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Revelação do Atlético na década de 80, o ex-atacante Joel hoje trabalha com embalagens | Henry Milléo/Gazeta do Povo
Revelação do Atlético na década de 80, o ex-atacante Joel hoje trabalha com embalagens| Foto: Henry Milléo/Gazeta do Povo
  • O atacante Joel, em treino do Atlético nos anos 80

O futebol paranaense perdeu este ano dois ídolos que terminaram na penúria. Vítimas de doenças graves, o atacante Washington, ex-Atlético, e o meia-cancha Marinho, ex-Pinheiros e Colorado, precisaram de ajuda para sobreviver nos últimos dias.

Em comum, dois atletas que fizeram carreira ao longo dos anos 80. Pertenceram à geração derradeira que não aproveitou o período dos salários graúdos, dos contratos de patrocínio, das inúmeras oportunidades de faturar no exterior. São ex-boleiros ainda na batalha mais de 20 anos após pendurar as chuteiras.

A transformação do cenário foi deflagrada ainda durante a década em que a dupla surgiu, com a abertura do mercado italiano para estrangeiros em 1980. Após a eliminação na fase inicial do Mundial de 1966, a Itália decidiu se trancar para os forasteiros.

Mais tarde, a Lei Bosman – inspiração à Lei Pelé e ao fim do passe, figura jurídica que fazia do atleta um patrimônio dos clubes – revolucionou o futebol.

Estabelecida em 1995, autorizou os jogadores a assinar com outro clube a partir de seis meses para o término do contrato. E permitiu aos atletas da União Europeia circular por times do continente sem serem considerados estrangeiros.

"Nossa época foi difícil. A molecada de hoje já começa com carrão, eu tinha um Chevette 79", compara Joel, 52 anos, ex-atacante do Atlético. Ainda moleque, o catarinense despontou como "carrasco" do Coritiba com os dois gols do título estadual rubro-negro em 1983.

Foram seis anos na Baixada e 13 como profissional da bola. Além do Furacão, o artilheiro passou por Figueirense, Marcílio Dias, Joinville, Sorriso-MT e Atlético de Ibirama-SC, até parar no Rio Branco de Paranaguá, em 1993.

"Mesmo jogando por bons clubes, os salários eram muito menores. E tinha o passe, que nos prendia aos clubes. Sigo na batalha, buscando a carreira de treinador. Eu me sinto preparado, mas me falta uma chance", diz o funcionário de uma empresa de embalagens em Pinhais.

Estrela do Coritiba no final dos anos 80, e do Paraná no início dos 90, o ex-meia Serginho reforça o abismo nos vencimentos. "Na minha melhor fase, ganhava em torno de R$ 25 mil, pensando na moeda atual. Um salário baixo para os padrões atuais da Primeira Divisão do Brasileiro", analisa o ex-jogador.

Serginho Cabeção, como ficou conhecido, aponta as razões: "O futebol se tornou um mega-entretenimento. Entrou o dinheiro das televisões, que é pesado, proporciona grande parte da renda, além de patrocínios. Mudou radicalmente".

Além do Alviverde e do Tricolor, o ex-meia passou ainda pelo Furacão e, fora do estado, jogou por Grêmio e Fluminense. Hoje é comentarista da rádio Clube FM, funcionário da Secretaria de Esportes de Colombo e sócio de uma pizzaria com outro ex-atleta, Marquinhos Benatto.

"Só os astros, nível de seleção brasileira, conseguiam acumular dinheiro para viver de renda ao final da carreira. E ainda assim, muitos passam dificuldades. Conheço muito mais jogadores daquela época em situação difícil do que o contrário", declara Serginho, 49 anos.

Outra diferença crucial ressaltada pelos representantes dos anos 80 era o mercado restrito para transferências internacionais. Com o passar do tempo, o futebol se expandiu e, hoje, países sem tradição como Estados Unidos, China e Índia disputam brasileiros.

O ex-meia Tostão, 57 anos, ídolo do Coritiba no final da década de 80, conta uma história comum a muitos ex-companheiros: o sonho frustrado de uma negociação para a Europa.

"Tive duas possibilidades, uma para a Espanha, outra para o Japão. Era a chance de ganhar mais dinheiro. Infelizmente, não deu certo".

Desde que parou, em 1996, no Foz do Iguaçu, Tostão segue ligado ao futebol. Como boa parte dos colegas de outrora, é dono de uma escolinha que administra há 14 anos, durante oito horas por dia, no bairro do Xaxim. Nunca teve interesse em ser treinador ou empresário.

"Ensinar os garotos é sempre o que eu quis fazer depois que deixei a vida profissional. Gosto do contato com os jovens, de passar a minha experiência. Nunca foi por dinheiro. E é o que eu acredito que vou continuar fazendo até morrer", afirma o ex-craque coxa-branca.

Por fim, o trio concorda que, apesar do avanço nos rendimentos dos atletas, é fundamental uma regulamentação mais protetora para a categoria em geral.

"Ainda vemos muitos problemas. É preciso pensar em uma aposentadoria para os ex-jogadores, apoio maior do Sindicato dos Atletas, da parte da CBF. Algo assim precisa ser feito urgentemente", sugere Serginho.

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