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“Mais um dia se passou e não usei a fórmula de Bhaskara”, diz frase que viralizou no Twitter. “Sou muito de humanas” é um comentário comum no Facebook. Claro que o mote dessas frases é o humor, mas não seria também um sinal de como a população, principalmente a juventude, encara a matemática? 

Os números (veja só a ironia) dão corpo à impressão subjetiva: de acordo com dados levantados pela ONG Todos pela Educação, apenas 7,3% dos estudantes atingem níveis satisfatórios de aprendizado de matemática. Considerando apenas escolas públicas, o número despenca para 3,6%, o que significa que 96,4% dos estudantes não aprendem o esperado na escola.

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O desempenho dos estudantes brasileiros em exames internacionais como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) também confirma esse quadro: o país caiu em todas as áreas analisadas, incluindo, entre elas, a matemática. 

Nessa disciplina, aliás, está a nossa pior posição: 66 em uma lista que contempla 72 países e economias – Cingapura, China e Japão lideram o ranking. 

Menos decoreba e mais raciocínio 

O desafio do ensino da matemática do Brasil está na forma como há décadas essa disciplina é ensinada. Em geral, os professores não conseguem explicar conceitos matemáticos abstratos e a sua utilização na vida real. O resultado é uma educação voltada para a decoreba e os alunos acabam aprendendo macetes para resolver problemas, sem entender o que estão fazendo. 

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Dessa forma, além da matemática parecer inútil para muitos estudantes – porque ninguém lhes explicou para que serve a maioria dos conteúdos da matéria –, ela se transforma em um dever chato e sem sentido. Quando, pelo contrário, um bom professor consegue mostrar a beleza dos números e da abstração, além de sua aplicação no cotidiano, o aluno se sente “empoderado” e entusiasmado com a matéria. Infelizmente, não são muitos os professores no Brasil capazes de fazer isso. 

Nos países com as melhores notas em matemática no Pisa, os alunos são capazes de entender e aplicar conceitos matemáticos abstratos e as fórmulas tornam-se apenas um acessório que fornece um atalho para achar a solução de alguma questão.

Incentivo

Sem dúvida, um dos principais incentivos para o aprendizado da disciplina é a Olimpíada Brasileira de Matemática, realizada pelo Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), com o apoio da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), e promovida com recursos do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. O evento reúne alunos de escolas públicas e particulares e, em 2018, teve sua 14ª edição.

“A Olimpíada é uma brincadeira que cria uma dinâmica instigadora nas escolas e nas salas de aula para motivar o jovem a estudar. Um dos objetivos é romper a forma como a matemática é ensinada nas escolas”, diz Marcelo Viana, diretor-geral do Impa. 

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“As questões da prova são elaboradas para que exijam conhecimento da série em que o aluno está, é claro, mas também para estimular o raciocínio. Não dá para colocar uma fórmula e considerar que está resolvido”, explica. 

Dessa forma, o papel do professor é fundamental na preparação dos alunos. “Quando há um envolvimento da escola e do professor, o resultado é outro. Muda radicalmente o nível dos alunos. Há um exemplo de um docente em Caucaia do Alto, no Piauí: as crianças passaram a se interessar mais pela matemática do que pela televisão, por exemplo”, conta. 

Fase final da Olímpiada de Matemática em 2016. Divulgação.

Alternativas

Mas não dá para apostar apenas na Olimpíada da Matemática para tornar o ensino de matemática mais atrativo. 

“Muitos professores não conseguem resolver os problemas propostos pelas provas, então não conseguem ver o caminho”, diz o professor Antônio José Lopes Bigode, do canal Matemática do Cotidiano. “A finalidade real [das olimpíadas] é pescar futuros matemáticos e cientistas. Ela não tem impacto no ensino em si”, completa. 

Na opinião do professor, seria melhor gastar mais tempo com soluções para a grande maioria dos alunos que não está em condições de disputar essa prova. “Uma pessoa ganha, mas milhões são reprovados. Interessa muito mais saber, na minha opinião, onde estão estes fracassos, essas derrotas, do que este ‘um aluno’ excepcional”, diz. 

Para Marcelo Viana, no entanto, pela forma como a competição é realizada, todos os alunos se sentem motivados a melhorar e, finalmente, encontrar os encantos da disciplina. 

“As crianças são instigadas pelo aspecto competitivo, mas que estimula também a solidariedade: formam grupos para se prepararem juntos e ajudam os colegas. A realidade mostra que ela traz bons resultados com gastos muito baixos, menos de R$ 2 por aluno”, contrapõe Viana. 

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Os dois professores concordam, por outro lado, que é inegável que o ensino da matemática no Brasil precisa melhorar.

“Matemática não é simplesmente fazer uma conta e aplicar uma fórmula. Há uma motivação maior quando as pessoas compreendem a essência de um problema. É preciso dar sentido ao que é ensinado”, diz Viana.

“As pessoas não têm intimidade com a matemática. São ensinadas decorando fórmulas que não fazem sentido para elas, apenas por decorar. O principal passo é criar relações da matemática com aspectos do dia a dia”, conclui Antônio José Lopes Bigode.

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