O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sugeriu que existe uma "jogada ensaiada" entre governo e Petrobras, na qual a estatal reduz preços para atenuar o impacto de aumentos de imposto. Um movimento assim estaria programado para julho, repetindo o que ocorreu em março.
Na quarta-feira (17), Haddad disse que o novo reajuste de PIS e Cofins dos combustíveis, previsto para o início de julho, será compensado por uma queda de preço nas refinarias da Petrobras. Segundo ele, a empresa poderia ter feito toda a redução já nesta semana, mas teria optado por um corte mais suave. Assim, afirmou o ministro, ela manteve uma "gordura" que será usada mais adiante.
“O aumento [da tributação] previsto para 1.º de julho vai ser absorvido por uma queda no preço, que foi deixada para esse dia", disse o ministro em audiência na Câmara dos Deputados. Em seguida, ele usou a primeira pessoa para comentar a decisão da Petrobras: "Nós não baixamos tudo que podíamos [no preço], justamente esperando o 1.º de julho, quando acaba o imposto de exportação e o ciclo de reoneração, assim como vai acontecer com o diesel no final do ano, e já deixou uma gordura para acomodar a reoneração".
A declaração sinalizou uma submissão da estatal aos interesses do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), apenas um dia depois de a empresa mudar sua estratégia comercial e abandonar a paridade "obrigatória" com o mercado internacional. Na terça-feira (16), o próprio Lula disse que a decisão de "abrasileirar" os preços cumpria uma promessa de campanha, ainda que o presidente da estatal, Jean Paul Prates, tenha afirmado não haver "intervenção absolutamente nenhuma" do governo na estatal.
A fala de Haddad reacendeu em investidores o temor de uso da Petrobras para fins políticos e levou a uma queda nas ações. As preferenciais, mais negociadas, caíram 2,43%. A companhia se viu obrigada a mandar um comunicado ao mercado horas depois, afirmando que "não antecipa decisões de reajustes" e que "não há nenhuma decisão tomada por seu Grupo Executivo de Mercado e Preços (GEMP) que ainda não tenha sido anunciada ao mercado".
Embora seja controlada pela União, a Petrobras é uma empresa de economia mista, com sócios privados, listada em bolsas de valores e fiscalizada por órgãos como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A companhia tem de seguir o próprio estatuto e a Lei das Estatais, que impõem respeito a condições de mercado e vedam manipulações de preço.
No dia seguinte, Haddad tentou minimizar o que disse aos deputados, afirmando que "quem faz a política de preços da Petrobras é a Petrobras". Segundo ele, a comparação com o mercado internacional indicava que o espaço para reduzir o preço local "era maior do que o anunciado".
Porém, estimativa da Abicom, a associação dos importadores, indica que a gasolina brasileira passou a custar 4% menos que a comercializada no Golfo do México. Segundo outro cálculo, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o combustível no Brasil agora está 15% abaixo dos parâmetros internacionais.
Em março, Petrobras baixou preços no mesmo dia em que o governo elevou impostos
Embora Haddad tenha relativizado o que disse na Câmara, meses atrás ele fez declarações parecidas. Afirmou que um "colchão" permitia diminuir ou elevar o preço dos combustíveis, e que ele poderia ser utilizado como uma "contribuição" da Petrobras.
E, de fato, em 1.º de março a empresa baixou preços no mesmo dia em que o governo começou a restabelecer as alíquotas de PIS e Cofins dos combustíveis. A soma dos dois tributos federais subiu de zero para R$ 0,47 por litro, ao passo que o litro da gasolina nas refinarias baixou R$ 0,13.
O plano do ministro da Fazenda é restabelecer a "alíquota cheia" de PIS/Cofins em julho, o que levaria a um aumento de R$ 0,22 por litro na gasolina. Não se sabe o que ocorrerá com a tributação do etanol, uma vez que meses atrás o governo informou que daria tratamento privilegiado ao derivado da cana.
Até meados do ano passado, os dois tributos federais somavam R$ 0,69 por litro de gasolina e R$ 0,24 no etanol. Eles foram zerados até dezembro, por determinação do então presidente Jair Bolsonaro (PL). Em seu primeiro dia de mandato, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prorrogou o benefício até fevereiro e, em março, deu início à reoneração.
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