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Receosos, alguns homens estão formando grupos masculinos em aplicativos de mensagens, em empresas ou em seus setores, para debater questões de assédio | Bigstock/
Receosos, alguns homens estão formando grupos masculinos em aplicativos de mensagens, em empresas ou em seus setores, para debater questões de assédio| Foto: Bigstock/

Esta é uma época confusa para os homens nos EUA, agora que a conversa sobre o assédio no local de trabalho revela a existência de uma epidemia em todo o país – e muitos deles se perguntam se já estiveram envolvidos ou se ignoraram os sinais.Como, por exemplo, Owen Cunningham, 37 anos, diretor da KBM-Hogue, empresa de design em San Francisco. Quando pensa na festa anual de Natal das empresas atualmente, sente calafrios.

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“Vamos cancelar a festa de Natal”, disse ele, acrescentando que isso deveria ser feito até que se descubra como homens e mulheres devem interagir. Afirmou que se considerava progressista sobre questões de gênero, mas que pensava mais sobre o comportamento que já havia visto no passado: “Que tipo de flerte é normal? Eu estava me aproveitando do pouco poder que tinha? Você começa a se questionar”.

Nos escritórios, os homens estão começando a perceber a prevalência do assédio sexual e da agressão após casos de destaque, incluindo os de Harvey Weinstein, Mark Halperin e Louis C.K. Eles ajudaram a inspirar a campanha #MeToo, em que milhares de mulheres nas redes sociais postaram sobre suas próprias experiências de assédio. Agora, muitos homens que gostam de pensar que tratam as mulheres como iguais no local de trabalho estão começando a examinar seu próprio comportamento, e querem saber se também se excederam, de forma ostensiva ou sutil – o que os incluiria em um post #MeToo.

“Eu não acho que tenha feito algo errado, mas será que alguma coisa que fiz foi interpretada de outra maneira?”, disse Nick Matthews, 42 anos, que trabalha na PwC, antiga PricewaterhouseCoopers, e que vive em San Francisco.

Autoanálise coletiva

Em resposta, alguns homens estão formando grupos masculinos em aplicativos de mensagens, em empresas ou em seus setores, para debater questões de assédio. Alguns disseram que planejam ter muito mais cuidado ao interagir com as mulheres porque sentiam que a linha entre amizade e assédio sexual poderia ser facilmente ultrapassada. Outros fazem força para compreender como esses comportamentos podem surgir até mesmo entre aqueles que acreditam na igualdade de direitos.

Em Denver, Joel Milton, de 30 anos, empreendedor da Baker Technologies, uma plataforma para dispensários de maconha, disse que recentemente decidira ter mais cuidado no mundo corporativo depois de ver a enxurrada de declarações #MeToo.

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“Agora, quando fico sabendo que alguém da minha equipe vai dar uma festa à beira da piscina, comento que talvez os gerentes não devessem participar”, disse Milton, mencionando o tipo de informação que pode existir em manuais de emprego de muitas empresas.

Ele acrescentou que o assédio não era algo em que pensasse muito antes, mas que agora estava avaliando mais seu próprio comportamento. “Tipo, será que fiz alguma coisa?”, disse.

Muitas empresas há tempos dispõem de treinamentos antiassédio para educar homens e mulheres sobre o assunto, mas em um relatório, no ano passado, a Comissão de Oportunidades Iguais de Emprego dos EUA descobriu que grande parte do treinamento era ineficaz e que o assédio no local de trabalho raramente era denunciado.

Como proceder

Jonathan Segal, advogado que participou da força-tarefa da comissão de assédio, disse que agora respondia a perguntas estranhas de homens que querem saber como se comportar no trabalho. Recentemente, em um evento beneficente em Palm Beach, Flórida, alguns lhe perguntaram se era admissível abraçar uma mulher, e onde os limites devem ser estabelecidos.

Segal explicou a eles que o contexto era importante e que fingir que há uma zona cinzenta entre amizade e agressão sexual era absurdo. Por exemplo, falou que abraçar uma velha amiga é muito diferente de vir por trás de uma colega de trabalho enquanto ela está trabalhando.

“Se você não consegue entender isso, então talvez devesse parar com os abraços”, disse ele.

Segal, responsável pelo treinamento antiassédio, está agora expandindo parte do programa chamado Safe Mentoring, que ensina os homens a treinar mulheres sem assediá-las. Em uma sessão recente, um supervisor falou que tinha uma entrada extra para um evento esportivo e achou que só poderia convidar um colega homem; Segal explicou como convidar uma colega sem assediá-la sexualmente.

“A resposta ao assédio não é evitar as mulheres”, disse ele.

Mesmo assim, alguns disseram estar seguindo “a regra Pence”, conhecida anteriormente como regra Billy Graham, o pregador evangélico, mas que agora leva o nome do vice-presidente. Pence disse que não come sozinho com mulheres que não sejam sua esposa, e que não comparece sem ela a um evento onde servem bebidas alcoólicas.

Um escritor conservador, Sean Davis, escreveu que muitos homens nos meios de comunicação deveriam sempre seguir a regra Pence. Ele afirmou que o faz, e que os liberais nos EUA finalmente perceberam a utilidade de se evitar reuniões privadas com as mulheres. O ex-conselheiro da Casa Branca, Sebastian Gorka, disse a mesma coisa.

“O que estamos vendo agora é que os homens estão se afastando do papel que tentamos encorajá-los a desempenhar, que é o de ensinar e apoiar as mulheres no emprego. Eles estão apreensivos, achando que vão ser falsamente acusado de assédio sexual”, disse Al Harris, que oferece programas de igualdade no local de trabalho e escreve sobre o tema em Chicago com sua parceira, Andie Kramer, há anos.

Pedir orientação diretamente às mulheres

Nem todos estão praticando o afastamento. Alguns disseram que o melhor caminho é pedir orientação diretamente às mulheres, caso elas se sintam assediadas. Pat Lencioni, fundador do Table Group em Lafayette, Califórnia, que oferece treinamento executivo para empresas em torno de questões como diversidade, disse que faz exatamente isso, e que já perguntou às mulheres em seu escritório se elas se preocupam com o assédio.

“Eu cheguei ao escritório e disse: ‘Ei, meninas, tenho uma pergunta para vocês: já passou pela sua cabeça que esse papo de assédio sexual pode acontecer aqui?’”, recorda-se Lencioni, 52 anos. “E elas disseram: ‘Não, porque conhecemos você. Sabemos quem você é’.”

Ele acredita que essa abordagem poderia ser adotada de forma mais ampla.

Outros homens contaram que não falavam sobre assédio no local de trabalho porque já sabiam o que precisavam saber. “Esta é uma cidade liberal. Todos nós já sabemos dessas coisas”, disse Philip Rontell, agente imobiliário em Walnut Creek, Califórnia, acrescentando que apoia a campanha #MeToo.

Quando querem falar sobre esse tipo de assédio, disseram alguns deles, não sabem aonde ir. “Não sei onde essas conversas podem ocorrer”, disse Ryan Ellis, 33 anos, gerente de vendas de uma empresa de comércio eletrônico em Santa Monica, Califórnia.

Austin Gilbert, recrutador da empresa Gametime em San Francisco, disse que seu setor também teve que lidar com homens conversando em salas de bate-papo on-line no trabalho, o que para ele poderia “esconder” comentários tóxicos. Sua empresa fechou vários chats de panelinhas ao longo dos anos, mas ele está mais preocupado.

“Temos uma política de dizer aos funcionários que podemos acessar todas as comunicações eletrônicas, mas que essa normalmente não é a responsabilidade de alguém específico em uma empresa pequena”, disse Gilbert, de 31 anos.

Será o fim das confraternizações corporativas?

Agora que as mulheres se sentem fortalecidas para denunciar um comportamento inapropriado, algumas empresas preveem que eventos que envolvem bebidas alcoólicas, como as festas de fim de ano, podem ser problemáticos. Muitas firmas costumavam promover essas festas na quinta ou na sexta à noite, mas outras optaram pela tarde de segunda ou de terça, disse Sarah Freedman, vice-presidente de operações da 23 Layers, organizadora de eventos em Nova York, cujos clientes incluem o Google e a West Elm.

As bebidas liberadas estão sendo substituídas por zonas de jogos. Um cliente recentemente pediu que fosse servido o coquetel “John Daly” bem aguado, atitude que Freeman achou estranha, mas provavelmente sábia.

“Os eventos após o expediente são ‘a linha de frente’ quando o assunto é assédio, e as empresas querem adotar medidas preventivas”, disse ela.

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