
Se para muitas crianças e adolescentes o sinal do recreio significa o começo da diversão com os colegas, para outras ele pode marcar o início de longos minutos de sofrimento. Isso porque, segundo especialistas, a hora do intervalo é um dos momentos em que mais ocorre o bullying, palavra inglesa que caracteriza qualquer forma de atitude agressiva feita repetida e reiteradamente a um ou mais alunos e que pode causar dor, angústia e até mesmo comprometer o rendimento escolar.
Uma pesquisa recente do Grupo Permanente de Estudo e Pesquisa em Bullying e Violência Escolar da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), realizada em duas escolas particulares de Curitiba, mostrou que 66% dos casos ocorriam durante o recreio. Segundo o professor de Psicologia e Pedagogia Cloves Amorim, coordenador do trabalho Bullying em Escolas Particulares de Curitiba, além desses resultados, há pesquisas anteriores (realizadas, inclusive em escolas públicas) que confirmam que o intervalo é realmente um dos períodos em que mais se concentram as agressões. "É um horário em que os professores estão longe, os alunos ficam mais livres e com tempo ocioso, o que contribui para o aumento do número de casos", justifica.
O atual levantamento que entrevistou 70 alunas e 70 alunos de quinta e sexta séries do ensino fundamental (veja no gráfico ao lado) apontou que as principais formas de agressão são a utilização de nomes ofensivos e atos de humilhação, direcionadas principalmente a estudantes ou grupos considerados diferentes pela maioria. Quanto aos sexos, apesar de a pesquisa apontar que as agressões são aparentemente mais frequentes entre os meninos (34% deles afirmam já terem sido vítimas, contra 25% delas), quando a pergunta se volta para a autoria, as meninas se reconhecem mais como agressoras do que eles. "Esse dado surpreende, até porque entre elas a agressão é bem mais sutil e perversa, envolve discriminação e difamação", afirma Amorim, que destaca ainda que entre os meninos os casos de violência física são mais comuns.
Para o pediatra Aramis Lopes Neto, membro do Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria, o caminho para diminuir os casos de bullying durante o intervalo passa pelo diálogo e pela conscientização, mais do que pela fiscalização e punição. "A experiência demonstra que a mudança depende de um trabalho de responsabilidade da escola, no sentido de estimular o convívio social sadio, baseado no respeito às diferenças. Todos devem estar envolvidos: professores, funcionários, alunos e a própria família. É preciso falar sobre o tema, inclui-lo na discussão, e não simplesmente ignorá-lo, como muitos estabelecimentos fazem", aponta.
Além disso, ele alerta aos pais que é necessário prestar mais atenção nos sinais que seus filhos dão. "Saber ouvir é fundamental. Muitas vezes a criança diz que está sendo chamada de magricela, por exemplo, e os pais ignoram, acham que é normal. Para ela, contudo, isso pode significar um grande sofrimento", diz. Lopes Neto afirma ainda que tão importante quanto identificar uma vítima é reconhecer um autor (o chamado bullie). "Alguns pais chegam a encaram essa agressividade como um sinal de uma liderança nata, mas é fundamental que eles tenham a consciência de que tão grave quanto sofrer o bullying é fazê-lo", afirma.



