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Milhares de gregos festejaram o resultado das urnas diante do Parlamento: resgate da auto-estima. | Marko Djurica/Reuters
Milhares de gregos festejaram o resultado das urnas diante do Parlamento: resgate da auto-estima.| Foto: Marko Djurica/Reuters

Os gregos votaram em massa neste domingo (5) pela rejeição do pacote de resgate ao país, arriscando a própria ruína financeira em uma demonstração de resistência que pode fragmentar a União Europeia (UE). Com 94,49% dos votos no referendo apurados (por volta das 20 horas de Brasília), os números oficiais marcavam que 61,3% dos gregos votaram no “não” – contra a atual oferta de resgate ao país – e 38,7% no “sim”.

Europeus agendam reuniões de emergência para debater situação

  • bruxelas

O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, confirmou que os chefes de governo dos países da zona do euro vão se reunir na noite desta terça-feira (7), em Bruxelas (Bélgica), para discutir as consequências da rejeição de novas medidas de austeridade fiscal pelos eleitores da Grécia.

Já o gabinete do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, disse que ele, Tusk, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, e o presidente do Eurogrupo (conselho de ministros das Finanças da zona do euro), Jeroen Dijsselbloem, vão realizar uma teleconferência na manhã desta segunda-feira (6). Juncker “está em consultas com os líderes democraticamente eleitos dos outros 18 países membros da zona do euro”, diz o comunicado.

Dijsselbloem disse que o resultado do plebiscito é “muito lamentável para o futuro da Grécia” e que vai esperar por novas iniciativas do governo grego para discutir a questão da dívida do país. Ele anunciou que o Eurogrupo também vai se reunir na terça.

A surpreendente e robusta vitória do “não” derrubou as pesquisas de opinião, que previam um resultado muito parelho. Ela também deixa a Grécia à deriva em águas desconhecidas: arriscando a ruína financeira, o isolamento político dentro da zona do euro e o colapso bancário se os credores negarem ajuda daqui em diante.

Mas para milhões de gregos o resultado foi uma mensagem raivosa aos credores de que a Grécia não pode mais aceitar repetidas rodadas de austeridade que, em cinco anos, deixaram um em cada quatro pessoas sem emprego no país. O primeiro-ministro, Alexis Tsipras, denunciou que o preço a se pagar pela aceitação do resgate seria “chantagem” e “humilhação” nacional.

Em pronunciamento, Tsipras afirmou que o referendo deste domingo marcou uma página virada na história da Grécia e que a democracia “não pode ser chantageada”. Ele disse que seu governo está pronto para voltar imediatamente com as negociações com os credores nesta segunda-feira (6). O premiê afirmou que o referendo deu mandato para que o governo alcance uma solução viável para a situação financeira do país e que não há saídas simples, mas sim que há saídas justas desde que ambos os lados da mesa de negociação queiram isso.

Efeitos no brasil

Os efeitos do resultado do referendo grego no Brasil serão poucos e temporários, segundo especialistas. A Grécia tem peso pequeno na economia mundial e juros altos no Brasil protegem a economia de uma fuga de capitais. “O real pode se desvalorizar um pouco, mas a taxa de juros muito elevada compensa a aversão a risco”, afirma Luís Afonso Lima, da Mapfre Investimentos. Algum nervosismo no mercado financeiro pode ser esperado, na opinião do diretor do Centro de Economia Mundial da FGV, Carlos Langoni. “Não vejo impacto nem no dólar.”

“Não à austeridade”

Membros do governo da Grécia, que disseram que o “não” reforçaria a capacidade do país de assegurar um melhor acordo com os credores internacionais após meses de discussão, imediatamente disseram que iriam trabalhar para recomeçar as conversas com os parceiros europeus.

“O ‘não’ de hoje é um não à austeridade. É um retorno aos valores da Europa. O não é um grande sim à Europa democrática”, afirmou o ministro para ressaltar que o resultado do referendo é “uma grande ferramenta de colaboração com os sócios europeus”, disse o ministro de Finanças Yanis Varoufakis.

O integrante do partido governista da Grécia, Syriza, e membro do parlamento europeu, Dimitris Papadimoulis, afirmou que o “povo grego está provando que quer permanecer na Europa” de maneira igualitária, e “não como uma colônia da dívida”.

Águas turbulentas

A vitória do “não” põe a Grécia e a zona do euro em águas nunca antes navegadas. Incapaz de pegar emprestado dinheiro dos principais mercados, a Grécia agora tem uma das dívidas públicas mais altas do mundo.

tira dúvidas

Entenda quais são as consequências do resultado do referendo na crise grega:

O que significa a opção pelo “não” no referendo popular?

Ao votar “não”, os gregos decidiram recusar a proposta de acordo para renegociar sua dívida feita pelos credores, que em contrapartida exigiam do país aumento de impostos, corte de gastos e reforma profunda no sistema de previdência.

O que acontece agora?

A Grécia pode deixar a zona do euro. Seu destino no bloco começa a ser discutido nesta terça (7), em Bruxelas. O primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, deve participar.

Bilhões de euros foram injetados na economia grega e não funcionaram. O que os gregos querem agora?

O governo grego fez dois pedidos na terça-feira passada (30). O primeiro, já recusado, é que o atual programa de ajuda fosse estendido. Este programa garantiria o acesso do país a 7,2 bilhões de euros, dinheiro importante para pagar o funcionalismo e os credores externos – inclusive a dívida de 1,6 bilhão de euros com o FMI, que venceu na terça. A segunda proposta é que eles tenham acesso aos fundos do programa europeu de ajuda lançado em 2012. Os europeus ainda vão analisar esse pedido.

Não seria mais fácil dar logo os 7,2 bilhões de euros?

Esse dinheiro está congelado há quase um ano porque os credores exigem que a Grécia cumpra sua parte nas reformas prometidas. A interpretação é que entregá-lo seria um mau exemplo não só para a Grécia, mas também para outros países, que futuramente poderiam, à base de ameaças, receber dinheiro sem garantir as contrapartidas.

Por que a crise grega parece não ter fim?

A crise da economia grega, como a de outros países europeu, começou em 2008, na esteira da crise americana e ganhou contornos próprios no ano seguinte, quando foi descoberto que o país maquiava as contas públicas. Sua dívida, na verdade, era muito maior. Desde então, apesar dos programas de resgate (ou por causa deles, segundo seus críticos), a economia não conseguiu engrenar: o desemprego permanece alto (25,6%) assim como a dívida pública (177% do PIB).

Gregos comemoram o ‘não’ como expressão da dignidade nacional

  • ATENAS

Dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas de Atenas na noite deste domingo (5) para comemorar a vitória do “não” no referendo sobre a aceitação das medidas de austeridade fiscal exigidas pelos credores internacionais da Grécia. A praça Syntagma, diante do Parlamento, foi se enchendo à medida que saíam os resultados parciais da votação. Eleitores comuns, tanto jovens como idosos, líderes sindicais, parlamentares que apoiam o governo e até ministros se reuniram na praça para comemorar. “Não, não, não”, gritavam os manifestantes, portando bandeiras da Grécia e faixas com dizeres como “vote ‘não’ por um país livre”.

Varvaram Papadimitriou, 46 anos, mãe de cinco filhos, disse não ter medo do que virá a seguir. “Não pode ficar pior do que já está agora. Independentemente do que acontecer, sinto orgulho e dignidade. Tsipras é o melhor”, acrescentou, referindo-se ao primeiro-ministro Alexis Tsipras, do partido de esquerda Syriza, que convocou o plebiscito e fez campanha pelo “não”.

A reunião na praça logo virou uma festa, com as pessoas bebendo cerveja e dançando em círculos. Por volta da meia-noite, as pessoas dançavam ao som da música-tema do filme Zorba, O Grego.

“Nosso lugar na zona do euro nunca esteve e nunca estará em risco”, disse Giorgios Dermitzakis, de 53 anos. “Ninguém pode voltar as constas a uma nação. Um acordo melhor é necessário e os outros povos europeus vão exigir isso”, afirmou a professora Maria Athanasaki, 34 anos.

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