• Carregando...
Aprovação da PEC na Câmara envolveu negociação da equipe de Lula com presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Aprovação da PEC na Câmara envolveu negociação da equipe de Lula com presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).| Foto: Joédson Alves/EFE

O Congresso Nacional promulgou, na noite de quarta-feira (21), a proposta de emenda à Constituição (PEC) 32/2022, a PEC fura-teto, no limite do prazo necessário para ter efeito sobre o Orçamento de 2023, aprovado nesta quinta (22). Desde que foi apresentado pela equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o texto passou por um processo de desidratação em meio a negociações da base de apoio do futuro governo com parlamentares para a sua aprovação.

Entenda a seguir os principais pontos da tramitação, dos objetivos e das consequências da aprovação da PEC fura-teto, chamada de PEC da Transição pelo governo eleito.

O que é o teto de gastos

O teto de gastos foi instituído em 2016, durante o governo de Michel Temer (MDB), por meio da Emenda Constitucional 95, como a principal âncora fiscal do país. A regra limita o crescimento das despesas do governo aos mesmos valores gastos no ano anterior, corrigidos apenas pela inflação – o que significa "congelar" o Orçamento, em termos reais.

O objetivo era controlar o crescimento da relação dívida/PIB, após três anos consecutivos – até então – de déficit primário. Originalmente, a validade da medida era de 20 anos, mas o texto previa uma revisão, por meio de lei complementar, na metade desse prazo, ou seja, em 2026.

Qual o objetivo da PEC fura-teto

A equipe de Lula apresentou a PEC fura-teto com a justificativa de que a peça orçamentária enviada pelo atual governo ao Congresso era inviável para a execução de uma série de políticas públicas a partir de 2023.

A ideia, então, foi propor uma emenda à Constituição que retirasse do alcance da regra do teto de gastos uma série de despesas, a principal delas a execução do programa Bolsa Família (atual Auxílio Brasil), de modo a permitir a manutenção da parcela mínima de R$ 600 e o pagamento de um adicional de R$ 150 para crianças de até seis anos de famílias beneficiárias do programa.

Como era a proposta da equipe do futuro governo

A minuta do texto, divulgada pelo vice-presidente eleito e coordenador da transição, Geraldo Alckmin (PSB), no dia 16 de novembro, previa excepcionalizar da âncora fiscal, de forma permanente, os recursos necessários para o Bolsa Família de R$ 600, estimados em R$ 175 bilhões.

Como o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023 já reserva R$ 105,7 bilhões para o Auxílio Brasil, com parcela de R$ 405, o espaço fiscal adicional serviria para recompor verbas para outros programas sociais, como o Farmácia Popular e o Minha Casa Minha Vida.

Além disso, o texto liberava da regra um porcentual do excesso de arrecadação de 2022 para investimentos públicos em 2023 – a verba é limitada a 6,5% da receita extraordinária de 2021, ou aproximadamente R$ 23,9 bilhões –, totalizando R$ 198,9 bilhões em recursos adicionais para o Orçamento do próximo governo no ano que vem.

Doações para programas federais socioambientais e relativos a mudanças climáticas, além de despesas de instituições federais de ensino custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios celebrados com empresas ou outros entes da federação também ficariam excluídas da regra do teto.

A proposta previa excluir da regra fiscal ainda despesas custeadas com recursos de operações financeiras com organismos multilaterais dos quais o Brasil faz parte, desde que destinados a financiar ou garantir projetos de investimento em infraestrutura.

Como ficou o texto promulgado pelo Congresso

Antes mesmo de ser protocolada no Senado, a proposta foi criticada por opositores e pelo mercado financeiro, que a interpretaram como uma licença excessiva para gastos, que acabaria com os efeitos práticos da regra do teto e impulsionaria o crescimento da relação dívida/PIB.

Para conseguir as assinaturas de senadores necessárias para que a proposta começasse a tramitar, a base petista aceitou estabelecer um prazo de quatro anos para a excepcionalização do Bolsa Família do teto de gastos. O relator da proposta no Senado, Alexandre Silveira (PSD-MG), também fez uma mudança na forma como a âncora fiscal seria contornada: em vez de tirar o orçamento do programa social dos limites do teto, o senador ampliou artificialmente a "altura" do teto em R$ 175 bilhões.

Ainda no Senado, a vigência caiu de quatro para dois anos e, no plenário da Câmara, para um ano. Além disso, os R$ 175 bilhões de ampliação artificial do teto foram reduzidos para R$ 145 bilhões ao longo da tramitação.

As despesas que foram excluídas do teto (parte do excesso de arrecadação para investimentos públicos, doações a programas socioambientais e receitas próprias de instituições de ensino) são permanentes, sem prazo para acabar.

Em um ganho para o PT, um dispositivo acrescentado durante a discussão na Comissão de Constituição e Justiça do Senado permitirá que a União utilize recursos parados em contas do PIS/Pasep para realização de investimentos públicos. Em agosto, a Caixa informou haver R$ 24,6 bilhões em cotas dos programas.

Por outro lado, na Câmara, foi retirado do texto artigo que excluía do alcance do teto investimentos em infraestrutura executados com recursos de operações com organismos multilaterais. Opositores à proposta viam o dispositivo como uma “licença ilimitada” para gastos com empréstimos de instituições internacionais.

Como o espaço fiscal aberto pela PEC será utilizado

Relator-geral do Orçamento de 2023, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) detalhou, após a aprovação da PEC no Senado, como serão aplicados os R$ 145 bilhões abertos com a medida.

Para manter o Bolsa Família em R$ 600 e pagar o adicional de R$ 150 para crianças de até seis anos, serão destinados R$ 75 bilhões em complementação aos R$ 105 já previstos. Para o aumento do salário mínimo acima da inflação, serão utilizados R$ 6,8 bilhões.

Entre os ministérios, o que mais deve receber recursos a partir da promulgação da Emenda Constitucional 126 é o da Saúde (R$ 22,7 bilhões), seguido de Educação (R$ 11,2 bilhões), Desenvolvimento Regional (R$ 9,5 bilhões) e Ciência e Tecnologia (R$ 4,9 bilhões).

Além disso serão destinados R$ 5,7 bilhões para encargos financeiros da União, e R$ 3 bilhões devem ir para reserva de contingência. Outras pastas que serão contempladas incluem Turismo (R$ 3,7 bilhões), Economia (R$ 1,7 bilhão), Agricultura (R$ 934 milhões), Justiça (R$ 800 milhões), Meio Ambiente (R$ 536 milhões), Defesa (R$ 500 milhões), Trabalho e Previdência (R$ 400,6 milhões), Mulher (R$ 250 milhões) e Comunicações (R$ 126,4 milhões).

Outros R$ 35 milhões deve ir para dotações da Presidência da República, enquanto o Banco Central receberá R$ 10 milhões.

Os R$ 23,9 bilhões liberados do excesso de arrecadação de 2022, assim como os valores parados em contas do PIS/Pasep, devem ser destinados exclusivamente a investimentos públicos.

O que mais prevê a PEC

O texto também prorroga até o fim de 2024 a Desvinculação de Receitas da União (DRU), mecanismo que permite ao governo federal o uso livre de 20% de todos os tributos federais vinculados a fundos ou despesas.

Outro trecho prevê a instituição de um novo regime fiscal por meio de lei complementar, a ser proposta pelo presidente da República até 31 de agosto de 2023. Esse regime vai substituir o teto de gastos.

Na fase de tramitação na Câmara, após o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar inconstitucional as emendas de relator ao Orçamento, foram incluídos na PEC dispositivos que redistribuem os R$ 19,4 bilhões que iriam para o chamado orçamento secreto.

Como a PEC abre caminho para o fim do teto de gastos

Ao permitir a criação de um novo arcabouço fiscal por meio de lei complementar, a emenda constitucional facilita o fim da atual regra do teto de gastos, uma vez que, para ser aprovado, um projeto de lei complementar precisa do voto favorável de 257 deputados e 41 senadores.

No caso de uma mudança por emenda constitucional, seria necessária a assinatura de 171 deputados ou 21 senadores para apresentação de proposta, além do apoio de 308 deputados e 49 senadores em dois turnos de votação nos plenários da Câmara e no Senado.

Logo após a aprovação da PEC na Câmara, o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou que pretende enviar o projeto ainda no primeiro semestre do ano que vem, para que o Congresso possa ter “pelo menos seis meses” para se debruçar sobre o tema.

Como a PEC beneficia o governo Bolsonaro

Como a Emenda Constitucional 126 entra em vigor já a partir da data de publicação, ou seja, esta quinta-feira (22), a liberação do equivalente a 6,5% da receita extraordinária de 2021 para investimentos públicos, as receitas próprias instituições de ensino e as doações a programas socioambientais abrangem também o atual ano fiscal.

Assim, calcula-se que cerca de R$ 23 bilhões podem ficar fora do teto de gastos e disponíveis para serem utilizados ainda em 2022. A aplicação dos recursos pode aliviar o governo de Bolsonaro, que enfrenta dificuldades para fechar as contas ao fim do mandato e já anunciou uma série de contingenciamentos para não ultrapassar o limite de despesas.

O que mudou na PEC após o fim das emendas de relator

Após o STF declarar inconstitucionais as emendas de relator, um acordo entre a equipe de Lula, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e lideranças partidárias incluiu na PEC uma redistribuição dos R$ 19,4 bilhões que iriam para o chamado orçamento secreto.

Um dos artigos estabelece a destinação de R$ 9,85 bilhões para “emendas para ações voltadas à execução de políticas públicas”, que caberão ao relator-geral do Orçamento de 2023, Marcelo Castro. Os R$ 9,55 bilhões restante serão distribuídos para emendas individuais de deputados e senadores, que têm natureza impositiva.

Cada deputado passou a ter R$ 32 milhões para indicação de emendas, enquanto os senadores passaram a ter R$ 59 milhões cada.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]