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A partir de quinta-feira, mais de 23 milhões de brasileiros farão seu acerto de contas anuais com a Receita Federal e, apesar das recentes correções na tabela do Imposto de Renda, sentirão uma mordida maior do Leão. Estudo da consultoria Ernst & Young mostra que esses reajustes nem de longe corrigiram as distorções provocadas pelos anos de congelamento da tabela. Hoje, o peso do IR é até 60% maior, para as famílias de classe média, do que há dez anos. Quando se compara a tabela do imposto com o salário mínimo, que subiu acima da inflação nos últimos anos, a diferença é ainda maior.

Em 1996, quem ganhava oito salários-mínimos era isento de IR. Hoje, já entra na faixa de renda da alíquota maior do imposto, de 27,5%. Há 11 anos, o salário mínimo era de R$ 112 e, atualmente, está em R$ 350. Isso significa ganhos reais, ou seja, descontada a inflação, de mais de 50%. A tabela do IR, porém, seguiu na direção contrária: foi corrigida abaixo da variação dos preços.

— A tabela não acompanhou a inflação e muito menos o reajuste do mínimo — afirma Frederico Good God, gerente sênior da Área Tributária da Ernst & Young.

João Saboia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, destaca que o mínimo subiu muito acima da inflação como parte de uma política salarial do governo, num período em que, na média, o trabalhador teve perda de renda. Por isso, como a tabela do Imposto de Renda ficou congelada entre 1996 e 2001, era de se esperar que a comparação entre a renda em salários mínimos e o IR mostrasse esse descompasso.

Segundo estimativas da Unafisco, o sindicato de auditores fiscais da Receita, mesmo com os recentes reajustes na tabela do IR, no ano passado (referência para a declaração que será feita agora), a defasagem frente ao avanço da inflação desde 1996 ainda era de 47%.

Hoje, quem ganha oito salários mínimos (R$ 2.800), paga 27,5% de IR sobre a faixa superior de sua renda. A tabela do imposto é progressiva. Assim, os primeiros R$ 1.313,69 do salário são isentos de IR. Uma faixa intermediária do rendimento paga 15% de alíquota e o restante, 27,5%. Ou seja, na prática, a alíquota efetiva para quem ganha oito mínimos é de 8,74%.

O estudo da Ernst & Young mostra que foi nas famílias com renda hoje próxima a essa faixa que o imposto efetivo mais cresceu. Quem ganhava R$ 1.400 em 1996, por exemplo, era descontado em 5,36% por mês de IR. Esse mesmo trabalhador, caso tenha obtido a reposição da inflação em seus dissídios salariais, hoje ganha R$ 2.685,10 e paga 8,78% de IR — ou seja, uma alta de tributação de mais de 60%.

— É um confisco disfarçado. Como a correção da tabela não acompanhou a alta da inflação, a Receita impõe um pagamento a maior para os contribuintes. Ou, no caso de quem recebe restituição, o valor devolvido ficou proporcionalmente menor — explica Gilberto Braga, professor de Planejamento Tributário do Ibmec-RJ.

A família do médico Luiz São Thiago sente isso no bolso a cada ano. A mulher de Luiz, Margareth, conta que além do peso cada vez maior da tributação, a família sofre com as regras para declaração de dependentes. Pai de seis filhos, dos quais quatro ainda vivem em sua casa, Luiz só pode declarar três deles como dependentes, porque os mais velhos superaram o limite de idade.

— Nosso filho Fernando já tem mais de 24 anos, mas ainda estuda, faz pós-graduação e vive conosco. Porém, para a Receita, não é dependente. Hoje em dia, o jovem demora mais a se posicionar no mercado de trabalho. Nosso filho mais velho, que é médico, fez três anos de residência e nesse período já não podíamos declará-lo como dependente — queixa-se Margareth.

A dona-de-casa reclama ainda dos limites baixos para deduzir gastos com educação (a partir de 2007, serão R$ 2.480 por ano) e de não ser possível incluir nessa cifra despesas corriqueiras das famílias de classe média, como cursos de inglês. Tania Baraldi, diretora de Recursos Humanos da Ernst & Young, afirma que a situação vivida pela família de Luiz e Margareth é cada vez mais comum.

— Os filhos estão ficando mais tempo na casa dos pais. E o limite de dedução anual para educação é muito baixo, mal dá para pagar o valor de duas mensalidades escolares.

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