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Alexandre Silveira e Lula: ministro de Minas e Energia conduz agenda ao gosto do presidente, com pressão sobre a Petrobras para baixar preço dos combustíveis, críticas ao mercado e tentativa de baixar conta de luz.
Alexandre Silveira e Lula: ministro de Minas e Energia conduz agenda ao gosto do presidente, com pressão sobre a Petrobras para baixar preço dos combustíveis, críticas ao mercado e tentativa de baixar conta de luz.| Foto: Tauan Alencar/MME

Desafiando a fama popular de que mineiro "come quieto", o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, conseguiu ganhar espaço no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com gestos e muitas declarações bem ao gosto do presidente.

Sua agenda inclui discursos e medidas para forçar a queda de preços de combustíveis e energia elétrica "na marra" e a exigência de aumento nos investimentos da Petrobras, independentemente de seu retorno financeiro. São questões muito caras ao PT e à esqueda – muito embora o ministro seja filiado ao PSD, uma das siglas identificadas com o chamado "Centrão".

Silveira está à frente de uma das pastas estratégicas do governo. Assume uma das bandeiras da atual gestão, a transição energética, ao mesmo tempo em que defende a exploração de petróleo na Margem Equatorial. E tenta aliviar um dos calos mais sensíveis na popularidade do presidente, a conta de luz.

Ainda que não seja tão conhecido do grande público, o ministro aparece quase todos os dias em jornais e redes sociais. Fala muito sobre o potencial do país em energias renováveis e promete desde o ano passado uma reforma estrutural no setor elétrico, mas por ora só anunciou uma redução circunstancial na conta de luz, à custa da antecipação de créditos – e que pode ter "efeito rebote" na sequência, segundo especialistas.

Mas sua maior demonstração de poder se deu em confrontos com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates. Nesses embates, que incluíram cobranças públicas de redução nos preços dos combustíveis e críticas aos lucros da estatal, Silveira se alinhou à agenda populista de Lula – em oposição à postura do petista Prates, vista por seus críticos como submissa aos interesses de acionistas privados e do mercado como um todo.

Na recente disputa em torno dos dividendos da Petrobras, o ministro criticou o mercado e afirmou que as empresas estatais têm um "dever social com o Brasil". "Não podemos admitir que a Petrobras tem um único e exclusivo objetivo de ter lucros exorbitantes para poder distribuir aos seus acionistas", disse. O presidente da Petrobras defendia a distribuição de parte dos dividendos extraordinários, que primeiro foi rejeitada e dias atrás acabou aprovada.

A forte pressão exercida nos bastidores por Silveira – e também pelo ministro-chefe da Casa Civil, o petista Rui Costa – por pouco não resultou na demissão de Prates. Depois de semanas de tensão, o próprio Silveira veio a público jogar água na fervura, mas ficou evidente sua influência sobre Lula – que em nenhum momento de toda a controvérsia declarou apoio a Prates.

Do Transporte em Minas Gerais para o Senado; do Senado para a Esplanada

O ministro de Minas e Energia é bacharel em Direito e tem 52 anos. Natural de Belo Horizonte, ainda jovem foi dono de loja de móveis e depois trabalhou em um escritório de contabilidade. Aprovado em concurso público, tornou-se delegado da Polícia Civil em 1998.

Em 2003, a convite do vice-presidente José Alencar, assumiu uma coordenação do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e, no ano seguinte, foi nomeado diretor-geral do órgão por Lula.

Elegeu-se deputado federal em 2006 e conseguiu a reeleição quatro anos depois. Em 2014, foi eleito primeiro suplente do senador mineiro Antônio Anastasia. Em 2022, Silveira se tornou senador quando Anastasia renunciou ao Senado para ser ministro do Tribunal de Contas da União (TCU).

Silveira chegou a ser convidado duas vezes pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) para ser líder do governo no Senado, mas recusou. Mais tarde, fez aliança com o PT. Em 2023, se tornou ministro de Minas e Energia.

Silveira promete reforma, mas só anunciou redução provisória na conta de luz

A transição energética é uma das principais bandeiras desta gestão. Contudo, embora muitos projetos tenham sido apresentados até agora, poucos foram os movimentos concretos.

Silveira promete desde o ano passado uma ampla reestruturação no setor elétrico. Segundo ele, a reforma servirá para organizar a "colcha de retalhos" do setor e "equalizar a questão tarifária" a fim proteger os "consumidores mais frágeis". Mas o país segue sem conhecer o projeto.

O que houve até agora foi uma medida provisória para reduzir a conta de luz. Um dia depois da assinatura da MP, Lula se reuniu com representantes do setor elétrico e pediu que seja apresentado ainda este ano um novo programa energético para reduzir a tarifa de forma estrutural.

Ou seja, apesar das reiteradas promesas do ministro, que em outubro chegou a dizer que o projeto de reforma estava pronto, o governo parece ainda estar na fase de formar grupos de trabalho para discutir o futuro do setor.

O governo publicou uma Medida Provisória, a MP 1.1212, para reduzir a conta de luz dos brasileiros de 3,5% a 5%. O texto, porém, não traz muitas informações, o que já é um problema e traz incerteza e margem até mesmo em relação a futuros custos ao consumidor.

A MP busca antecipar, de uma só vez, valores que a Eletrobras privatizada repassaria ao longo de duas décadas, e que serviriam para amortecer reajustes na conta de luz.

O dinheiro antecipado será usado para quitar juros e dívidas contraídas pelo setor nos últimos quatro anos, período da pandemia e da escassez hídrica. Como será usado de uma vez, não haverá futuros alívios nas faturas.

A manobra faz lembrar a MP 579, assinada pela então presidente Dilma Rousseff (PT) em 2012. Na época, o governo forçou a renovação antecipada de concessões de geradoras e transmissoras para baixar a tarifa em 20%. A redução artificial acabou sendo compensada anos depois, com "tarifaços" que elevaram a conta de luz a níveis muito maiores que os de antes de 2012.

Em outro ponto, a MP assinada por Lula estende, por 36 meses, no prazo para que usinas de geração de energia renovável – como solar e eólica – recebam subsídios. E esses subsídios são pagos pelo consumidor. A medida, portanto, dá com uma mão e tira com a outra.

Em uma outra tentativa de reduzir o custo da energia, nesse caso especificamente do estado de Roraima, o ministro não teve muito sucesso. No ano passado, ele anunciou a retomada das importações de energia elétrica da Venezuela, para substituir – a preços mais baixos – o abastecimento feito via termelétricas a diesel.

Até agora, porém, os moradores de Roraima ainda não receberam energia venezuelana. A Âmbar, primeira empresa autorizada, ainda não fez qualquer importação – e o preço, embora mais baixo que o da geração a diesel, ainda seria bastante alto.

O valor da energia importada pela Âmbar será de cerca de R$ 900 por megawatt-hora (MWh), abaixo do gasto com com termelétricas a diesel em Roraima (cerca de R$ 1,7 mil por MWh), mas muito superior ao que o Brasil pagava até 2019, quando o suprimento foi interrrompido (entre R$ 127 e R$ 137 por MWh).

Recentemente, o governo autorizou outras duas empresas a trazer energia da Venezuela, mas ainda faltam alguns trâmites para que isso ocorra de fato.

Queda de braço com o presidente da Petrobras

O ministro Alexandre Silveira e o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, manifestam divergências desde os primeiros meses de governo. Já trocaram farpas por causa da oferta de gás natural, dos preços dos combustíveis e, mais recentemente, por causa das metas do governo para o biodiesel.

Ao cobrar preços menores para a gasolina e o diesel, Silveira dizia estar ressaltando "os compromissos do governo com o país assumidos com a eleição". Prates, por sua vez, afirmou que, se o ministério quisesse "orientar a Petrobras os preços de combustíveis diretamente", seria necessário seguir tanto a Lei das Estatais quanto as regras do estatuto social da companhia.

No começo de 2024, com setores do governo buscando ajudar companhias aéreas, Silveira cobrou uma "discussão rigorosa" com a Petrobras sobre os preços do querosene de aviação (QAV). "A Petrobras, por ser quase a monopolista do QAV no Brasil, a discussão com ela deve ser mais rigorosa", afirmou o ministro.

Prates rebateu: "Abaixar artificialmente o preço representaria a Petrobras subsidiar um setor. Para isso, eu teria de ter uma ordem direta cumprindo todos os trâmites e a devida compensação financeira segundo a Lei das Estatais", acrescentou.

No início deste mês, Silveira reconheceu em entrevista que tem "debates acalorados" com Prates e afirmou que o comando da Petrobras pertence ao presidente da República: "Sempre tive debates acalorados, verdadeiros. Mas debates transparentes sobre o que eu, como governo, defendo na Petrobras; e o presidente da Petrobras, naturalmente [defende] como presidente de uma empresa. Os papéis são diferentes. Por isso há um conflito".

As declarações foram dadas após o conselho da Petrobras decidir não repassar dividendos extraordinários aos acionistas – o que na época prejudicou o próprio caixa do governo. A retenção dos lucros foi influenciada por Silveira; Prates defendia a distribuição de ao menos metade dos dividendos extras.

A situação ficou tão séria que o mercado chegou a dar como certa a demissão de Prates. A intervenção do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, somada à falta de um nome para substituir Prates e a forte reação do mercado pesaram para uma trégua – que muitos veem como temporária.

Silveira mudou o tom e até elogiou Prates na sequência – mas aproveitando para cantar vitória. Na segunda-feira passada (22), o ministro disse ver uma "correção de rumo" ao se referir ao alinhamento de interesses da Petrobras com o governo.

“Na semana passada o presidente da Petrobras anunciou vários investimentos que estão no plano estratégico, como a Fafen [fábrica de fertilizantes no Paraná]. Falou da política do gás. São questões que eu vinha já há quase um ano dizendo que o Brasil não abriria mão dessas políticas. Demonstra que a gente está tendo uma correção de rumo fundamental para o desenvolvimento nacional e cumprir o grande propósito de criar emprego e renda no Brasil", disse o ministro, segundo o site Poder 360.

Silveira se refere ao projeto Fafen Araucária Nitrogenados, no Paraná, que estava sem produzir desde 2020, no governo Bolsonaro. Na época, a Petrobras alegou prejuízos recorrentes para fechar a unidade. O plano de retomada foi aprovado neste mês pela diretoria da estatal.

Em outra demonstração apaziguamento de ânimos, o conselho da Petrobras aprovou no dia 19 a distribuição de 50% dos dividendos extraordinários, como queria Prates. A medida foi aprovada também pelos acionistas da empresa na última quinta-feira (25).

O ministro Haddad, que teria intercedido em favor de Prates, saiu ganhando com a decisão. Estima-se que o Tesouro Nacional possa receber em torno de R$ 13 bilhões em dividendos, o que vai ajudar no esforço para cumprir a meta fiscal.

Combustível do Futuro, exploração de petróleo, gás mais barato, mini-usinas nucleares

Um dos projetos prioritários de Silveira é o Combustível do Futuro, que tramita no Senado e tem o objetivo declarado de descarbonizar a matriz de transportes e mobilidade no país.

Silveira também defende – neste caso, em consonância com Prates – a exploração de petróleo na Margem Equatorial, trecho da costa brasileira que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte que pode ter reservas de petróleo pouco menores que o pré-sal. O ministro sustenta que a produção nessa nova fronteira ajudará a reduzir importações, e os recursos provenientes poderão ser usados para financiar a transição energética.

O ministro também defende ajustes na regulação da atividade de escoamento de gás natural, para redução do preço final do produto em 25%, em especial para a indústria.

Silveira é favorável, ainda, à substituição de termelétricas movidas a óleo diesel por pequenos reatores nucleares, que são considerados mais baratos que as grandes usinas.

Agenda intensa, promoção constante

O ministro participa constantemente de fóruns, seminários e eventos nacionais e internacionais do setor energético. Em busca de investimentos e parcerias para desenvolver a indústria energética local, defende o potencial do Brasil e a transição energética com etanol, biomassa, energia eólica offshore (em alto-mar) e hidrogênio.

A partir de meados de abril, em pouco mais de uma semana ele participou de reunião do Grupo de Trabalho de Transições Energéticas do G20, que é coordenado pela pasta; de um fórum da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee); da Gas Week 2024; e do Seminário Brasil Hoje, da Esfera. Sempre com entrevistas a jornalistas.

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