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| Foto: KIRSTEN LUCE/NYT

Durante a noite, Juan Piñeda López escuta o zumbido de uma turbina eólica a pouco menos de 300 metros da sua casa de barro. Às vezes chega até ele um cheiro ruim do lubrificante que escapa do mastro do gerador.

Não fosse por isso, conta Piñeda, a floresta de turbinas que surgiu nos últimos anos nas planícies do estado de Oaxaca, no sul do México, praticamente não o afetaria. E esse é justamente o problema.

Oito anos depois de o México entrar de vez na luta contra o aquecimento global, dando início à construção de inúmeras turbinas eólicas no Istmo de Tehuantepec, em Oaxaca, pessoas em comunidades indígenas pobres se dividem em relação aos benefícios da revolução verde.

Alguns estão até abandonando projetos verdes. Os mais de mil habitantes de Juchitán de Zaragoza, cidade de maioria zapoteca a cerca de 32 quilômetros da casa de López, em La Ventosa, impediram a construção de uma das maiores fazendas eólicas da América Latina nos arredores da cidade.

O caso destaca a necessidade de encontrar um equilíbrio entre a busca por energia limpa e as preocupações com as pessoas que são donas das terras onde essa energia é produzida, afirmou Beatriz Olivera, engenheira que durante muitos anos esteve à frente da campanha contra o aquecimento global no Greenpeace México. Ela acrescentou que “queríamos energia eólica, mas não a qualquer preço”.

Em La Ventosa, uma cidade tranquila de quatro mil habitantes e ventos tão poderosos que muitas vezes são capazes de fazer caminhões tombarem, o boom energético deixou suas marcas. Mais de uma dúzia de pequenas empresas que construíram a infraestrutura necessária para as fazendas eólicas surgiram nos últimos oito anos. Em muitas ruas, sobrados modernos se misturam a casas mais precárias.

A Iberdrola, empresa espanhola que é dona da fazenda eólica atrás da casa de Piñeda, pavimentou estradas e construiu sistemas de esgoto, como parte dos projetos sociais que custaram mais de um milhão de dólares na região, de acordo com um porta-voz da empresa.

Cosme Vera, agricultor que aluga 40 hectares para a Iberdrola por US$2.900 ao mês, reformou a casa e comprou aparelhos de ar condicionado para os quartos. Vera, de 69 anos, afirmou que o aluguel pago pela Iberdrola é quatro vezes maior do que ele ganha com a produção de sorgo. “Meu trabalho agora é ir uma vez por mês ao banco para pegar o dinheiro”, afirmou.

Mas nem todo mundo teve a mesma sorte. As fazendas eólicas criam um grande número de empregos durante a construção, mas muito menos depois que começam a funcionar, afirmam especialistas e moradores da região.

Quem não é dono da terra, não recebe aluguel – incluindo Piñeda, que é agricultor. A rua onde vive não tem asfalto e a casa de dois cômodos não tem água encanada. Ele atrasou tantas vezes a conta de luz que a empresa de eletricidade cortou sua energia há oito meses.

“Nós achamos que todos se beneficiariam, fossem donos de terras, ou não”, afirmou Piñeda, de 52 anos.

Liliana López, moradora de Oaxaca: energia eólica ainda convive com a pobreza local.

KIRSTEN LUCE/NYT

Liliana López, de 40 anos, que colhia buganvílias na frente da casa vizinha à de Piñeda, disse que a fazenda eólica foi “boa para o vilarejo, mas não para nós”. Seu marido e seus filhos trabalham na Cidade de Oaxaca, afirmou, já que era impossível encontrar trabalho na região.

Assim como outras pessoas da cidade, ela fez uma lista dos supostos efeitos colaterais das fazendas eólicas: pessoas com alergia e tosse, falta de água subterrânea e vacas que não dão mais cria. O preço de produtos básicos – de alimentos a carrinhos de mão – aumentou, de acordo com as pessoas da cidade. Além disso, os vizinhos entraram em conflito, afirmou Liliana: “Todo mundo quer uma fatia do bolo”.

Desde 2004, os investidores já colocaram mais de US$ 9 bilhões nas fazendas eólicas do México, de acordo com Leopoldo Rodríguez, presidente da Associação Mexicana de Energia Eólica. A capacidade energética das fazendas eólicas de Oaxaca, que ficam a um raio de pouco mais de 30 quilômetros de La Ventosa, passou de 160 megawatts em 2008 para 2.360 megawatts em 2015, o suficiente para alimentar centenas de milhares de casas o ano todo. A capacidade em Oaxaca deve aumentar para mais de 5.500 megawatts em 2018.

Esses objetivos foram negativamente afetados em outubro do ano passado depois que os membros de uma comunidade indígena zapoteca em Juchitán foram capazes de impedir que a Energía Eólica del Sur, um consórcio que inclui o Macquarie Mexican Infrastructure Fund, parte de um banco de investimentos australiano, construísse uma fazenda eólica de 400 megawatts em terrenos rurais nos arredores da cidade.

Lucila Bettina Cruz Velázquez, ativista que se opôs ao projeto, afirmou que alguns dos moradores da região temiam que a fazenda eólica ferisse o gado, os pássaros migratórios e os morcegos, além de não quererem que as turbinas atrapalhassem a vida na cidade.

“Eles vêm e mudam nossa paisagem. Cortam nossas árvores e atrapalham a agricultura.”

O processo aberto pela comunidade argumentava que o governo não havia consultado corretamente o povo indígena de Juchitán sobre o projeto eólico, uma obrigação de acordo com a lei de hidrocarbonos de 2014. O governo quebrou essa regra ao emitir autorizações para a Eólica del Sur ainda durante a fase de consulta pública, afirmava o texto.

Advogados de direitos humanos e especialistas também afirmam que a consulta pública falhou em outros aspectos: as regras não eram claras, nem todos os documentos foram traduzidos para o zapoteca, e os ativistas foram ameaçados por pessoas aliadas aos políticos locais ou ao consórcio.

Um representante da Eólica del Sur na Cidade do México não respondeu a tentativas de contato. Katya Puga Cornejo, diretora de avaliação de impacto social do Ministério de Energia do México, afirmou que as autoridades realizaram mais de 40 reuniões públicas ao longo de oito meses para debater o projeto.

A fazenda eólica foi aprovada durante uma assembleia realizada em julho de 2015, afirmou.

O futuro da Eólica del Sur agora depende da justiça. Um juiz deu parecer favorável ao governo em junho, mas o grupo indígena apelou. O julgamento final pode demorar semanas, ou mesmo meses, de acordo com Ricardo Lagunes, advogado envolvido no caso.

Alguns habitantes da região, incluindo Jose López de la Cruz, de 52 anos, esperam que o projeto seja reiniciado. López, que é engenheiro em La Ventosa e trabalha em fazendas eólicas desde 2008, perdeu o emprego, junto com 70 outros trabalhadores, assim que o projeto foi engavetado.

“As pessoas são muito pobres. Muitas estão contando com a renda da Eólica del Sur”, disse ele.

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