O rastro de destruição deixado pelos eventos climáticos extremos já está respingando no setor de seguros. Diante de vendavais e enchentes cada vez mais rotineiros, principalmente no verão, muitas seguradoras estão reformulando suas tabelas de valores. A justificativa é que os desastres naturais estão exercendo influência direta sobre os prêmios pagos aos contratantes e, consequentemente, aumentando de forma exponencial a conta a ser coberta pelas empresas.
O mercado não tem um porcentual geral de reajuste definido, já que cada seguradora pode reajustar conforme sua planilha de custo. Todavia, a fórmula para os novos valores de seguro de carro, casa e até mesmo vida deve obedecer à mesma lógica aplicada para áreas com alto índice de furtos e roubos quem mora em localidades com grande risco desembolsa mais que os moradores de regiões consideradas mais seguras. No mapa do clima, contratos em regiões onde os ventos não passam de brisa e as chuvas não formam mais que pequenas poças na rua são mais baratos.
"Seguro é calculado conforme o risco e a probabilidade de ocorrer o sinistro. Como entrou um elemento novo, esse fator tem de ser inserido na matriz de cálculo. O seguro nas regiões com eventos climáticos severos será mais caro que em outras", explica o professor de Economia José Guilherme Vieira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). "Para manter a credibilidade, o setor vai inserir os eventos climáticos na cobertura. As empresas têm de cobrar a mais para fazer o pagamento."
Algumas garantias diretamente ligadas aos eventos climáticos já sofreram reajustes. De acordo com o diretor de sinistros da Liberty Seguros, Francisco Minarelli, o contrato contra vendaval está 30% mais caro nos estados do Sul, região com alto índice de ocorrência. Apesar do acréscimo no preço, a venda do produto cresceu 35% de 2009 para 2010.
"Estamos vivendo uma nova realidade no setor de seguros ligados ao clima. Por causa das últimas tragédias, principalmente no Rio de Janeiro, as pessoas estão mais conscientes da necessidade", afirma.
Danos materiais
A Sociedade Concórdia de Linha Imperial, na cidade de Nova Petrópolis (RS), distante 100 quilômetros de Porto Alegre, pôde reconstruir a sua sede graças ao seguro contratado por R$ 900 mensais. Em agosto de 2009, um vendaval com granizo destruiu um dos pavilhões do clube. Vinte dias depois, a direção recebeu o prêmio de R$ 120 mil pelo sinistro.
"O seguro foi fundamental para trocar o telhado e o sistema elétrico e fazer pintura nova. Ultimamente, são seguidos os vendavais e, por isso, renovamos o seguro", diz Marcos André Ruppelnthal, presidente da sociedade na época. "Muitos dos 450 associados fizeram o seguro para suas residências. Eu estou pensando em contratar também."
O corretor de imóveis Roberto Zanetti também precisou acionar o seguro por causa de eventos climáticos. No início de janeiro, ao tentar atravessar uma rua alagada no bairro Mossunguê, o motor do automóvel Celta explodiu. "O motor do carro teve perda total. Como meu seguro cobria alagamento, apenas precisei pagar a franquia para ter um motor novo", explicou. Se não tivesse seguro, Zanetti pagaria do próprio bolso R$ 7 mil para ver o veículo funcionando novamente.
De acordo com o diretor comercial da corretora Burges, Aderbal Amaro, dependendo da localidade, algumas empresas e pessoas têm dificuldades para encontrar uma seguradora que faça a garantia. "Clientes de regiões que são constantemente alagadas não conseguem seguradoras que aceitem dar garantia. Não foram só os preços que aumentaram, o rigor também", afirma.
O segmento de seguro residencial também teve aumento nas vendas por conta da percepção de risco. O faturamento das empresas com essa modalidade cresceu 22,4% em 2010, passando de R$ 1,035 bilhão em 2009 para R$ 1,267 bilhão no ano passado, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep).
Fatos recentes
A tragédia que atingiu cinco municípios da região serrana do Rio de Janeiro Teresópolis, Nova Friburgo, Petrópolis, Sumidouro e São José do Vale do Rio Preto na primeira quinzena do ano é um exemplo do poder da natureza e a sua influência sobre os cofres das seguradoras. A catástrofe, considerada a pior da história do país, destruiu centenas de casas e carros e fez centenas de mortes. Somente a HDI Seguros, uma das principais empresas do setor, gastou R$ 4 milhões no ressarcimento de 150 veículos aos seus clientes.
"Ainda não é um reajuste significativo, mas o seguro está mais caro. A tarifa é calculada por região e, claro, locais com índice alto arcam com isso. O custo dos prejuízo é repassado ao cliente", aponta o diretor produto automóvel da HDI Seguros, Eduardo Dal Ri.
Na capital paulista, onde as enchentes são rotinas no verão, assim como as imagens de carros boiando ou totalmente danificados, a conta do prejuízo já está rateada entre os contratantes. "Quando o fenômeno é esperado, já está caculado. As enchentes de janeiro em São Paulo já estavam embutidas no preço", afirma Minarelli.



