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Um projeto de lei em análise por comissão especial da Câmara dos Deputados deflagrou uma acirrada controvérsia entre dois dos principais segmentos do agronegócio paranaense. Ele torna obrigatória a adição de 10% de amido de mandioca em metade da farinha de trigo usada no Brasil. O Paraná tem especial interesse nessa medida, já que é líder nacional nos dois produtos – responde por quase 60% do trigo e 70% do amido de mandioca.

Ontem, o relator da comissão, Nilson Mourão (PT-AC), apresentou seu texto, no qual ameniza os efeitos da lei, com o objetivo de contemplar o setor de trigo – moinhos, padarias e indústrias de massas e biscoitos –, frontalmente contrário à obrigatoriedade, por considerá-la inconstitucional. Pelo projeto de lei original (4.679/01), seria obrigatória a mistura em toda a farinha de trigo consumida. Agora, a comissão tenta alcançar apenas o pão francês, que consome cerca de 55% da farinha e seria mais suscetível à mistura.

Apresentado em 2001 pelo deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), só em abril deste ano o projeto ganhou tramitação especial, já na gestão dele como presidente da Câmara. A Comissão Especial tem caráter terminativo, o que significa que a matéria não precisa ser votada em plenário. Segundo o presidente da comissão, Moacir Micheletto (PMDB-PR), a votação deverá ocorrer em 12 de julho. Depois, seguirá para comissão semelhante no Senado e sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O principal argumento favorável à lei é de que ela ajuda a reduzir as importações de trigo. O Brasil compra no exterior – principalmente da Argentina – quase 60% das 10 milhões de toneladas que consome anualmente. Na última década, os gastos com a operação somaram R$ 17 bilhões.

Outro benefício apontado pelo setor de mandioca é social. Pelo menos 75% dos 1,8 milhão de produtores da raiz cultivam, no máximo, 10 hectares. Segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Amido de Mandioca (Abam), que representa a indústria, serão gerados 100 mil empregos em todos os elos da cadeia produtiva.

As entidades ligadas ao trigo contestam esses argumentos. Samuel Hosken, presidente da Abitrigo, entidade que representa os moinhos, critica a criação de comissão especial para votar o assunto. "Isso só se justifica para assuntos excepcionais, de relevância nacional e urgência", afirma Hosken.

Ele questiona também a tese da redução de importações de trigo. "Como a mandioca não tem glúten e possui baixo teor de proteína, teremos que importar mais trigo melhorador, deixando de usar uma parcela maior de trigo nacional, que historicamente tem baixos teores de proteína", diz Hosken. Na sua avaliação, o preço do pão poderá subir porque, atualmente, a tonelada de trigo chega ao moinho custando R$ 500, contra os R$ 600 da tonelada de amido.

Hosken afirma que poderá haver desemprego no setor, já que muitos moinhos ameaçam se transferir para outros países caso a lei seja aprovada. "Querem criar, por lei, demanda para o setor mandioqueiro", declara. O segmento atravessa uma supersafra, com o preço da raiz abaixo do custo de produção.

Reflexos no pão

O segmento contrário à lei garante que o pão perderá qualidade e valor nutricional com a mistura. Segundo Marcos Salomão, presidente da Abip, entidade nacional das padarias, o produto perderá em textura, sabor e aspecto visual.

O engenheiro agrônomo Dermânio Tadeu Lima Ferreira, com doutorado em processamento de mandioca e que pesquisou a mistura durante três anos, discorda. Ele garante que o pão francês admite até 20% de amido. "O pão fica mais fofo e resseca menos", afirma Ferreira, que é professor da Faculdade Assis Gurgacz, de Cascavel (Oeste do estado).

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