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Robô que faz a soldagem de cascos de navios e plataformas: inovação de empresa paranaense espera pela carta-patente há sete anos | Antônio More/ Gazeta do Povo
Robô que faz a soldagem de cascos de navios e plataformas: inovação de empresa paranaense espera pela carta-patente há sete anos| Foto: Antônio More/ Gazeta do Povo

Pedidos paranaenses aguardam há mais de 10 anos na fila

Alguns inovadores paranaenses exemplificam bem todas as consequências desta demora. Uma nova tecnologia para diminuir a rejeição nos transplantes de coração está licenciada por empresas americanas e inglesas, tem sido testada há alguns anos em mesas de cirurgias de todo o mundo, mas aguarda desde 1998 a carta-patente do Inpi. "Isso não impede que a tecnologia evolua, mas é uma chancela que falta para uma inovação fundamental para a vida de muitas pessoas", explica Eduardo Agustinho, coordenador de Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia da Agência PUCPR, onde a tecnologia foi desenvolvida.

A mesma aflição é compartilhada pelo engenheiro mecânico Augusto Cintra. Ele espera desde 2002 uma resposta do instituto sobre um braço robótico com articulações múltiplas para o conserto de motores de veículos leves. "É complicado, porque você fica totalmente sem ação se depende exclusivamente daquela invenção para seguir seu trabalho", afirma Cintra, que ficou quatro anos em busca de investidores para sua inovação. "Depois eu decidi tocar trabalhos paralelos, pois não teria condições de esperar", completa.

Sem parar

Apesar da demora ser prejudicial, a falta de uma patente não inviabiliza totalmente um negócio inovador, afirma o engenheiro mecatrônico Ricardo Artigas Langer, que aguarda desde 2007 a resposta da patente de um robô que faz soldagem de cascos de navios e plataformas. "Nós temos o registro e ninguém nunca contestou a legitimidade da inovação. Vamos tocando os nossos negócios enquanto esperamos a carta-patente", completa.

Examinador brasileiro analisa 13 vezes mais inovações do que norte-americano

O volume imenso de pedidos e a falta de pessoal para analisar os documentos é o principal motivo para o Brasil ter um dos processos mais demorados do mundo. O Inpi tem um plano de contratações e metas para abater parte da fila histórica nos registros de patentes. No início do ano, o instituto autorizou a realização de um concurso para 250 examinadores – o que dobraria o corpo técnico do órgão. O ideal, segundo a direção do Inpi, seria triplicar o efetivo, saltando para 750 técnicos.

Hoje, o deficit no número de funcionários é flagrante. De acordo com um relatório da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), um examinador do órgão norte-americano de propriedade intelectual e registros de patentes analisa 71 processos por ano. Na Europa, a proporção é de um examinador para 91 pedidos. No Brasil, a falta de funcionários faz com que o mesmo examinador tome conta de 980 pedidos.

A diferença do número de contratados para o número ideal é tão grande, que o tempo de espera só cresce. Em 2009, uma patente esperava, em média, nove anos para obter uma resposta. Hoje são 11 anos.

Com um concurso já autorizado, o objetivo do Inpi é incorporar os novos funcionários ainda em 2014 para, no ano que vem, já ter a capacidade de aprovar e negar processos no mesmo volume do que os recebidos. A projeção, caso as contratações forem efetuadas ainda este ano, é a de que sejam registradas 50 mil entradas de pedidos de patentes.

Risco

O instituto mesmo considera que o ‘backlog’ – nome técnico para a fila de processos – é bastante prejudicial para o ambiente inovador do país. Segundo o Inpi, o atraso provoca o aumento dos custos de transação nas atividades de inovação, insegurança jurídica e enfraquecimento do sistema brasileiro de propriedade intelectual.

O Brasil tem hoje uma fila de mais de 180 mil inovações à espera de uma avaliação para saber se receberão um registro de patente ou não. Na prática, isso significa uma espera média de 11 anos para que as invenções brasileiras sejam chanceladas pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi). A demora, além de paralisar alguns negócios de pequenas e médias empresas que dependem das aprovações para tocarem seus negócios, desestimula a veia empreendedora de muitos brasileiros.

INFOGRÁFICO: Fila de patentes cresce ano após ano

A lentidão tem uma série de causas: a aprovação dos processos demora pela falta de ferramentas mais ágeis no instituto e pelo déficit de funcionários aptos para analisar os pedidos. Na outra ponta, cada vez mais empresas e empreendedores abrem processos de registro de patentes, pressionando ainda mais a demanda por respostas. No final das contas, ano após ano, o Inpi consegue liberar cerca de 15 mil pedidos, enquanto outros 30 mil entram no final da fila.

A demora não é uma exclusividade brasileira, mas a fila do país é especialmente maior que as demais. "No mundo inteiro, é natural que uma invenção demore quatro ou cinco anos para ser patenteada. Acontece que hoje temos que agilizar um grande número de processos muito antigos em espera", afirma o coordenador de Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia da Agência PUCPR, Eduardo Agustinho. Em alguns setores, as esperas são ainda maiores. "Na área de telecomunicações, uma invenção demora 14 anos para ter a patente aprovada. As inovações agroquímicas levam cerca de 12 anos. Quando a carta patente é registrada, a tecnologia já está obsoleta e isso desestimula o empreendedor", completa Agustinho.

No final das contas, toda a cadeia produtiva é prejudicada pela lentidão, inclusive os concorrentes. Como uma patente é protegida por um período de 10 a 20 anos, o tempo que ela fica parada aguardando a liberação trava o desenvolvimento de todo o setor. "Este período de análise é contabilizado, mas mesmo assim existe este limite mínimo de 10 anos para proteger o inventor, mesmo que ela fique 30 anos sendo analisada", explica o analista de tecnologia e inovações do Tecpar, Rodrigo Silvestre.

Proteção

Além da falta de corpo técnico para a análise, o aumento da demanda por proteção da propriedade intelectual também é um empecilho para que este gargalo seja sanado. "Exemplo de inovações muito bem sucedidas levaram a uma obsessão pela garantia dos direitos de uma invenção, o que é totalmente legítimo e saudável para uma economia dinâmica. O problema é que as instituições demoraram muito tempo para se atentar a isso", afirma o diretor da gerenciadora de fundos para inovação Go2, Marcos Galeano.

Segundo ele, o número de pedidos tende a crescer exponencialmente com o passar dos anos, especialmente com a alta na demanda interna. "Hoje, mais da metade dos pedidos são feitos por empresas estrangeiras. Com o fomento da inovação no Brasil, os pedidos de empreendedores brasileiros vão pressionar ainda mais este cenário", completa.

Sem Saída

As patentes não são a única maneira de garantir a propriedade intelectual de uma invenção. "Existem maneiras de se cercar, mas o processo inteiro no Brasil é bastante lento", diz Eduardo Agustinho, da PUCPR. O registro de marcas também é uma forma de garantir a propriedade intelectual de uma inovação, mas tem hoje uma fila ainda maior do que o registro de patentes: são 500 mil marcas aguardando uma resposta.

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