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Entrevista

Falta de punição e problemas sociais são as causas da criminalidade

Marcus Vinicius Michelotto, delegado-geral da Polícia Civil

 | Walter Alves/Gazeta do Povo
(Foto: Walter Alves/Gazeta do Povo)

O delegado-geral da Polícia Civil do Paraná, Marcus Vinicius Michelotto, 43 anos, foi alçado ao cargo mais importante da instituição mesmo tendo sido um policial da linha de frente do governo passado. Ele chefiou unidades importantes como o Centro de Operações Policiais Especiais (Cope) e a Delegacia de Estelionato e Desvio de Cargas (DEDC) durante a gestão de Roberto Requião, opositor ao atual governo. Hoje Michelotto é um dos chefes da segurança pública do governo Beto Richa.

Formado em Direito na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 1991, tornou-se delegado três anos depois. Em 12 de janeiro deste ano assumiu o mais alto posto dos policiais civis. Ele recebeu a reportagem da Gazeta do Povo no departamento da Polícia Civil, onde apresentou suas ideias sobre segurança pública e defendeu o atual governo. Michelotto prometeu transparência, mas indagado sobre a corregedoria exemplificou que o Poder Judiciário não permite sequer que sejam divulgadas as iniciais dos juízes detidos. Ele ainda prometeu reestruturar a polícia e melhorar o atendimento à população. "As pessoas vão à delegacia e se assustam. Acham um absurdo, se sentem aviltadas. Imagine o policial civil que vive dia e noite naquele lugar cuidando de presos, de objetos apreendidos – dos quais não deveria cuidar –, sem ter uma delegacia arejada", afirma. Confira a entrevista:

Como o senhor encontrou a Polícia Civil quando tornou-se delegado-geral?

Encontrei de forma precária administrativamente. O departamento da Polícia Civil não tinha setor algum funcionando a contento. Eu não tinha levantamentos e ainda tenho dificuldade de ter um sobre as dificuldades da polícia. Não havia uma unidade administrativa e de planejamento eficiente. Hoje estamos arrumando toda essa parte. Agora a Secretaria [de Estado da Segu­rança Pública] está estudando adquirir um software para fazer um raio X da instituição.

Qual o maior problema da segurança pública?

Pela falência do sistema penitenciário, o que se visualiza hoje no país é a criação de mecanismos para que o cidadão responda sempre pelo crime em liberdade. Evita-se até o último instante a prisão. Esse caminho é totalmente errado. A grande causa da criminalidade, além dos problemas sociais, é a falta de punição. Cidadão que comete o crime tem que ir preso – mas em um local adequado, para que possa ser ressocializado. É preciso ter penas severas e que realmente sejam cumpridas. No Paraná, o problema é de pessoal, que agora está sendo restabelecido com contratações. Teria que haver pelo menos o dobro de efetivo. Hoje tenho 20% do efetivo recuperado devido ao programa Paraná Seguro, mas ainda não posso, pela situação de emergência pela qual passamos, nem mesmo colocá-los na escola de polícia para fazer curso.

Mas muitos delegados reclamam que funcionários novos têm atrapalhado o trabalho policial.

Acredito que o último chamamento é o que vai atropelar o processo, quando os policiais vão à delegacia para depois irem à escola. No governo anterior ocorreu a mesma coisa. Tenho 215 policiais que estão há mais de um ano sem escola. Fizemos esse ano o curso de armamento e tiro pelo menos para eles.

Mas esses policiais sem escola não acabam reduzindo a porcentagem de punição por não estarem preparados?

Isso não quer dizer que eles não têm qualidade. Hoje eles trabalham em grupos. Dentro de uma equipe tem policial formado e não formado. Os policiais também ganham experiência de rua. O que fizemos agora? Colocamos policiais [recém-convocados] para registrar boletim de ocorrência. Se os delegados reclamam, é uma incoerência. Eles vivem reclamando que não têm estagiário na delegacia. Eu estou dando esse estagiário a eles. E se esses policiais sem preparo estão trabalhando no processo comum de uma investigação ?

[Os delegados] Estão equivocados, então. Eu não vou colocar esses policiais quatro meses na escola agora se tem Natal, ano-novo, férias de verão e muitos policiais sendo deslocados para a Operação Verão. Não seria o caminho ideal, mas é o que podemos fazer agora. Nesse período vamos formar todos os policiais no curso de armamento e tiro. E até o ano que vem todos vão estar formados. Os novos não estão lá, neste momento, para fazer trabalho policial. Quando as delegacias do Paraná serão esvaziadas?

O projeto está em andamento. Em Curitiba já se sente uma resposta do sistema penitenciário. Temos a promessa de que até o fim do ano todas as delegacias do Litoral estarão esvaziadas e que novas serão construídas. Essas unidades não terão carceragem. Aqui na capital teremos esvaziamento de todos os distritos que têm mulheres presas, o 9.º Distrito, o Centro de Triagem 1 e também em Quatro Barras (RMC). Além disso, já temos um provimento da Corregedoria da PC, com nosso apoio, proibindo os delegados do interior de receberem presos de regime semiaberto. Não é possível que eu chegue a cidades do interior como Guaíra e o delegado seja responsável pelos presos homens e mulheres do regime fechado e ainda do semiaberto.

Como a polícia planeja atingir as áreas com mais crimes em Curitiba?

O secretário determinou que ocorram ações contundentes em determinadas áreas de Curitiba. Não é uma UPP porque esse é um modelo para a realidade do Rio de Janeiro. Mas o secretário pediu para que fizéssemos um planejamento de pacificação de algumas áreas, retomando as localidades com a presença do Estado. Iniciaremos diálogos com a comunidade, com as escolas, empresários, já no começo do ano que vem. A partir dali entenderemos o que a localidade precisa do poder público. Com relação aos bares: não há como dissociar o combate à criminalidade sem uma limitação a eles nas regiões onde os índices de violência são altos. Vamos limitar o horário deles e estamos propondo isso para o município. Faz parte do plano municipal de segurança?

Existe uma conversa muito boa entre o estado e o município. O diálogo está amadurecendo e a ação da Polícia Civil faz parte deste contexto.

Como andam as investigações dos crimes em torno das escolas? Não falta uma atenção especial a essas regiões, como o Jardim Sabará?

Temos um grande projeto de redução dos crimes de homicídio. Tudo isso passa pelo combate às drogas. A Divisão Estadual de Narcóticos também vai atuar para atingir as quadrilhas de bairro, para chegar também ao pequeno traficante. Esse é o crime que gera homicídio. Sobre as escolas, o Cope vai atuar com o Denarc da mesma forma. Em áreas mapeadas, junto com a PM e a Guarda Municipal, na saída e entrada de escolas, para descobrir quem está no entorno desses locais.

Como resgatar a confiança da população na polícia?

A população tem de entender que os policiais civis são pessoas. Também são vítimas da falta de investimento do estado. Fazemos uma polícia civil e militar extremamente boa dentro das condições que vivemos. Qual delegacia tem um espaço digno para atender a população? As pessoas vão à delegacia e se assustam. Acham um absurdo, se sentem aviltadas. Imagine o policial civil que vive dia e noite naquele lugar cuidando de preso, de objetos apreendidos – dos quais não deveria cuidar –, sem ter uma delegacia arejada? Vamos melhorar a qualidade de vida do policial, desde a questão da reforma do estatuto até a melhora salarial do policial.

Não falta mais transparência na corregedoria com relação à prisão e exclusão de policiais para a população poder diferenciar o bom e o mau policial?

O poder judiciário estabeleceu que nem a primeira letra dos nomes dos juízes pode ser divulgada hoje, quando é preso por corrupção. Esse questionamento é feito pela sociedade para os juízes?

A imprensa faz isso diariamente, delegado...

Mas os nomes dos policiais presos são divulgados sempre. Na minha gestão vai ter transparência. A Corregedoria está sendo reestruturada, estamos dando policiais necessários para retomar esse trabalho. Não vai haver omissão. Vamos ser rigorosos. Transparência total.

Como está o andamento do novo estatuto da Polícia Civil?

Está em estudo na Secretaria da Segurança Pública e contém uma modernidade estrutural, um avanço salarial. Não é possível um policial da base hoje ser o menor salário de terceiro grau do estado. Estamos trabalhando também a criação de uma delegacia racial, de proteção a minorias. Será uma delegacia com cerca de dez policiais. As delegacias vão ficar abertas 24 horas após a aprovação do estatuto?

O Centro Integrado de Aten­­dimento ao Cidadão (Ciac) está no primeiro distrito e no oitavo para atender flagrantes. Já conseguimos contratar 695 policiais este ano. O terceiro, o sexto, sétimo e o décimo distrito são delegacias que não têm preso e já atendem 24 horas. Apenas para fazer registro de B.O. e termo circunstanciado, porque não há escrivães. Enquanto não tiver efetivo não vamos abrir as delegacias todo o tempo.

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