
Quem tem mais de 20 anos de idade talvez se lembre das atividades dos primeiros anos escolares, nas quais o alfabeto era apresentado pouco a pouco, a começar pelas vogais, com letras sempre acompanhadas por imagens. O método desenvolvido pela educadora Branca Alves de Lima, falecida em 2001, foi predominante nas escolas do país durante meio século, e estima-se que alfabetizou cerca de 30 milhões de brasileiros. Hoje em sua 130.ª edição, a cartilha Caminho Suave, obra que consagrou a alfabetização pela imagem, já não é a unanimidade de décadas passadas, mas continua com vendas volumosas além de ter conquistado nichos bastante variados.A estreia da cartilha no mercado editorial ocorreu em 1948 e em pouco tempo o método se popularizou ao ponto de substituir o chamado método analítico, amplamente difundido pelo Ministério da Educação até 1945. Baseada nas dificuldades enfrentadas para alfabetizar crianças, especialmente as moradoras da zona rual, Branca Alves de Lima criou o sistema que apresentava as letras do alfabeto inseridas como iniciais dos nomes de objetos, animais e outros elementos do cotidiano, como o caso do "A" de avião, ou o "B" de bola. Figuras dos elementos citados estavam sempre ao lado da letra apresentada. Em seguida eram mostradas sílabas, com seus respectivos sons, então palavras e frases.
Segundo a professora e pesquisadora da Universidade Federal de Uberlândia Sônia Maria dos Santos, que estuda o papel das cartilhas na história da alfabetização no Brasil, para a época em que foi lançado o método era inovador. "O diferencial foi a associação que a autora fez do processo de aquisição da língua escrita com a imagem, o que era inédito no país." Para a pesquisadora, por mais que os estudos acadêmicos nessa área tenham evoluído, os números de 2010, que mostram a Caminho Suave como a mais vendida das cartilhas na livraria Folha, provam que ainda há uma grande distância entre os estudos teóricos e a prática dos educadores nas escolas.
Novos usos
Há cerca de dez anos a editora Edipro, em um acordo que envolveu o compromisso de não alterar em nada o método, comprou os direitos autorais da Caminho Suave. Desde então, atualizações foram feitas, como o acréscimo das letras K, Y e W e a inclusão de novas ilustrações, mas a essência do sistema criado pela autora permanece intacta nas atividades propostas.
A diretora da Edipro, Maíra Lot Micales, conta com orgulho que foi alfabetizada pela cartilha e revela que a publicação conquistou outros públicos mesmo depois que o MEC deixou de avaliá-la para sugerir livros didáticos baseados no construtivismo. "Vendemos muito para uma geração de avós e pais alfabetizados pela cartilha que a usam como reforço em casa com as crianças", diz Maíra, ao contar sobre a relação emocional que muitos consumidores criaram com a publicação.
Mas a Caminho Suave não parou nos saudosistas. Vendas para professores e bibliotecas ainda formam a maior parte do volume de saídas. Além disso, estrangeiros que querem aprender português e vêm de países com outro tipo de alfabeto, como os japoneses, são compradores frequentes. Pesquisadores da alfabetização de todo o mundo também encomendam o material, como confirmam lotes recentemente enviados para Inglaterra e França.
No Paraná, a Associação Escolar Passos do Saber, da cidade de Rondon, no interior do estado, foi uma das instituições que recentemente encomendaram as cartilhas da Edipro. De acordo com a coordenadora pedagógica Sílvia Nunes de Paula, a escola adotou a cartilha como material de apoio há três anos, depois de encontrar dificuldades em usar os livros atuais. "Recebemos material didático de uma rede conveniada, mas sentimos falta de uma complementação. A cartilha é mais objetiva e tem nos ajudado", diz.
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Interatividade
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