma de ter certeza do que você está comendo. Que saber quantos morangos tem um iogurte de "morango"? Impossível, a indústria não informa.

Fonte: www.youtube.com/docampoamesa e www.umaequilibrista.com.

Um pote de sorvete pode ter mais "imitadores" de alimentos que comida de verdade. A palavra requeijão trata de uma receita original que não é mais seguida pelas fábricas. Apesar do nome, néctares de fruta têm apenas 30% de fruta. Informações como essas estão nos vídeos da jornalista Francine Lima, 37 anos, no YouTube. O canal Do Campo à Mesa tem menos de três meses e mais de 16 mil inscritos – o vídeo do requeijão foi visto 10 mil vezes em quatro dias. O segredo não é superprodução, mas conteúdo. Francine grava em câmeras de celular e edita os vídeos sozinha.

Tudo começou quando ela decidiu levar para a internet o que tem aprendido no mestrado em Saúde Pública da USP. O objetivo da dissertação é desvendar o discurso de "saúde" nas embalagens dos alimentos. A conclusão aponta para a vulnerabilidade do brasileiro ao apelo das embalagens, que buscam mascarar dados importantes enquanto chamam atenção para aspectos nebulosos dos produtos. Para Francine, a linguagem das embalagens induz o consumidor ao erro, por mais que a indústria siga a legislação.

"Um ‘enriquecido’ bem grande desvia a atenção da quantidade de açúcar e gordura vegetal hidrogenada de um biscoito", exemplifica. Ou seja: o lugar de ilustrações e promessas é na frente; no verso, fica a lista de ingredientes que define o produto. "Por que é assim? Porque fica bom para o fabricante", diz Francine, para quem as reguladoras estão mais próximas das marcas que dos consumidores.

Que alimento tem a maior discrepância entre o rótulo e o que é entre­­gue ao consumidor?

O problema não é tanto o que é dito, mas como é dito. Veio gente argumentar [no YouTube] que os rótulos seguem as normas. É verdade. Mas o consumidor não conhece a legislação. Tento mostrar que ela permite que rótulos sejam pouco claros. Exemplo: na embalagem dos néctares de laranja, há imagens de laranjas frescas. A legislação deixa claro o que é néctar, mas isso não garante que o consumidor entenda, por vários motivos: 1) Essa definição não é perene. Era para ter mudado em 2012, passou para 2016. Atualmente néctar é água, açúcar e 30% de fruta. Em 2016 será 50% de fruta. O que é néctar hoje não será em 2017. 2) Não está escrita na embalagem. 3) A imagem da fruta promove uma associação imediata, e pela imagem não é possível distinguir entre suco e néctar. Parece tudo igual.

Qual foi a situação que mais sur­­preendeu?

A piora nas normas para composição de chocolates e pães integrais. Ainda estou tentando descobrir como deixaram acontecer. Houve um afrouxamento das exigências de 1978 para os anos 2000, creio que em benefício da indústria, uma vez que os ingredientes que ela usa agora são mais baratos. É inacreditável que em 1978 só podia ser chamado de integral o pão que tivesse pelo menos 50% de farinha integral e que hoje existam pães quase inteiramente refinados com um "integral" no rótulo.

E qual a maior ilusão do brasileiro em relação a alimentos?

O brasileiro confia de forma exagerada nas marcas conhecidas. A publicidade é bem-sucedida em criar essa imagem de cuidado com as pessoas, e o consumidor médio simplesmente acredita.

As dúvidas deveriam ser levadas a órgãos de defesa do consumidor?

Sim, pode ser um caminho importante. É preciso manifestar o descontentamento. Se ficarmos quietinhos consumindo tudo que o mercado de alimentos nos oferece, nem as empresas nem o governo verão necessidade de torná-lo mais honesto. Empresas mudam quando ameaçadas pelo bolso. O governo, pelo voto.

Como aprender a ler rótulos?

Ignore o que chama a atenção – figuras, cores e letras grandes – e vá direto à lista de ingredientes, que está sempre em ordem decrescente de quantidade. A lista é pequena? Os ingredientes são conhecidos e vendidos no supermercado? Dá para saber o que é o produto? Dá para fazer igual em casa? São perguntas relevantes.

Qual a maior mudança a ser feita na regulamentação das embalagens?

Bato na tecla da linguagem. A informação que interessa vem em termos técnicos, números, tabelas, que só quem estudou as regras entende. E as alegações que desviam a atenção vêm coloridas, ilustradas, acompanhadas de bichinhos, fotos de gente bonita, promessas de felicidade, numa linguagem que todo mundo entende. Desproporcional, não? Minha hipótese é que as informações que interessam – formulação do produto, seu grau de processamento, teor de comida que ele tem em relação ao de imitação – é que deveriam ser apresentadas de forma interessante.

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