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Se os cortes de investimentos no Brasil têm levado muitos pesquisadores ao exterior, a ciência produzida no país também encara outra barreira: a dificuldade de fazer os periódicos científicos nacionais prosperarem. Com um número de citações relativamente baixo quando comparados a publicações norte-americanas e europeias, as revistas brasileiras costumam ser preteridas até mesmo pelos pesquisadores daqui. 

“Não existe um preconceito com a ciência brasileira. Muito pelo contrário: estamos cada vez mais galgando nosso lugar como uma grande fonte de produção de conhecimento”, diz o médico Renan Kleber Teixeira, que pesquisa a divulgação científica de trabalhos na área. 

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“Mas, com o baixo investimento no Brasil, vivemos uma ‘fuga de cérebros’, com grandes pesquisadores saindo para o exterior. A mesma coisa acontece com nossas melhores pesquisas: elas são produzidas no Brasil, com recursos geralmente de universidades públicas, e são publicadas em revistas do exterior”, completa. 

Citações 

A preferência por publicações estrangeiras se deve a diferentes fatores – entre eles, o fato de serem periódicos mais consolidados e reconhecidos entre investigadores internacionais. 

“Como todos os melhores artigos acabam caindo em um conglomerado de revistas internacionais, acaba havendo uma maior citação delas”, resume Teixeira. “Assim, mantém-se um ciclo vicioso da fuga dos nossos melhores trabalhos e baixa citação dos periódicos brasileiros”, segue. 

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Mesmo quando pesquisadores brasileiros optam por publicar aqui dentro, as referências são dominadas por textos originalmente difundidos em revistas internacionais: em seus levantamentos, Teixeira identificou uma média de um artigo nacional para cada dez estrangeiros citados nos trabalhos publicados por periódicos brasileiros da área médica. Isso dentro do Brasil. Lá fora, é ainda menor: “em periódicos internacionais, com autores estrangeiros e nacionais, essa média não chega nem a 1%, mostrando a pouca expressão dos artigos publicados em revistas nacionais”. 

O problema disso para a ciência nacional, segundo o pesquisador, reside na maneira como a maior parte das publicações estrangeiras opera: embora a difusão seja maior, o acesso ao conteúdo é fechado, exigindo o pagamento de uma taxa para a leitura – assim, uma pesquisa desenvolvida com dinheiro público no Brasil acaba tendo o acesso aos seus resultados restringido no momento em que é publicado no exterior.  

Caminhos alternativos 

Para vencer essa barreira, as principais publicações de ponta no Brasil buscam se adequar aos padrões internacionais – desde a indexação em diferentes plataformas que facilitam um maior acesso fora do país até a adoção do inglês como idioma único para os trabalhos. 

“Procuramos seguir alguns critérios, incluindo: publicar em inglês para que os artigos atinjam a maior audiência possível, disponibilizar artigos livremente na internet, ter um corpo editorial de diversos países e formado por pesquisadores reconhecidos internacionalmente, além de ter uma política editorial com rigor científico, buscando publicar artigos de qualidade”, descreve o zoólogo Rômulo Alves, professor da Universidade Estadual da Paraíba e co-editor da revista Ethnobiology and Conservation. 

O periódico editado por Alves ainda não possui um fator de impacto (número baseado na média de citações dos artigos ali publicados) oficialmente atribuído, mas vem se destacando em diferentes plataformas como um dos mais relevantes do Brasil. No ranking da plataforma Scimago, a Ethnobiology and Conservation aparece no primeiro lugar na América Latina quando considerada a média de citações por documento publicado nos últimos dois anos. 

A internacionalização ajuda: na mais recente edição do periódico, há artigos de pesquisadores de instituições argentinas, colombianas, uruguaias, italianas, norte-americanas e até mesmo da Indonésia e do Kosovo – todos eles, é claro, em língua inglesa. 

Entender a maneira como a ciência é difundida também é fundamental, defende o biólogo Ulysses Albuquerque, da Universidade Federal de Pernambuco, também editor do periódico. 

“Todo dia novas revistas são criadas, muitas vezes sem compromisso ou conhecimento de como o sistema da comunicação científica opera”, critica. “Nós defendemos que as pessoas envolvidas diretamente com a publicação da ciência devem ser cientistas e pesquisadores ativos, que conhecem as regras do sistema e dominam conceitos básicos da comunicação científica. Isso profissionaliza um periódico”, conclui.

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