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Às vésperas do lançamento do Plano Real, o então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, recebeu Luiz Inácio Lula da Silva e José Dirceu, ambos então na alta direção do PT, para explicar o plano e pedir apoio. "Eles perguntaram se havia algum risco de o PSDB disputar com o PT a Presidência", contou Fernando Henrique. "Eu disse que não. Nunca imaginei que iria disputar, muito menos que pudesse ganhar".

O episódio contado por Fernando Henrique fez parte de uma série de 12 depoimentos de ex-ministros da Fazenda sobre os desafios que enfrentaram no cargo. Eles foram colhidos durante o seminário Desenvolvimento econômico: crescimento com distribuição de renda, realizado para comemorar os 200 anos do Ministério da Fazenda.

O painel traçado por Delfim Netto, Ernane Galvêas, Francisco Dornelles, Luiz Carlos Bresser-Pereira, Zélia Cardoso de Mello, Marcílio Marques Moreira, Paulo Haddad, Fernando Henrique Cardoso, Rubens Ricupero, Ciro Gomes, Pedro Malan e Antonio Palocci mostra a penosa batalha contra a inflação. Seguem resumos dos principais depoimentos.

DELFIM: SEM MILAGRE - As fortes taxas de crescimento econômico do Brasil entre o fim dos anos 60 e início dos 70 não foram um milagre, mas fruto de um trabalho planejado, afirmou o ex-ministro Delfim Netto. "Não caiu nada do céu." Foi, segundo ele, a combinação de condições objetivas favoráveis e expectativas positivas. "É quando aqueles que trabalham acreditam naqueles que fazem discurso e vão trabalhar", explicou Naquela época, o governo reduziu os juros. Os prazos de recolhimento de tributos foram alongados, de forma que o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) era recolhido a cada 150 dias. Além disso, o sistema tributário foi reformado. "Não há desenvolvimento econômico sem um Estado indutor", disse o ex-ministro.

GALVÊAS: O DIABO A FAVOR - Coube a Ernane Galvêas pilotar a economia na transição do País do milagre econômico para um Brasil estagnado em razão da crise do petróleo e o choque de juros nos Estados Unidos. "Quando assumi, parecia que tudo estava errado", contou Galvêas. "Estávamos com o diabo trabalhando a nosso favor." Entre 1981 e 1983, o PIB brasileiro encolheu 6%.

ZÉLIA: CONFISCO E ABERTURA - Nenhum cidadão brasileiro que era adulto em março de 1990 esquecerá o dia em que seu dinheiro foi confiscado pelo governo. Mas essa medida extrema, que marcou o Plano Collor, foi só um pedaço de um programa maior, que procurou modernizar a economia. Essa foi a explicação da ex-ministra Zélia Cardoso de Mello. Além do congelamento, ela adotou outras medidas, como iniciar a abertura econômica, eliminando o chamado Anexo C, que proibia a importação, entre outras coisas, de automóveis e televisores.

MARCÍLIO: NO IMPEACHMENT - Marcílio Marques Moreira foi responsável por duas tarefas aparentemente contraditórias: manter a economia nos trilhos, impedindo a explosão inflacionária, ainda que à custa de taxas de juros cavalares, e, ao mesmo tempo, permitir que a Receita e o Banco Central investigassem denúncias de corrupção contra o então presidente Fernando Collor de Mello. Engolfado pela crise, Collor afastou-se do dia-a-dia da administração. Coube a um grupo de ministros, entre eles Marcílio, Celso Lafer (Relações Exteriores) e Célio Borja (Justiça) amarrar um "pacto de governabilidade". Toda a equipe comprometeu-se a ficar até o último dia do governo. "Do contrário, poderíamos ter conseqüências trágicas, num momento em que a democracia ainda era frágil", disse.

FHC: NA HORA CERTA - O Plano Real deu certo principalmente "porque o Brasil estava cansado de inflação", disse Fernando Henrique. Foi graças ao consenso sobre a necessidade de acabar com a inflação que foi possível começar a desindexar a economia. Mas por pouco o real não saiu do papel. Para dar certo, ele precisava também da confiança da comunidade internacional, pois o País enfrentava dificuldade de acesso a financiamentos externos. O problema é que o Fundo Monetário Internacional (FMI) não quis dar apoio formal. A situação foi remediada pelo então diretor-gerente da instituição, Michel Camdessus, que escreveu uma carta "dando a impressão que o plano era bom."

MALAN: HERANÇA BENDITA - A obrigação de um governo é entregar ao sucessor um país um pouco melhor do que o que recebeu. Essa tarefa foi cumprida pelo governo Fernando Henrique Cardoso e será cumprida por Luiz Inácio Lula da Silva, disse Pedro Malan, que ficou oito anos no cargo e é recordista pelo critério de governos democráticos. A derrota da hiperinflação pelo Plano Real impôs a Malan e equipe outro desafio: estruturar a economia para viver sem inflação. "O atual governo - não quero desmerecer - se beneficia dessa herança, que na minha opinião não tem nada de maldita", disse.

MANTEGA: UM DOS MELHORES MOMENTOS DA HISTÓRIA - Superado o problema da inflação, o desafio do governo Lula foi engatar um ciclo de crescimento sustentado. Essa foi a razão do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). "A expressão vôo de galinha saiu do dicionário", disse Mantega. Ele destacou o aumento do emprego, entre outros, e reconheceu que o cenário global impõe novos desafios. "Mas temos uma vantagem: um mercado interno robusto."

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