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Patinando

Mercado de trabalho pode levar mais de uma década para retornar ao nível pré-crise

Fila do emprego: milhares de pessoas fizeram fila na Praça Rui Barbosa, em Curitiba, em busca de vagas de emprego ofertadas em um mutirão  de empresas com oportunidades abertas. | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Fila do emprego: milhares de pessoas fizeram fila na Praça Rui Barbosa, em Curitiba, em busca de vagas de emprego ofertadas em um mutirão de empresas com oportunidades abertas. (Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo)

Quase dois anos após o fim da recessão, o mercado de trabalho brasileiro ainda pena para recuperar o desempenho do período pré-crise. E tudo indica que isso vai mesmo demorar. O ritmo de fechamento de postos desacelerou em 2017 e o saldo voltou a ficar positivo em 2018, mas esse desempenho está longe de reverter o estrago feito nos dois piores anos da crise, em 2015 e 2016, quando três milhões de empregos formais foram fechados. Para piorar, a economia não engrenou e o recuo da taxa de desemprego veio acompanhado do aumento de trabalhadores informais e por conta própria.

Os números dão a dimensão do problema. Do final de 2014 ao início de 2017, a taxa de desemprego saltou de cerca de 7% para 13,7%. Mesmo hoje, depois de o pior já ter passado, a taxa está em 11,9%. Isso significa que há 12,4 milhões de brasileiros desempregados, segundo dados do terceiro trimestre de 2018 da Pnad Contínua, do IBGE. Antes da crise, por exemplo, o contingente de desocupados somava aproximadamente sete milhões de pessoas.

O recorte por idade é ainda mais dramático. A taxa de desocupação entre pessoas aptas a trabalhar que têm entre 25 e 39 anos é de 34,7%, quase três vezes a taxa nacional, de 11,9% no terceiro trimestre de 2018. No grupo dos jovens entre 18 e 24 anos, o índice é de 32,6%.

Segundo João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o cenário, infelizmente, ainda é muito ruim. Estamos vivendo hoje, segundo ele, as consequências de dois anos terríveis — 2015 e 2016 — para o mercado de trabalho, com um salto na taxa de desemprego e a destruição de milhões de empregos formais que vamos levar anos para recuperar.

A recessão acabou oficialmente no último trimestre de 2016, mas seus efeitos ainda permanecem. Em 2017, a economia parou de cair e o desemprego desacelerou, mas a informalidade que estava em queda antes da crise voltou a crescer com força. Foi um ano perdido para o mercado de trabalho formal, com saldo líquido negativo de 12 mil vagas com carteira assinada.

O ano de 2018 também não entregou o que prometia. Ele chega ao fim com uma pequena melhora no mercado formal, porém, longe de significar uma retomada robusta do emprego. A taxa de desemprego caiu de 13,1% para 11,9% entre o primeiro e o terceiro trimestre do ano. Mas a economia não engrenou e a queda da taxa se deu a um custo altíssimo, que é o crescente aumento da informalidade e do trabalho por conta própria, argumenta Sabóia. Além disso, diante da falta de perspectiva de encontrar um emprego, muitas pessoas deixaram de procurar trabalho, contribuindo para “melhorar” a estatística.

Atualmente, os trabalhadores informais representam 41% do contingente de ocupados do país, ou seja, 38 milhões de pessoas não possuem carteira assinada ou CNPJ. O número é maior do que o estoque de trabalhadores com carteira assinada, que recuou para 33 milhões no terceiro trimestre deste ano, segundo dados da Pnad Contínua. Para o IBGE, informais são os trabalhadores do setor privado e domésticos sem carteira assinada; empregadores e trabalhadores por conta própria sem CNPJ e trabalhadores familiares auxiliares.

Metade desse contingente de 38 milhões de informais é composto por brasileiros que trabalham por conta própria, especialmente em posições mais precárias da economia. Ao todo, 5,3 milhões de pessoas entraram para esta posição depois do início da crise, em 2014, e se depararam com condições ainda piores. A remuneração média de quem virou conta própria depois do início da crise, por exemplo, caiu 33% em relação ao rendimento dos trabalhadores que estavam há mais tempo nesse tipo de ocupação, segundo levantamento do Dieese feito com base nos dados de 2017 da Pnad Contínua, do IBGE.

Reação da economia é o combustível do emprego formal

Somente o crescimento robusto do emprego formal, com a criação de postos mais qualificados e com mais proteção social, é capaz de conter o avanço da informalidade. Por outro lado, só o crescimento econômico consistente pode dar conta da geração de empregos formais em quantidade suficiente para reduzir a taxa de desemprego e a informalidade. Por enquanto, essa não é a realidade: o ritmo de contratações com carteira assinada tem sido muito lento, compatível com a retomada da economia.

A geração de vagas formais, medida pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), voltou a ficar positiva em 2018. De janeiro a outubro, foram criadas 790 mil vagas formais, com destaque para os meses de abril, agosto e setembro.

O desempenho parece bom, mas quando se descontam os fatores sazonais, com flutuações decorrentes de particularidades de cada mês, o saldo líquido de 2018 fica próximo de 300 mil vagas formais, ressalta o economista Marcelo Gazzano, da consultoria ACPastore. Ele lembra ainda que novembro costuma ser um mês de saldo zero e dezembro, de demissões. Com isso, a projeção já com o dado dessazonalizado é fechar o ano com um saldo líquido próximo de 600 mil vagas.

Esse ritmo de geração de vagas mensais ajuda a reduzir a taxa de desemprego, porém, muito lentamente, explica Gazzano. “Para que a taxa de desemprego fique constante [no atual patamar de 12%], é necessário que haja uma criação mensal superior a 30 mil vagas. Acima disso reduz a taxa e abaixo, aumenta a taxa de desemprego”.

Mantido esse ritmo, a taxa de desemprego deve cai algo próximo de 0,5 ponto porcentual por ano. Ou seja, o mercado de trabalho levaria cerca de 12 anos para voltar a uma taxa de desemprego pré-crise, de cerca de 6% em 2014, segundo Gazzano, e recuperar os três milhões de empregos formais perdidos durante a crise, entre meados de 2014 e o final de 2016.

“Eu não consigo ver como podemos melhorar essa questão [desemprego e informalidade] sem a geração de empregos formais. Para que isso ocorra, contudo, não podemos continuar crescendo 1% ao ano se perdemos 7% em 2015 e 2016. É muito frustrante. Nesse ritmo, levaremos anos para voltar ao nível pré-crise”, diz Saboia.

Os especialistas são unânimes: a retomada do mercado de trabalho formal depende da recuperação da economia. Contudo, os indicadores mostram que ela deve ser lenta. Em 2017, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu pela primeira vez desde 2014, mas apenas 1%. Neste ano, as projeções iniciais que estimavam um crescimento de até 2,5% foram revisadas para algo entre 1% e 1,5%.

Com base nesta tendência de recuperação lenta, a ACPasctore manteve no terceiro trimestre do ano a projeção de um crescimento do PIB em torno de 1% em 2018 e espera o resultado oficial do PIB do terceiro trimestre deste ano para refazer a projeção de 2019, inicialmente em 2,5%.

O Itaú Unibanco revisou a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para baixo: de 2018 de 1,7% para 1,3% e de 2,5% para 2%, em 2019. Com isso, o banco reviu, para cima, a taxa de desemprego, chegando a 12,3% no final de 2018 e 12,1% no final de 2019.

Retornar ao nível pré-crise no mercado de trabalho, segundo especialistas, é algo que vai demorar. Saboia e Gazzano concordam que a velocidade da recuperação será ditada pelo desempenho da economia em 2019 e, especialmente pela realização de reformas importantes para devolver a confiança a quem pode gerar os empregos formais que o país precisa.

Segundo Gazzano, não há dúvida de que a reforma da Previdência é prioritária. “Nosso principal problema é fiscal, por isso o ponto de partida precisa ser uma grande reforma na Previdência. Trata-se de área em que os gastos continuam a crescer porque a população brasileira está envelhecendo, então, a única saída é fazer uma reforma”, diz.

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