Ouça este conteúdo
Um em cada cinco eleitores brasileiros desconfiam da segurança das urnas eletrônicas. De acordo com pesquisas divulgadas pelos institutos Quaest/Genial e CNT/MDA nas primeiras semanas do mês de maio, menos de cinco meses antes das eleições, a desconfiança do eleitor brasileiro no modelo de urna está entre 22% a 28,6% segundo os dois institutos, respectivamente.
“No mundo digital de hoje, é fácil levantar dúvidas, ou mesmo achar que existem fraudes ou erros nos programas das urnas que podem macular a vontade do eleitor. Isso sem falar nos hackers e em alguém que possa estar infiltrado no processo que vai do projeto da urna até a proclamação dos eleitos”, diz o engenheiro de computação e professor Eduardo Guy de Manuel.
Mesmo com esse índice, a desconfiança do eleitor brasileiro nas urnas eletrônicas tem oscilado para baixo ao se aproximar das eleições deste ano. A pesquisa da CNT/MDA apontou que, em julho de 2021, 34,5% diziam não confiar no equipamento ou confiar pouco, número que caiu para os 28,6% registrados em maio deste ano.
Já o levantamento da Quaest/Genial também apresentou queda em relação à primeira medição, realizada em setembro de 2021. Na ocasião, os entrevistados que declararam não confiar na segurança das urnas somavam 29%, enquanto em maio deste ano o índice caiu para 22%.
Nas eleições municipais de 2020, o porcentual daqueles que não confiavam na contagem eletrônica dos votos estava em 28%, segundo uma pesquisa do PoderData feita alguns dias antes do segundo turno – o primeiro turno foi marcado por um atraso na divulgação dos resultados, que fomentou discussões sobre o tema na época. A mais recente sondagem feita pelo instituto, em janeiro de 2022, mostrou uma pequena oscilação negativa para 27%. Mass ao mesmo tempos identificou uma queda significativa na confiança das urnas eletrônicas, que caiu de 64% em novembro de 2020 para 57%. A migração ocorreu para o grupo que não sabia como responder a pergunta, que passou de 8% a 16%.
Eleitores de Bolsonaro, Lula e indecisos: como eles veem a votação eletrônica
Dentre os eleitores que desconfiam da segurança das urnas eletrônicas, os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) puxam a lista de insatisfeitos. Na pesquisa Genial/Quaest, 36% dos entrevistados que declararam voto no atual chefe do Executivo Nacional apontaram não confiar na apuração eletrônica de votos.
Já os eleitores que declararam intenção de voto ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) são menos propensos a desconfiar das urnas eletrônicas: apenas 16% deles não têm confiança no sistema. Um porcentual semelhante é verificado dentre os eleitores que não desejam votar em Bolsonaro ou Lula, mas sim em outro candidato: 18% não achavam que o sistema das urnas eletrônicas não é totalmente confiável, segundo a pesquisa. Já dentre os eleitores indecisos, 22% também apresentam desconfiança sobre a segurança nas urnas eletrônicas.
“Quando se esmiúçam os resultados, o índice de desconfiança é pelo menos duas vezes maior entre apoiadores do presidente Bolsonaro do que entre apoiadores dos demais candidatos. Então, é possível supor que as críticas do presidente ao sistema de votação repercutem mais sobre seu eleitorado mais fiel”, diz o cientista político Rodrigo Horochovski, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná).
VEJA TAMBÉM:
Discussão sobre urnas eletrônicas deve se estender para as próximas eleições
Um dos principais questionamentos acerca do processo eleitoral no Brasil é que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é responsável por todos os trâmites antes, durante e após as eleições. Na opinião de Guy de Manuel, isso contraria as recomendações da Norma Internacional ISO/EIC 27.001, que norteia a segurança de dados em todo mundo.
“O básico da norma diz que quem faz, não verifica; quem verifica, não faz. Não é o que ocorre com o processo eleitoral, mesmo com os diversos grupos especializados ou interessados que podem legalmente interagir com o TSE”, explica Guy de Manuel.
Ele afirma ainda que o Brasil é aderiu à norma internacional ISO/EIC 27.001 e, por isso, a atuação exclusiva do TSE em todos os processos das eleições contraria ao pacto do qual o país é signatário. O especialista espera que o órgão possa trabalhar em melhorias para as eleições municipais de 2024.
“Como tudo no mundo digital, os processos evoluem, tornam nossa vida mais confortável e fácil. Mas sempre há a corrida rumo à perfeição, tanto da segurança total como das buscas de fragilidades que possam deturpar o resultado esperado”, diz Manuel.
Já Horochovski avalia que a adição de recursos como a impressão do voto nas urnas eletrônicas, além de gerarem mais custos à União, ainda não trariam efetividade na garantia da segurança nas eleições.
“A introdução de mais essa etapa implicaria a adoção de mecanismos de segurança adicionais, para a proteção dos locais onde os votos impressos seriam armazenados. É possível que o sistema ficasse, aí sim, sujeito a fraudes. Isso, além da tendência à instabilidade política em função do provável aumento da judicialização do processo eleitoral”, diz Horochovski.
Procurado pela reportagem, o TSE não retornou os questionamentos até o fechamento dessa matéria.
Metodologia das pesquisas citadas
Pesquisa do instituto MDA, contratada pela CNT (Confederação Nacional do Transporte), foi feita ouvindo 2002 pessoas, por telefone, entre os dias 4 e 7 de maio. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais, com um nível de confiança de 95%. O registro no TSE é BR – 05757/2022.
Pesquisa Quaest/Genial entrevistou 2.000 pessoas acima de 16 anos entre 5 a 8 de maio de 2022. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para um nível de confiança de 95%. As entrevistas foram feitas com o método de face-a-face através de questionários estruturados para a coleta de informações. O registro no TSE é BR-01603/2022.
Pesquisa do PoderData, de novembro de 2020, ouviu por telefone 2,5 mil eleitores entre os dias 23 e 25 daquele mês. Já para a pesquisa de janeiro de 2022 foram feitas 3 mil entrevistas, por telefone (fixo e celular). A margem de erro de ambas é de dois pontos percentuais. Como não são pesquisas eleitorais e sim de opinião, não estão registradas no TSE.