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A consultora ambiental Cristiane Baluta: “O futuro do trabalho vai ser o ‘colarinho verde’” | Priscila Forone/Gazeta do Povo
A consultora ambiental Cristiane Baluta: “O futuro do trabalho vai ser o ‘colarinho verde’”| Foto: Priscila Forone/Gazeta do Povo

Opinião

Desinteresse limita produção e trabalhos "sustentáveis"

Desde que assumiu o Ministério do Meio Ambiente, há quase um ano, Carlos Minc pede ao Ministério da Fazenda que iguale os impostos cobrados sobre o chuveiro elétrico e o aquecedor solar de água. A tentativa é de estimular a compra (e, portanto, a produção em larga escala) de aquecedores, mais "sustentáveis" que os arcaicos chuveiros elétricos. Pois bem, um mês atrás, em seu esforço para reaquecer a economia, o governo baixou de 5% para zero o IPI do chuveiro. E ignorou o equipamento solar, cuja alíquota segue em incompreensíveis 18%.

Esse é apenas um dos exemplos da falta de interesse governamental em estimular tecnologias mais amigáveis do ponto de vista ambiental. Sem incentivo (ou obrigação) legal para a produção e o emprego "verde", resta esperar que as empresas brasileiras se mexam por conta própria. Uma recente pesquisa da consultoria Roland Berger mostrou o que elas (não) vêm fazendo: 54% das companhias destinam, no máximo, 1% de seu faturamento a essas tecnologias – e, por causa da crise, 66% reduziram ou adiaram investimentos do gênero. É de se supor que um bocado de profissionais da área tenha ido para a rua nessa "racionalização" de custos.

A absorção de novas tendências e tecnologias nem sempre é rápida. Mas será ainda mais morosa enquanto o governo insistir em premiar a produção "suja". Na Europa, a legislação do setor já mostra resultado. E, apesar de estarem engatinhando no uso de energias renováveis (ou talvez por isso), os europeus podem dizer que lá existe, de fato, um mercado de trabalho verde. Por aqui, acomodados com tecnologias e empreendimentos estabelecidos décadas atrás, continuamos limitados a alardear nosso pioneirismo no etanol e o abundante uso de energia hidráulica.

Fernando Jasper, repórter de Economia

Dizer que "o futuro do emprego é verde" já virou uma espécie de clichê entre os especialistas em carreira. Mas, embora deva crescer a demanda por profissionais da área ambiental, o presente não se mostra tão promissor. Profissões ligadas à preservação do meio ambiente ainda passam por dificuldades de adaptação, do âmbito cultural ao legal. E mesmo a procura por cursos na área não tem sido tão grande.

"O mercado está bem complexo nessa área. É sempre assim quando se inicia um grande processo de mudança", conta Cristian Ney Gomes, diretor da empresa de recursos humanos Globalhunters em Curitiba. Ele explica que o mercado passa por um processo de adaptação comparável ao que ocorreu na área de informática. "Assim como demorou 10 ou 20 anos para as empresas aceitarem a necessidade dos profissionais de tecnologia, elas estão demorando para absorver as mudanças na área ambiental. Mas hoje, por exemplo, faltam profissionais de informática no mercado", explica.

Marcelo Salmaso, da GO4! Consultoria de Negócios, concorda que as profissões verdes têm um futuro promissor, e salienta que essas mudanças já começaram, principalmente em organizações maiores. Mas hoje o custo para manter um profissional da área ambiental ainda é muito grande para pequenas empresas. Nelas, quando a necessidade surge, a saída é a contratação de consultorias especializadas.

Foi nesse nicho de mercado que Cristiane Baluta, 44 anos, investiu. Após se graduar em Marketing Internacional e se especializar no exterior, procurou se dedicar à área ambiental. Hoje é proprietária de uma consultoria que atua com gerenciamento de resíduos e outros projetos na área. "O futuro do trabalho vai ser o ‘colarinho verde’. Mas hoje é necessário ter flexibilidade para se virar nessa área", diz.

Formação

Para se adaptar a essa realidade, os profissionais têm procurado especializações, gerando um perfil híbrido. Nas graduações, a procura por cursos verdes ainda é pequena. No último vestibular da Universidade Federal do Paraná, por exemplo, o curso de Engenharia Florestal teve concorrência de 5,5 candidatos por vaga, e Engenharia Ambiental ficou com 5,6. Enquanto isso, a concorrência para Medicina passa de 30 candidatos por vaga.

Para Márcio Coraiola, coordenador do curso de Engenharia Florestal e da especialização em Gestão de Recursos Naturais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), um dos motivos é um grande desconhecimento dos estudantes mais novos sobre a área ambiental. "As pessoas ainda não conhecem ao certo os cursos. Fazem confusão entre eles, por serem relativamente recentes", conta.

Segundo Mauricio Dziedzic, coordenador do mestrado profissional em Gestão Ambiental da Universidade Positivo, há também um problema de atribuição de funções entre as profissões. "Profissões mais tradicionais, como algumas engenharias e o Direito, têm suas atribuições bem definidas pelos seus conselhos regionais. Na área ambiental elas ainda são bem restritas. Há atribuições, como de saneamento, que ainda são legalmente da área de Engenharia Civil", diz. "Quando alunos vêm me pedir conselho se devem ou não se dedicar à área ambiental na graduação, por esse motivo digo que devem cursar Engenharia Civil e depois se especializar na área ambiental", completa.

Segundo Leide Takahashi, gerente de projetos ambientais da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, mesmo com todas as complicações há vagas no mercado que não conseguem ser preenchidas. "O que ocorre é o despreparo das pessoas. Está se buscando hoje um perfil profissional muito difícil de encontrar: que a pessoa seja qualificada, mas que tenha experiência, que tenha atuado na prática da profissão", diz.

Proatividade

Ainda de acordo com Mauricio Dziedzic, as profissões verdes devem se tornar realidade quando as empresas se tornarem proativas em relação aos problemas ambientais. "Hoje o mercado é muito reativo. As organizações esperam o problema acontecer para daí se preocuparem em tomar alguma atitude. A maioria coloca as despesas dessas atividades como custo e não como investimento, como isso deveria ser encarado. É um problema de mentalidade, de cultura", explica.

Para Marcelo Salmaso, o problema poderia ser solucionado com a intervenção mais efetiva do Estado, em forma de incentivo para produtos que respeitem o meio ambiente e na formação de profissionais. "Em plena crise, o governo cortou impostos dos carros e a demanda aumentou. Acredito que a atuação do governo tenha também uma forte influência no mercado ambiental. Por que não incentivar produtos que sejam economicamente sustentáveis? É dever do Estado prezar pelo bem de todos", completa.

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