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Cena cotidiana na Escola Municipal Presidente Pedrosa: avanços no ensino são palpáveis, à revelia da resistência à política dos rankings | Marcelo Elias/Arquivo Gazeta do Povo
Cena cotidiana na Escola Municipal Presidente Pedrosa: avanços no ensino são palpáveis, à revelia da resistência à política dos rankings| Foto: Marcelo Elias/Arquivo Gazeta do Povo

"Avanços são tímidos"

Entrevista com Roberto Leão, da Confederação dos Trabalhadores em Educação (CNTE).

Na prática, o que significam os avanços do Ideb para a educação brasileira?

Estes avanços ainda são muito tímidos. Há de se pleitear uma melhoria mais urgente para a educação pública brasileira. Os dados mostram disparidades regionais e entre escolas de um mesmo município, o que exige dos poderes públicos esforço extra no sentido de oferecer educação de qualidade para todos.

As metas poderiam ser mais ousadas?

Sim, as metas são tímidas. Atingir média 6 só em 2021 pode fazer com que ocorra um déficit muito grande de pessoas para acompanhar o desenvolvimento econômico do Brasil. Mas não é só uma questão de mercado. A educação deve olhar para o ser humano. Deve ser feita com incremento do financiamento, gestão democrática e valorização dos profissionais de educação.

O senhor acha que o fato do Ideb neste ano ter sido entregue antes para os secretários de educação pode levar à uma conotação eleitoreira?

Não. O grande problema na divulgação do Ideb são os rankings. Temos de divulgar a avaliação, mas trabalhar numa perspectiva de não construir rankings das melhores e das piores escolas, cidades e estados. Sem dúvida isto afeta a autoestima e não podemos ignora-la. A baixa autoestima tira o aluno da escola.

Mas então como seria a avaliação?

A grande avaliação é a feita pela escola. As provas externas, por mais bem elaboradas que sejam, são padronizadas em larga escala e não conseguem determinar detalhes dos sistemas. É preciso que as escolas sejam incentivadas a fazer avaliações sem se sentirem pressionadas a conquistar bons números. Hoje, o ensino está voltado para se ter um bom Ideb, para ir bem na prova. A educação não pode ser reduzida desta maneira.

"Subir 0,1 não é tão pouco"

Entrevista com Reynaldo Fernandes, ex-presidente do Inep, autarquia do MEC que faz o Ideb.

Em sua opinião, as metas devem ser reavaliadas?

Pode ser, mas acho que deveríamos esperar. Tínhamos um histórico de queda. Agora começamos a subir. Quando traçamos as metas, em 2007, eu ainda estava no Inep. Fui a todos os estados e nunca ninguém achou que elas eram baixas.

Como estas metas foram estabelecidas?

Nós tentamos projetar um nível que seria adequado com o de países desenvolvidos. Fizemos as metas baseados nos resultados de 2005. Chegamos à conclusão de que a média dos países desenvolvidos seria um Ideb em torno de 6. Mas para alcançar isso precisávamos um tempo. Calculamos então uma trajetória. Conseguir avançar 0,1 não é tão pouco assim.

Por quê?

Dos 3,8 medidos para o Brasil em 2005, nós vamos chegar a 6, em 2021. Então significa um aumento de 2,2 pontos neste período, um avanço de 0,13 ponto por ano. É sair de uma situação muito ruim para chegar no nível médio dos países desenvolvidos, algo como a educação dos Estados Unidos.

E não há como acelerar este avanço?

Não. É coisa de gerações.

O ensino médio pode melhorar nas próximas avaliações?

Algumas análises do ensino médio são equivocadas. Quem saiu do ensino médio são os que já passaram pela 8ª e pela 4ª série. O pior indicador do Saeb foi em 2001. Quem terminou o ensino médio em 2009 faz parte desta geração. Agora vemos outra geração chegando muito melhor na 4ª série. Há uma expectativa de que irá chegar melhor no final, que é o ensino médio.

Os técnicos do Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o Inep, têm trabalhado duplamente nas últimas semanas. Além de publicar as centenas da tabelas de 2009 do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), esses profissionais ligados ao MEC precisam lidar com o misto de euforia e desconfiança que tomou conta dos círculos educacionais.

A euforia se refere às etapas iniciais do ensino fundamental (1.º ao 5.º ano) – detentora das melhores notas. Já a desconfiança recai na timidez dos índices: não se sabe dizer se são bons, ainda que pequenos, ou se comprovam que a educação avançou pouco.

Qualquer que seja a resposta, o ponto em que estamos da "era Ideb" é a de uso crítico e inteligente desse instrumento. As notas não devem servir apenas para fazer rankings, mas para incrementar pesquisas, comparações e cimentar o desenvolvimento da educação.

Avanço

Para quem está acostumado com médias de boletins escolares, ver que este aumento foi de apenas 0,8 ponto na média geral do Brasil (de 3,8 em 2005 para 4,2 em 2009) pode parecer pouco. Mas especialistas em educação garantem que mesmo com ares de sutileza, o avanço é significativo.

De acordo com o doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), Reynaldo Fer­nandes, presidente do Inep entre os anos de 2005 e 2009, uma comparação simples pode ser feita utilizando os resultados do Ideb de 2007 e 2009. Na disciplina de Matemática, por exemplo, o conhecimento que um aluno da 4.ª série detém hoje só era atingido antes por um estudante na metade da 6.ª série. Em Língua Portuguesa, o feito ocorria só no fim da 5.ª série. "O mais importante é que este aumento de nota veio com uma melhora no fluxo e as crianças reprovam menos", diz.

O Ideb foi criado em 2005 com o objetivo de avaliar a qualidade da educação brasileira. A nota combina o desempenho dos estudantes e a taxa de aprovação de cada escola. Apesar da escala do índice ir de zero a dez, a meta do governo federal é atingir a média 6 em todo o país até o ano de 2021. Portanto, escolas, municípios e estados que chegam neste patamar já possuem qualidade de ensino comparado com países desenvolvidos que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Público x privado

A média geral do Ideb é composta tanto pela medição feita nas escolas públicas quanto pelo resultado obtido no setor privado. Embora o Inep divulgue o resultado separado para cada tipo de administração na esfera nacional, regional e estadual, as médias gerais é que são mostradas pelos gestores públicos como meta.

Quando o recorte por tipo de gestão é feito, as escolas particulares apresentam sempre as maiores notas. Só para se ter uma ideia, a diferença da média geral brasileira entre a pública e a privada chega a dois pontos. Na primeira etapa do ensino fundamental a nota para o setor público em 2009 foi de 4,4; enquanto que o ensino privado alcançou um Ideb de 6,4.

Também há diferença na metodologia para avaliar as duas instâncias. Enquanto para o ensino público a prova é universal, o ensino privado é avaliado por amostragem. De acordo com Fernandes, o resultado obtido pela amostra é ampliado a partir do número de alunos matriculados em cada região.

Para a professora de Pedagogia e Licenciaturas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Ermelina Bontorin Tomacheski, como os resultados também são publicados em separado, não há risco de "maquiagem" da média geral. Já o doutor em Educação Ângelo Ricardo de Souza, que coordena o programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pode gerar confusãose a nota da rede particular compor a média geral do Ideb. "Não dá para colocar no mesmo pacote as escolas que serão beneficiárias de políticas públicas."

Para os especialistas, a qualidade educacional, tanto na escola pública quando na privada, ainda é um conceito em disputa. De acordo com Ermelina, vários fatores influenciam a qualidade, desde a organização da gestão, passando pela formação de professores e pela questão socioeconômica e cultural. "A escola pública tem o princípio democrático de garantir o direito de todos, de manter o aluno a qualquer custo dentro da escola. Na maioria das vezes o estudante está lá e não percebe a importância que a escola tem em sua vida".

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