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Proposta de franquia na banda larga fixa foi deixada por enquanto de lado pela Vivo, principal defensora da mudança | Antônio More/Gazeta do Povo
Proposta de franquia na banda larga fixa foi deixada por enquanto de lado pela Vivo, principal defensora da mudança| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

A possibilidade de operadoras de banda larga fixa limitarem o acesso à internet por meio de uma franquia de dados, nos moldes do que já ocorre hoje com planos para celulares, foi suspensa semana passada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), por tempo indeterminado. Mesmo assim, a mudança deve seguir sendo foco de discussões acirradas entre associações do setor, consumidores e empresas.

Entre os argumentos utilizados para criticar a mudança, que permitiria às operadoras bloquear a conexão de usuários que atingissem os limites de dados mensais, está o de que a medida fere artigos do Marco Civil da Internet, lei sancionada em abril de 2014 – principalmente no que se refere à neutralidade, princípio que proíbe as empresas de tratar de forma diferente tipos de conteúdo que trafegam pela rede.

O texto do Marco Civil, no entanto, não faz menção a franquias ou modelos de negócios específicos, o que tem gerado diferentes interpretações sobre o impacto da lei na proposta de mudança envolvendo a oferta de banda larga fixa. Para o deputado paranaense João Arruda (PMDB), que foi presidente da Comissão Especial criada na Câmara para discutir a lei, o Marco Civil não protege o consumidor de ter a internet bloqueada após o fim da franquia, modelo defendido pela Vivo, Oi e NET.

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“Ferir a neutralidade, na minha visão, é dar privilégio para um conteúdo em detrimento de outro. Não é o caso (na proposta das operadoras). A neutralidade diz que não deve haver restrição de conteúdo, que diferentes conteúdos devem ser disponibilizados com a mesma velocidade. Entendo que o Marco Civil não nos protege em relação à possibilidade do bloqueio”, afirma Arruda.

O modelo que as operadoras defendem, por exemplo, não prevê planos sem acesso ao Netflix ou ao YouTube ou velocidades de conexão diferentes para esses serviços e outros sites, como redes sociais. No entanto,na prática, o consumidor poderia ser levado a restringir por conta própria o uso dos serviços de vídeo, que consomem mais dados, para não “estourar” sua franquia – situação que, na visão de algumas associações de defesa do consumidor, vai contra a neutralidade da rede.

Para o deputado João Arruda, a discussão legal envolvendo a franquia de dados na banda larga fixa deve ocorrer muito mais no âmbito do Código de Defesa do Consumidor – que, na visão do parlamentar, estaria sendo violado.

Regulamentação

Segundo Arruda, a diferença de interpretações sobre o Marco Civil mais uma vez reforça a necessidade de regulamentação de vários aspectos da lei, como o princípio da neutralidade. O texto do artigo nono do Marco Civil diz apenas que “o responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação”. Também afirma que, na provisão de conexão à internet, “é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados”.

“O Marco Civil é uma carta de princípios, e a partir dessa carta devemos buscar leis mais específicas. Mas, infelizmente, nesta legislatura, estamos retroagindo em relação ao Marco. Já há quem defenda a possibilidade de delegados terem acesso a IP dos computadores sem ordem judicial e há também a questão da retirada de conteúdo na internet sem amparo da Justiça. É previso avançar nessas discussões”, afirma o deputado.

Várias audiências no Congresso e estudos já foram feitos para discutir a neutralidade da rede, mas o governo ainda não editou um decreto regulamentando este ou outros pontos do Marco Civil. Ano passado, o Ministério da Justiça fez uma primeira consulta pública, de 90 dias, sobre a regulamentação da lei, que terminou no fim de abril – quase 2 mil usuários participaram da consulta, e o tema que mais recebeu contribuições foi a neutralidade de rede.

A Anatel também diz que a agência fez uma consulta pública específica sobre a neutralidade, em abril e maio, onde foram recebidas mais de 100 contribuições. Tanto a Anatel quanto o Ministério da Justiça defendem que, mesmo sem a regulamentação, a neutralidade já está valendo – o que ainda está sendo discutido e deve ser alvo de um decreto são as exceções à neutralidade.

Críticas

Órgãos e associações de defesa do consumidor, como o Proteste e Procon, também defendem que a cobrança pelo acesso na banda larga fixa bate de frente contra o artigo 7 do Marco Civil da Internet. O texto da lei diz que “o acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania” e o usuário tem o direito de não ter sua conexão suspensa, “salvo por débito diretamente decorrente de sua utilização”.

Mais uma vez, a abrangência do Marco Civil nessa questão é colocada em xeque por diferentes interpretações do texto e pela ausência de uma legislação complementar que trate o assunto de forma específica – afinal, o bloqueio da internet após o fim da franquia já é comum nos planos para celulares e não tem sido alvo de contestação.

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