
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem aos líderes do G20 o grupo dos países mais ricos do mundo que eles precisam "recuperar o espírito de cooperação e solidariedade" que existia na primeira reunião, há dois anos, em um reconhecimento tácito de que as divergências internas ameaçam a coesão do grupo.
"Quando nos reunimos há dois anos em Washington, enfrentávamos a maior crise do capitalismo desde 1929. Naquela ocasião, transmitimos ao mundo determinação e firmeza. Precisamos recuperar o espírito de cooperação e solidariedade daquele G20", declarou o brasileiro no discurso que proferiu durante jantar com presidentes e primeiros-ministros do grupo em Seul.
Lula defendeu que os líderes das 20 maiores economias globais deem prioridade ao debate da guerra cambial, que se manifesta em uma corrida de desvalorizações de mo edas por países que tentam estimular seu crescimento pela ampliação de sua fatia no comércio mundial. "Essa guerra exacerbará a crise sem produzir vencedores. Só haverá perdedores", disse Lula, que se sentou ao lado do presidente da China, Hu Jintao.
Sem citar a política de expansão monetária dos Estados Unidos, o brasileiro ressaltou que os países emergentes "ameaçados pelo fluxo de capital especulativo e pela valorização de suas moedas são obrigados a adotar medidas defensivas".
Na negociação que antecedeu ao encontro de líderes, o Brasil pressionou para que o comunicado que será assinado hoje contemple a restrição da entrada de recursos externos por países que sofrem valorizações excessivas de suas moedas. Em outras palavras, pede anuência para o controle de capitais.
No discurso, o presidente ressaltou que o real se valorizou 80% em relação às moedas de seus principais parceiros comerciais e defendeu regimes cambiais flexíveis, que reflitam os fundamentos da economia.
Em entrevista coletiva concedida pouco antes do jantar, Lula propôs que integrantes do G20 consultem seus parceiros do grupo antes de adotarem políticas macroeconômicas que possam afetar o resto do mundo. "Não dá para cada um tentar resolver seus problemas sem levar em conta os reflexos na política dos outros países."
E exemplificou: "A economia americana está desvalorizando o dólar, a economia chinesa faz a mesma coisa com a sua moeda e isso prejudica os concorrentes". Um dos grandes desafios do G20, segundo ele, é encontrar uma solução adequada para as distorções geradas pelas políticas das duas maiores economias do planeta. "Não dá para continuar do jeito que está, com esse desequilíbrio cambial. Não dá."
"Nova" moeda
O presidente disse ser inevitável a discussão sobre a redução do peso do dólar como moeda nas transações internacionais e como reserva de valor, proposta anteontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. "O dólar não pode mais continuar sendo a única moeda de referência se ele é feito por um único país."
Entretanto, no Brasil, o próprio presidente do Banco Central disse ver restrições em relação à proposta, afirmando não haver volume suficiente de outras moedas ou de DES (Direitos Especiais de Saque, "moeda usada pelo FMI) para essa substituição. "Seria algo desejável o proposto pelo ministro [Mantega]. Mas, para que isso aconteça, teria de haver um acordo global para criar um volume suficiente de DES.



