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Secretários de Fazenda criticaram proposta de reforma tributária faseada da União.
Secretários de Fazenda criticaram proposta de reforma tributária faseada da União encabeçada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.| Foto: Isác Nobrega/PR

A reforma tributária do governo federal, dividida em fases e começando pela unificação do PIS/Cofins em uma nova Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), é egoísta e demonstra a falta de coordenação da União. A avaliação é de um grupo de secretários estaduais de Fazenda. Eles se reuniram em um webinar nesta sexta-feira (24) para discutir os impactos da pandemia da Covid-19 e refletir sobre desafios e oportunidades do setor público. O evento foi organizado pela Secretaria de Fazenda do Paraná.

A recuperação lenta da recessão anterior seguida por uma crise extraordinária, que exigiu aumento do gasto público em todas as esferas de governo, expôs algumas fragilidades na condução da situação pela União. Todos os entes federados tiveram perdas significativas de arrecadação e mantiveram parte das despesas orçadas, especialmente com a folha de pagamento para ativos e inativos, além de precisarem expandir os gastos. Enquanto o governo federal acertou com a tomada de medidas emergenciais, como o auxílio para informais e mesmo o socorro aos estados, descuidou do pacote estrutural, que será essencial para a retomada a partir de 2021.

Além da reforma tributária, a reforma administrativa e a discussão das PECs dos fundos públicos e do pacto federativo são urgentes, na visão dos secretários, para estabelecer os pilares da retomada do controle fiscal de cada ente. Mas, a apresentação de uma reforma faseada, que ignora discussões já realizadas no âmbito dos estados, é um exemplo de como a falta de coordenação da União perante outras esferas pode travar o desenvolvimento conjunto do país e dificultar o andamento da necessária agenda de reformas.

Participam do encontro online os secretários da Fazenda do Paraná, Renê Garcia Junior; do Rio Grande do Sul, Marco Aurelio Cardoso; de Pernambuco, Décio Padilha da Cruz; de Minas Gerais, Luiz Cláudio Fernandes Lourenço Gomes; e a secretária da Economia de Goiás, Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt. A mediação foi de Cláudio Conceição, superintendente de Comunicação do IBRE.

Falta de coordenação da União na pandemia se repete em reforma tributária

Para os secretários, a tomada de decisões durante a pandemia da Covid-19 mostrou a falta de coordenação da União, que também se espalha para outras áreas. Na avaliação do secretário da Fazenda do Paraná, Renê Garcia Junior, essa falta de coordenação virou excesso de compras, principalmente de equipamentos de saúde, mas exemplifica um problema recorrente.

“Essa postura do governo de mandar agora seu projeto de reforma tributária, após um ano de discussão com estados, e só da sua parte e com a sua alíquota definida, não é uma coisa republicana condizente com um pacto federativo mais avançado. Não é coisa de quem quer dialogar. Essa coisa autoritária cria clima de antagonismo”, aponta.

O secretário da Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha da Cruz, endossa essa visão. “O papel da União é de diálogo e coordenação, é o que foi dado em 1988. Os estados aguardam isso. Não adianta união vir com a CBS, que resolve só um passo. Não podemos ter metade da carga tributária sobre consumo. Temos que ter reformas administrativa, fiscal e tributária”, pontua.

Ele pondera que as PECs que tramitam no Congresso, embora tenham defeitos, trazem uma reformulação global, mais compatível com a necessidade de melhorar o ambiente de negócios no país. Além delas, também há um substitutivo proposto pelos secretários de Fazenda, com anuência de governadores, pautada pela simplificação e buscando evitar perdas sem majorar eventuais ganhos dos estados com a mudança tributária. “Para ser federação, não se pode destruir estados para beneficiar outros”, defende.

Entre os secretários, houve um consenso de que o projeto de reforma tributária do governo era insuficiente e de que a estratégia de fatiamento tem mais desvantagens. Para o secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul, Marco Aurelio Cardoso, a chance dessa reforma funcionar é sendo atacada de forma mais completa.

“E isso se faz com entendimento de que o problema do governo federal não é o de resolver as contas do governo federal, porque as pessoas não moram no governo federal – elas moram nas cidades e estados. Os serviços que a população utiliza não são só providos pelo governo federal. Especialmente segurança, saúde e educação – e a própria justiça – elas são quase que totalmente alocadas nas esferas municipais e estaduais”, pontua.

Para ele, começar o debate de reforma tributária com uma alíquota única de 12% que permite que outros impostos – estaduais e municipais – sejam agregados posteriormente já inviabiliza o debate. “A discussão de alíquota única tem uma única possibilidade, que é pegar a menor de todas”, defende.

Na visão do secretário de Fazenda de Minas Gerais, Luiz Cláudio Fernandes Lourenço Gomes, não se pode fugir da discussão de que há guerra fiscal no Brasil – e como isso é prejudicial para a saúde financeira da federação. “Só uma boa reforma tributária terá capacidade de acabar com a guerra fiscal entre os estados”, diz. Mas, para ele, o risco do fatiamento das reformas é o de se sobreporem a uma discussão mais profunda sobre modelo de desenvolvimento de país.

Problemas comuns trazidos pela pandemia

Os problemas trazidos pela pandemia do coronavírus são nacionais, ainda que se respeite algumas especificidades regionais. Embora muitos gastos que estão sendo feitos em 2020 sejam extraordinários – e não devem se tornar permanentes porque não há espaço fiscal para isso –, o patamar de algumas despesas invariavelmente vai se manter elevado. Para o secretário da Fazenda do Paraná, Renê Garcia Junior, é o caso dos gastos com saúde.

“Sabemos que muitas despesas, que hoje são temporárias, vão se tornar permanentes. Os gastos de saúde, por exemplo, devem vir pra ficar. Novos hospitais, estruturas, a população que vai ficar com medo de procurar mais atendimento. O patamar de gastos com saúde vai aumentar quantitativamente e qualitativamente”, observa.

Nesse sentido, Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, secretária de economia de Goiás, elogiou medidas do governo federal, como as voltadas para a população mais vulnerável, grandes empresas e estados e municípios – o socorro foi fundamental para que esses entes pudessem pagar suas contas. Porém, destacou que a situação fiscal de seu estado, assim como de outros, já era grave antes da pandemia, que apenas agravou o quadro. “Acredito que se não endereçarmos as questões estruturais com União, estados e municípios não vamos sair da situação”, aponta.

Ela explica que em Goiás os restos a pagar já mostram que a arrecadação é muito aquém em relação às despesas – e ao estado planeja acelerar um plano de concessões e enxugamento da máquina pública. “É um desafio muito grande, ainda mais se não tivermos as reformas administrativa e tributária e o andamento das PECs 186, 187 e 188 [que formam o Plano Mais Brasil e incluem o pacto federativo e fundos públicos]”, argumenta.

Para o secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul, Marco Aurelio Cardoso, as reformas são indispensáveis, mas o país precisa discutir a política pública com seus custos atrelados. Ele cita como exemplo a aprovação da PEC do Fundeb. Na avaliação dele, o fundo é indispensável, mas tem custos associados.

No Caso do Rio Grande do Sul, os custos para adequação à PEC são maiores do que todo o ganho obtido com as reformas administrativa e previdenciária do estado. “Não só perdemos tudo que fizemos como ainda temos um gasto extra. Esse é um exemplo de como a questão fiscal não é inimiga da política pública, mas tem que estar junto para resolver a questão”, aponta.

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