
A multidão atenta aguarda a passagem do grupo pela avenida principal. O desfile cívico com a apresentação da fanfarra é tradicional na cidade, mas o que se ouve na ocasião está longe de ser uma clássica marchinha. O público reconhece as notas executadas pelas liras por já tê-las ouvido incansavelmente a fanfarra está tocando Lady Gaga. "Bad Romance", hit da cantora nova-iorquina, ultrapassou as ondas do rádio e, no ano passado, fez sucesso nos arranjos de fanfarras que se apresentam em desfiles por todo o Paraná existem vários vídeos disponíveis no YouTube. Mas na fanfarra comandada pela maestra curitibana Silvia Rolim, Lady Gaga passa longe. "Aqui não", disse aos alunos que pediram a inclusão das músicas da cantora no repertório.
VÍDEO: Assista a um ensaio da fanfarra da Escola Municipal Coronel Durival Britto e Silva
Silvia aprendeu o ofício com o pai, o maestro Maximiano Pereira da Silva, de 70 anos. Vem dele também a opção de executar músicas clássicas nas fanfarras que coordenam. Max, como é conhecido, também se apaixonou pela música por influência do pai, João Pereira da Silva, clarinetista que faleceu em 2001, aos 102 anos, de quem fala com saudade. "Ele tocava como ninguém e nossa família aprendeu tudo com ele", diz.
O maestro, com os irmãos Isaías e Levi, e os filhos Irajá e Silvia, e quase toda a família Pereira da Silva comandam grande parte das fanfarras de Curitiba. "No último desfile de Sete de Setembro, o orador falava: lá vem mais um filho do Max comandando outra fanfarra", diverte-se. "No Natal, por exemplo, a gente se reúne, cantamos e tocamos juntos", conta. É uma verdadeira farra em família.
Carreira
Irmão mais velho entre os oito filhos de João, Max chegou a dar aulas nas fanfarras em que os irmãos tocaram. Foi ele o grande incentivador da carreira dos familiares como regentes. "Em 1990, ele me mandou para Coronel Vivida [Norte do Paraná] para ensinar outros maestros e eu não tinha experiência. Ele nem soube, mas fui daqui até lá chorando, sem saber o que ia fazer", revela Levi.
Hoje, os irmãos já são maestros consagrados. Levi comanda a fanfarra da Guarda Mirim do Paraná há 16 anos e Isaías está à frente de pelo menos cinco grupos em Curitiba. Ele integra o projeto Fanfarra Infanto-Juvenil, da Secretaria Municipal de Educação, que promove a atividade no contraturno de 30 escolas da capital paranaense.
Silvia, que também faz parte do projeto, começou a carreira como flautista, mas se rendeu ao atabaque contra a vontade de Max. "Ele arregalou os olhos e falou: minha filha não vai tocar percussão", conta. Já Irajá é um dos coordenadores do Espaço Vida e Música, outro projeto da prefeitura, e atua como regente de um grupo formado por alunos de 1.ª a 4.ª série. "Eles chamam a atenção em qualquer apresentação e começam a se desenvolver desde cedo com a música, é muito gostoso", diz.
Música e educação
Depois de passar pelo comando de várias fanfarras em Curitiba, entre elas a do Colégio da Polícia Militar do Paraná e do Comando do Corpo de Bombeiros, Max é, há quatro anos, o responsável pela banda da Escola Municipal Coronel Durival Britto e Silva, no bairro Cajuru. "Já me aposentei, mas não consigo largar o trabalho", conta. Um dos fatores que não o deixam abandonar as fanfarras é o efeito positivo que a música gera nas crianças. "A gente procura não fazer arte pela arte. Procuramos fazer arte pela educação e isso tem feito muita diferença", diz o maestro.
O estudante Cristofer Skorie é um exemplo desse efeito. Ele começou a tocar em fanfarras há dez anos, na Guarda Mirim, em Fazenda Rio Grande, quando Max regia a banda. Atualmente, ele ajuda o maestro na fanfarra da escola, ensinando o manuseio das cornetas e trompetes. "Já fizeram isso por mim, e agora estou fazendo por eles. Na fanfarra aprendi muita coisa, mudei minha vida", conta. Max relembra o desenvolvimento do ajudante. "Ele quase não podia com o peso do instrumento. De repente, começou a tocar e criar dentro da música, é isso que dá força para a gente", descreve o maestro sobre o ex-aluno que agora estuda na Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap).
Irajá acredita que o trabalho da família não ajuda apenas a formar profissionais. "Nada substituiu a sensação de passar o conhecimento. Nossa missão é educar, formar cidadãos e nossa ferramenta é a música", resume. Max, o maestro apaixonado, que não sabe dizer quantas crianças já passaram pela sua regência, ajuda a entender o significado do ofício para os Pereira da Silva. "A música acalenta os corações, embala os amores, acalma os irados, cadencia os desfiles, canta as pátrias e anima o mundo. Uma frase musical composta em qualquer lugar do mundo pode ser lida sem tradução alguma", define, antes de reger sua fanfarra, de olhos fechados, apenas com a ajuda de sua inseparável corneta, confirmando: é a linguagem universal, de todos os povos.
Confira algumas fotos da banda
CADERNO G | 2:53
Integrante da família Pereira da Silva, Max é o regente da fanfarra da Escola Municipal Coronel Durival de Brito e Silva, do Cajuru, em Curitiba. Segundo o maestro, os alunos que fazem parte do grupo se sobressaem nos estudos com a ajuda da música.













