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Não adianta mais ensinar o que está no Google | /Pixabay
Não adianta mais ensinar o que está no Google| Foto: /Pixabay

Até 2027, robôs vão substituir os professores em sala de aula. Esta, ao menos, foi a polêmica afirmação do historiador inglês Anthony Seldon, da Universidade de Buckingham, durante o Festival Britânico de Ciência no final do ano passado.

A janela de uma década estabelecida por um dos mais importantes especialistas em educação do Reino Unido deixou professores em polvorosa, dentro e fora do país, que rapidamente buscaram mostrar como seu trabalho é insubstituível – bem como o contato humano dentro da sala de aula. Mas, com cada vez mais empregos sendo afetados pela automação constante, será que até mesmo os educadores estão com seus dias contados?

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Para Seldon, que expandiu sua ideia em The Fourth Education Revolution (“A quarta revolução educacional”, sem tradução em português), o futuro passa pela inteligência artificial. O pesquisador entende que, em sua grande maioria, os sistemas educacionais dos países ocidentais ainda estão pensados a partir de uma perspectiva que perdeu rapidamente o seu lugar no século 21 – com o progresso dos estudantes sendo mensurado de forma unitária, independentemente das especificidades e motivações de cada aluno. 

“Todos poderão ter o melhor professor e o ensino será completamente personalizado. O software vai acompanhá-lo durante toda a sua jornada educacional, e poderá avançar na mesma velocidade de quem aprende”, previu Seldon em sua fala no festival.

“Essas máquinas se adaptam aos indivíduos. Elas vão ouvir as vozes dos alunos, ler seus rostos e estudá-los da mesma forma que os melhores professores estudam os seus alunos”, completou. 

Segundo o especialista, esta será a “quarta revolução” educacional na história da humanidade: a primeira veio quando aprendemos os elementos básicos para a sobrevivência (como caçar, plantar e construir abrigos para as intempéries); a segunda apareceu quando se organizaram as primeiras maneiras de compartilhar conhecimento, através de “escolas” rudimentares e textos manuscritos; e a terceira teria ocorrido com a invenção da imprensa, que permitiu a difusão e preservação do conhecimento em larga escala para as gerações futuras. 

Com a inteligência artificial, entende Seldon, os estudantes poderão ser inspirados de uma forma que hoje só os melhores professores conseguem fazer. “As máquinas vão saber o que mais nos entusiasma e o que nos oferece um nível de desafio que não é nem muito difícil nem muito fácil, na medida adequada para cada um”, prometeu. 

O próprio Anthony Seldon, porém, teme o que a mudança pode trazer – de fato, ele disse compartilhar do sentimento de muitos professores quanto ao receio por uma eventual substituição.

“Se nós usarmos a tecnologia da forma errada, ela fará tudo por nós da mesma forma que os sistemas de GPS acabaram fazendo com que não saibamos mais ler mapas direito”, admitiu.

No entanto, apontou o autor, é inevitável estar preparado para o que vem por aí: “a tecnologia já começou a chegar”. 

Limitações 

Hoje, no entanto, os sistemas que Seldon acredita serem capazes de substituir os professores ainda engatinham. Estudos feitos com os robôs e softwares atuais mostram grandes limitações na capacidade de a inteligência artificial fazer o que mais se espera dela, e o que o contato humano ainda é superior: justamente, entender a especificidade de cada aluno e as suas dificuldades e motivações. Embora a dinâmica da sala de aula nem sempre favoreça essa relação, os robôs estão bem distantes do que um professor é capaz de fazer. 

“Ao lado das considerações práticas de introduzir robôs na educação, também há questões éticas. Até que ponto nós queremos que a educação das nossas crianças seja delegada às máquinas?”, questiona Tony Belpaeme, professor de robótica da Universidade de Plymouth, em artigo publicado no primeiro semestre deste ano na revista Science Robotics.

“Em geral, os alunos têm dado respostas positivas sobre as suas experiências, mas os pais e educadores adotam uma atitude mais cautelosa”, escreve. 

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Ainda assim, mesmo Belpaeme acredita que, com o tempo, as dificuldades atuais tendam a ser superadas – não para substituir inteiramente os professores, mas como uma ferramenta que passe a ocupar cada vez mais tempo no cotidiano das salas de aula.

Apesar das questões levantadas, os robôs têm mostrado grande potencial quando ensinam tópicos mais restritos, e seus efeitos quase igualam aqueles obtidos com uma tutoria humana. Embora o uso de robôs na educação seja limitado por desafios logísticos e técnicos atualmente, é muito provável que as salas de aula do futuro utilizem robôs como assistentes a um professor humano. 

Potencial 

“No sentido mais amplo, robôs sociais têm o potencial de se tornar parte da infraestrutura educacional da mesma forma que o papel, os quadros e os tablets [já são utilizados]”, entende Belpaeme.

“Robôs podem abrir um tempo livre precioso para os professores, ajudando-os a focar no que os humanos ainda são melhores – oferecer uma experiência educacional abrangente, empática e recompensadora”, continua.

De fato, o meio-termo entre a utilização crescente de inteligência artificial e a manutenção de professores tem sido um caminho muito defendido por estudiosos. Para Rose Luckin, pesquisadora do Laboratório do Conhecimento da University College London, o maior desafio reside na enorme distância que ainda há para se alcançar uma inteligência artificial de cunho generalista – hoje, os robôs se aproximam do desempenho humano, com potencial para superá-lo apenas em tarefas específicas. 

“Não acredito que qualquer robô é capaz de preencher a ampla gama de tarefas que um professor humano realiza diariamente. E também não acredito que os robôs desenvolverão o vasto repertório de habilidades que um professor humano possui”, disse Luckin em uma entrevista ao site Futurism.

No entanto, os investimentos crescentes nessa área da tecnologia indicam que grandes mudanças virão nos próximos anos, dentro e fora das salas de aula – o investimento mundial em inteligência artificial cresceu quase dez vezes entre 2012 e 2016, passando de US$ 590 milhões para mais de US$ 5 bilhões no período, e as diferentes aplicações das descobertas serão percebidas cada vez mais. 

O ideal, apontam pesquisadores, é que a tecnologia seja usada para tornar o aprendizado mais eficiente – bem como o trabalho dos professores. Novos sistemas poderiam ser empregados, por exemplo, para poupar o tempo que hoje os educadores perdem corrigindo testes ou, simplesmente, preenchendo cadernos de chamadas. 

Outro uso de tecnologias avançadas como assistência aos professores poderia ser o emprego de softwares capazes de identificar as reações verbais e não-verbais dos alunos em tempo real, dando aos professores uma ideia mais clara de onde residem as dificuldades de seus estudantes – e o que funciona melhor no processo de ensino.

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