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O número ainda é inegavelmente alto. Em grande parte do mundo, a maioria dos jovens acredita que ter um curso superior é a melhor maneira de melhorar de vida – e décadas de estudos comprovam a relação entre maiores salários e mais tempo de escolaridade. 

Mas, nos últimos anos, diferentes pesquisas vêm mostrando uma nova tendência, no sentido oposto: embora o valor conferido à educação superior continue alto, as enquetes realizadas com jovens em idade universitária indicam que eles estão se tornando receosos com o investimento (financeiro e temporal) em uma formação mais longa. Em países como Inglaterra e Estados Unidos, a quantidade de jovens recém-saídos do ensino médio que consideram a universidade o melhor caminho vem batendo recordes negativos. 

Os altos custos do ensino superior, a dificuldade de encontrar empregos em um mercado em que o diploma deixou de ser um diferencial e até mesmo a abertura de vagas para cargos qualificados mesmo sem uma graduação estão entre os sinais apontados como desestimulantes (e às vezes contraditórios) pelos jovens no momento de pensar os seus futuros.

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No início do mês, o Glassdoor, um site norte-americano de busca de empregos, revelou que quinze grandes companhias de tecnologia e serviços já não exigem formação específica de seus empregados, desde que consigam comprovar experiências práticas no cargo oferecido. Empresas como Apple, Google e a IBM já estão abrindo vagas desse tipo até mesmo na área de programação. No ano passado, a IBM revelou que pelo menos 15% de seus funcionários nos EUA não possuem qualquer formação pós-secundária. 

De fato, a percepção dos estudantes norte-americanos sobre a importância da educação superior como porta de entrada para uma vida melhor tem se alterado gradativamente conforme o ensino universitário foi se tornando mais comum. Em 2016, pesquisadores da Universidade Estadual de San Diego, na Califórnia, publicaram um dos mais extensos estudos nesse sentido: eles analisaram as respostas dadas por mais de 8 milhões de ingressantes na universidade, entre 1971 e 2014, sobre o que consideravam mais importante como resultado de seus estudos – em questões como “ser capacitado para conseguir um emprego melhor”, “poder ganhar mais dinheiro” ou “aprender sobre coisas que me interessam”. 

A pesquisa mostrou uma inversão de valores ao longo das décadas: enquanto um aluno iniciando os estudos nos anos 70 considerava o aprendizado e a educação os aspectos mais importantes a serem obtidos com a formação universitária, um jovem da atualidade valoriza mais a questão financeira – nas quatro décadas desde o início do levantamento, “ganhar dinheiro” saltou de 55% para 71% no total de menções por parte dos alunos quando perguntados sobre suas razões para entrar na universidade. 

Custos elevados 

A explicação para essa mudança tem a ver com o aumento do custo de vida nos Estados Unidos desde então, um encarecimento que não foi acompanhado na mesma proporção pelos salários. Os custos crescentes foram particularmente sentidos na educação: enquanto um jovem pagava uma média de 358 dólares por ano (cerca de US$ 3 mil em valores atualizados) para estudar em uma universidade pública na década de 70, hoje esse valor oscila entre 20 mil e 34 mil dólares ao ano, dependendo do estado onde se realizam os estudos. 

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Enquanto o custo do ensino superior explodiu em mais de 9.000% em alguns locais, a renda média nos EUA aumentou apenas 51% entre 1970 e 2016, saltando de 55 mil para 83 mil dólares anuais. Hoje, a dívida acumulada em empréstimos estudantis nos Estados Unidos ultrapassa a marca de 1,3 trilhão de dólares, segundo o Departamento de Educação. 

O drama das dívidas em função da educação não só faz os jovens pensarem duas vezes sobre até que ponto vale a pena perseguir um diploma universitário – eles também estariam dispostos a tomar medidas extremas para se livrar das contas a pagar. 

Um estudo da Credible, uma organização especializada em empréstimos estudantis, revelou no ano passado que quase metade (49,8%) dos estudantes norte-americanos estariam dispostos a abrir mão do direito de votar nas eleições presidenciais em troca do perdão de suas dívidas.  

Poucas alternativas ao ensino universitário 

A situação vai se tornando similar na Grã-Bretanha onde, embora mais barato, o custo do ensino também tem subido mais rapidamente que a renda média da população. O mais recente levantamento britânico nesse sentido veio à tona em meados de agosto, divulgado pelo Sutton Trust, uma das principais fundações do Reino Unido dedicadas a promover a mobilidade social através da educação. 

De acordo com a pesquisa da organização inglesa, o número de jovens que consideram “importante” frequentar uma universidade, embora permaneça alto, vem caindo sem parar ao longo dos anos – hoje, são 75%, uma queda de onze pontos percentuais em apenas cinco anos. 

A enquete ouviu 2,3 mil adolescentes entre 11 e 16 anos na Inglaterra e no País de Gales, e também constatou uma diminuição naqueles que diziam acreditar que chegariam ao ensino superior. Apenas 32% diziam considerar “muito provável” que iriam à universidade – em 2013, a porcentagem batia em 38%. 

Para Peter Lampl, fundador do Sutton Trust, os jovens desiludidos com o ensino superior simplesmente respondem a um dilema que o sistema de ensino ainda não sabe contornar: “se eles vão para a universidade, acumulam dívidas acima de 50 mil libras, que ficarão pagando até a meia-idade. E muitos deles ainda obterão diplomas que não serão capazes de posicioná-los em empregos qualificados”, comentou Lampl quando os resultados foram anunciados. 

“Por outro lado, formações profissionalizantes são quase inexistentes, com menos de 10 mil matrículas disponíveis a cada ano comparadas a mais de 300 mil vagas nas universidades”, apontou Lampl. “Na prática, não existe uma alternativa viável à universidade”.

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