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Weverton tinha bons motivos para comemorar. Após um susto no começo do jogo, o Atlético se recuperou e bateu o Vitória por 4 a 1 pela décima rodada do Brasileirão. Era o quarto triunfo seguido do Furacão no campeonato, sequência que deixava o time próximo à briga por uma vaga na Libertadores. Minutos depois, o goleiro atleticano publicou em seu perfil no Instagram uma imagem celebrando o resultado. Hora perfeita para receber o carinho da torcida. Até que surge o primeiro comentário: “Ferrou meu Cartola”.

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Não foi um caso isolado, muito longe disso. O Cartola FC tem invertido a lógica na relação jogador-torcida. Nele, o usuário tem uma quantidade limitada de dinheiro para montar um time e pontuar de acordo com o desempenho dos atletas em campo. Esse modelo de jogo é conhecido no mundo como fantasy. A versão do Brasileirão foi criada pela Globo em 2005, mas decolou apenas nos últimos anos. Na atual temporada, são mais de 5,5 milhões de equipes ativas. Para os cartoleiros mais aficionados, fazer poucos pontos é tão ou mais grave quanto ver seu clube do coração tropeçar. E aí, as cobranças do jogo fictício vão para o mundo real.

Logo na primeira rodada da Série A, o Corinthians empatou em casa com a Chapecoense e o lateral-esquerdo Guilherme Arana foi alvo de reclamações: “Fazer boa pontuação no Cartola que é bom… Nada!”. O clube paulista reagiu e assumiu a liderança do campeonato, mas nem assim os cartoleiros deixaram de usar as redes sociais para pegar no pé dos atletas. O meia Jadson foi criticado depois da vitória corintiana sobre o Vasco por 5 a 2 no Rio de Janeiro. Teve de responder de maneira mais firme: “Irmão, o importante é o time vencer, independente de qualquer coisa. Se importa para você o Cartola, tem vários jogadores para você escalar no seu time! Em primeiro lugar, o Corinthians. Depois outras coisas”.

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O caso mais emblemático do quanto os atletas estão incomodados com esse novo tipo de cobrança - uma que aparece até em bons resultados - vem do Bahia. No início de junho, o zagueiro Tiago Pagnussat discutiu com torcedores nas redes sociais após ser cobrado pela pontuação no Cartola durante a vitória de sua equipe por 3 a 0 sobre o Atlético-GO. O volante Édson tomou as dores do colega e postou no Instagram: “Passando para agradecer o carinho que vocês têm por mim. Agora, a partir de hoje, quem vir comentar em relação a esse negócio de Cartola no meu Instagram infelizmente eu terei de bloquear. Porque isso enche o saco e não condiz com o que foi a partida. Às vezes recebemos até ameaças e xingamentos com a família. Então, por favor, nada de Cartola aqui”.

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A irritação se justifica. Não apenas pelo assédio em si, mas porque essas manifestações nem sempre têm base no desempenho real do jogador. A pontuação do Cartola, como de qualquer jogo fantasy, está condicionada aos fundamentos definidos no regulamento. Muitos elementos de uma partida acabam ficando de fora, o que podem tornar uma boa atuação com a bola rolando em uma má pontuação no jogo virtual. Um exemplo foi o do palmeirense Guerra. O meia foi considerado o melhor em campo na vitória de sua equipe sobre o Atlético-GO, mas fez -2,9 pontos. O motivo foram os sete passes errados (-2,1 pontos), a falta cometida (-0,5) e o cartão amarelo tomado (-2). De positivo, ele teve apenas uma finalização errada (0,7) e uma finalização defendida pelo goleiro (1). O Cartola não considerou que o venezuelano criou várias oportunidades para os companheiros, pois nenhuma delas resultou em gol e, portanto, não foram contabilizadas como assistências.

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Sem clubismo

O Cartola é só um jogo, mas muito cartoleiro acaba desenvolvendo uma relação real com suas equipes, a ponto de chegar a torcer mais pelo sucesso dos atletas que escalou do que pelo time que simpatiza. “Clubismo não combina com Cartola. É difícil, mas para quem leva o fantasy game a sério precisa deixar um pouco a paixão de lado”, comenta o técnico ambiental Marcello Lobo, participante do Cartola há dez anos e atualmente um dos milhares de usuários que entraram no pacote pago para terem mais recursos para jogar. Flamenguista, não tem pudor em admitir que escalou – e torceu – por botafoguenses e vascaínos na décima rodada do Brasileirão. “A maior parte de meu time era composta por jogadores de Vasco e Botafogo, pois jogariam em casa contra Atlético-GO e Avaí. Acordei cedo pra ver o jogo do Vasco e, na segunda à noite, lá estava eu diante da TV ‘torcendo’ pelo Botafogo.”

Se o clubismo fica de lado, é a vez de a racionalidade tomar a dianteira. Cada jogador de Cartola tem seu método para montar o time, envolvendo até algumas manias ou superstições pessoais. Mas há uma linha básica sobre como escalar uma equipe eficiente (veja box).

Um dos benefícios de se jogar um fantasy é se tornar uma pessoa muito mais bem informada sobre tudo o que gira em torno do campeonato. Afinal, aquele jogador que acabou de sair da base de um time que você nem pensa em acompanhar pode ser a salvação do seu Cartola. Uma boa notícia para o futebol brasileiro em um momento em que seu público migra cada vez mais para as ligas europeias.

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O empresário Felipe Carvajal é conselheiro do São Bento (SP) e, no futebol brasileiro, só acompanhava seu time do coração e outros do interior paulista por interesse clubístico direto. De resto, preferia o que vinha da Europa. “O Cartola me ajudou a conhecer 10.000% melhor os jogadores do Brasileirão”, exagera. Hoje, seu processo de montagem do time leva mais de três horas e envolve leitura de notícias sobre os treinos dos clubes, ver cotação nos sites de apostas, avaliar as possíveis escalações de cada partida, colocar em uma planilha os possíveis escalados, analisar as estatísticas dos nomes que entraram nessa planilha e ir eliminando um a um até chegar à formação definitiva.

O fantasy brasileiro ajuda até a consolidar torcedores jovens, justamente o perfil demográfico que tem mostrado mais interesse no futebol internacional e desdém pelo nacional. “Comecei a jogar o Cartola ano passado, quando ganhei meu primeiro celular. Hoje fico vendo todos os jogos possíveis do Campeonato Brasileiro com meu pai, e ele que me pergunta quem são os jogadores de cada time”, comenta o estudante Pedro Horvath Montenurro, 11 anos. O garoto diz não acompanhar o futebol europeu e trata com seriedade sua participação no fantasy, a ponto de escalar o atacante Pratto contra seu Palmeiras (“o time estava mal e o jogo era na casa do São Paulo”) e de liderar a liga formada pela turma que joga futebol com seu pai. E, como palmeirense, ele também contestou a pontuação negativa de Guerra contra o Atlético-GO: “Eles só contam passes errados, mas não contam passes certos. E tem muito jogador que vai bem porque passa bastante a bola”.

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