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Evidências sugerem que a suspensão escolar não é uma abordagem eficiente. | Pexels
Evidências sugerem que a suspensão escolar não é uma abordagem eficiente.| Foto: Pexels

Uma das práticas mais comuns para disciplinar, a suspensão é também uma das mais controversas. O ato, que consiste em punir o aluno por meio de um afastamento temporário do ambiente escolar, gera controvérsias por retirá-lo de um ambiente de aprendizagem como uma resposta a problemas que podem estar relacionados ao próprio processo de aprendizado. 

Estudo realizado por pesquisadores do Rochester Institute of Technology indica que as suspensões não diminuem os problemas de comportamento dos alunos. Segundo a pesquisa, estudantes de ensino fundamental e médio que foram suspensos pelo menos uma vez tiveram maior probabilidade de receber novas suspensões. 

“Suspensão pela suspensão, pelo simples ato de tirar o aluno de sala sem nenhum tipo de ação complementar, não tem qualquer benefício. Não é produtivo, nem assertivo ou traz qualquer tipo de mudança significativa”, diz Edileide Castro, mestre em psicologia multifocal e psicanalista clínica. 

Já nos EUA, o distrito escolar de Miami-Dade aboliu as suspensões desde o ano letivo passado. A medida é uma mudança no cenário educacional do país, onde 3,5 milhões de alunos foram suspensos no ano letivo de 2011, segundo dados do Departamento de Educação dos EUA. 

A alteração aconteceu por meio de um projeto chamado Repensar a Disciplina (Rethink Discipline), iniciado em 2014. No lugar da punição, escolas passaram a adotar uma abordagem holística para lidar com as causas por trás do comportamento, analisando aspectos emocionais, sociais, pessoais e de saúde de cada estudante que apresenta problemas comportamentais. 

Método agressivo 

Uma análise publicada pelo Instituto Nacional de Criminologia da Austrália indica que a suspensão não traz mudanças para os problemas de comportamento dos alunos e recomenda uma reforma do padrão tradicional de suspensões. “Hoje existem evidências suficientes que sugerem que a suspensão escolar não é uma abordagem eficiente para reduzir os problemas de comportamento dos alunos, em concordância com diversos estudos que mostram que punição não funciona”, diz o relatório.

A diferença principal do sistema adotado pelo distrito de Miami-Dade é a eliminação de uma forma de punição padronizada, que costuma retirar o aluno do ambiente escolar e privá-lo de tempo de aprendizagem, e a substituição por soluções individuais para cada aluno, de acordo com as especificidades que causam o comportamento inadequado. 

O processo de investigação das raízes de problemas comportamentais é meticuloso e exige maior colaboração entre os membros da comunidade escolar, investimento de recursos humanos e financeiros e envolvimento dos pais. 

“Um aluno que está passando por uma fase de problemas emocionais com certeza terá um comportamento inadequado. A própria neurociência explica: temos exames e estudos comprovando, mas a escola ignora todos esses fatores que são extremamente relevantes, e acha que o aluno é um ser quando está em casa e é outro na instituição”, explica Edileide. 

Resultados práticos 

Uma das medidas adotadas pelas escolas do distrito é a disponibilização de Centros de Sucesso para Estudantes, um ambiente de aprendizado onde os alunos podem receber assistência acadêmica, social e emocional – são 11 centros disponíveis no distrito escolar. 

O novo sistema trouxe como resultado uma diminuição constante dos casos de alunos com problemas de comportamento. Em 2014, primeiro ano de vigência do sistema, mais de 20 mil alunos foram direcionados para os Centros de Sucesso. Em 2015, o número caiu para 4.530 alunos, mantendo o índice de zero suspensões. 

A melhoria de comportamento dos alunos não se limita à esfera escolar: em 2016, o número de adolescentes detidos no distrito caiu 44% em relação a 2014. A abordagem holística das escolas de Miami-Dade vai além dos Centros de Sucesso. O distrito também instituiu programas de prevenção e intervenção, como programas de engajamento cívico e de formação profissional para adolescentes com comportamento de risco. 

Efeito colateral 

A abolição total de suspensões é uma medida experimental que, apesar dos resultados, ainda gera dúvidas quanto a sua aplicação prática. No distrito de Miami-Dade, o fim das suspensões veio acompanhado de um aumento no número de faltas não justificadas dos alunos. Em 2014, o número de faltas foi de cerca de 30 mil em todo o distrito escolar; ao final do ano letivo de 2015, o número subiu para mais de 50 mil. 

Especialistas especulam que o aumento corresponda a suspensões não oficiais, em que as escolas mandam os alunos para casa sem autorização do poder público. “O distrito escolar pode estar alegando que eliminou as suspensões do jeito que conhecemos, mas, na verdade, a prática voltou com outro nome e não está sendo repassada corretamente para o estado”, diz Bernie Perlmutter, diretor da Children and Youth Law Clinic, escritório de defesa legal de crianças e adolescentes da University of Miami, em entrevista à emissora local WLRN. 

Mesmo com iniciativas como a esta, a primeira reação a problemas de comportamento costuma ser dos professores e funcionários da escola, já que as infrações ocorrem na sala de aula e nos corredores: é primordial oferecer treinamento para a comunidade escolar quanto a alternativas a punições tradicionais como a suspensão. 

“Quando você não treina os professores e a equipe da escola quanto a o que eles deveriam priorizar e como deveriam processar uma infração de um aluno, isso criará outros problemas”, explica Carla Hernandez-Mats, presidente do sindicato de professores United Teachers of Dade, para a WLRN

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