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Claudinei Oliveira, técnico do Paraná | Albari Rosa / Gazeta do Povo
Claudinei Oliveira, técnico do Paraná| Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo

Você treinou o Santos no Brasileiro de 2013 e no início deste ano comandou o Goiás no estadual. Após campanha invicta até a final, você foi demitido após a derrota para o Atlético-GO na última partida. Como você avalia esta situação? Infelizmente se a bola bate na trave nós éramos campeões invictos e tanto eu como o presidente do Goiás entraríamos para a história do clube com este feito. Mas aí a bola entra e de repente está tudo errado. No meu início no Goiás tive proposta de outro clube de Série A que pagaria a multa e me daria um aumento de 20% no salário. Preferi ficar e acreditar no projeto. Aí vem a vida e dá uma paulada dessas em você. Quando se tem uma sequência no futebol, as coisas acontecem, é só ver o Tite, no Corinthians, ou o Sérgio Guedes, no Ceará. Mas no futebol as pessoas julgam muito e cobram muito. Hoje cresci com isso e talvez em uma situação semelhante à que passei por lá eu aja de maneira diferente.

Logo que você deixou o Goiás surgiu o interesse do Paraná. O que te levou a aceitar esse desafio?

Houve um contato do Roque Júnior [então dirigente de futebol] com meus representantes e, a princípio, fui pego de surpresa e não estava disposto, eu queria descansar um pouco. Mas pesou a conversa com o Roque, o projeto apresentado, de tornar o clube grande novamente. E pela história dele no futebol acabei convencido de vir para cá e não me arrependo. Cada dia temos uma notícia ruim aqui, mas uso como aprendizado: no futuro, se acontecer de novo, saberei como lidar; se não acontecer, saberei agradecer. Após você chegar, o Roque Júnior acabou deixando o clube e os problemas financeiros se agravaram até chegarem ao ponto em que está hoje. Você esperava tantos contratempos?

A situação financeira é desagradável, ruim para todo mundo. Mas eu sou assim, vou trabalhar até onde der, mas todos têm seu limite. A partir do momento em que eu achar que não acrescento mais nada, eu saio. Eu estou preocupado em, quando sair, deixar um Paraná melhor do que encontrei. O Roque saiu por uma questão pessoal, em que se sentiu atropelado na função dele. Ele me comunicou, conversamos bastante e se um dia voltarmos a trabalhar juntos será um prazer. Como ele me trouxe, eu deixei a diretoria à vontade para decidir pela minha permanência ou não, na época. Após a saída do Roque Júnior, você acabou acumulando funções no clube: indicando contratações, cuidando da infraestrutura, quase como um manager faz na Europa. Você vê essa possibilidade para os treinadores no Brasil?

Pode acontecer no dia em que os clubes forem profissionais. Na Europa, os clubes têm dono e dão autonomia para o trabalho. Aqui, pelo fato de os clubes serem dirigidos por pessoas que são também torcedores, as coisas são mais passionais. Se hoje o treinador, só pela escalação do time, já é cobrado, imagine se você contrata um atleta e não dá certo, você é mandado embora na hora. Se um executivo de futebol não tem essa autonomia, e eu acredito que nenhum deles tenha, nós estamos muito longe da Europa nesse sentido ainda. Apesar da campanha ruim na Série B, os torcedores demonstram respeito e carinho por você. Há inclusive campanhas para sua permanência por um longo tempo no clube. Isso é algo novo na sua carreira?

É algo novo e é muito agradável e gratificante, a gente em tão pouco tempo ter conquistado a confiança do torcedor. Tem torcedor que quando perde tá tudo errado e quando ganha tudo certo. Aqui está havendo entendimento por parte da torcida e só tenho a agradecer essa confiança. Mas para a gente fazer um projeto a longo prazo tinha que mudar muita coisa, não só aqui no Paraná, mas em qualquer clube do Brasil. É fácil fazer um contrato de dois anos e, após três derrotas seguidas pagar a multa e mandar embora. Espero dar esse retorno aos torcedores com muito trabalho e resultados e que esse bom ambiente continue por muito tempo. Mas o amanhã a Deus pertence e a gente não sabe o que vai acontecer.

Qual a importância de ter atletas experientes e identificados com o clube, como Marcos e Lúcio Flávio, neste momento de crise?

A importância maior é por eles terem caráter acima da média, com comprometimento acima da média. Além de líderes, eles têm um caráter e hombridade acima da média. São coisas que te motivam e te deixam felizes por ter vindo para o clube. Agora, tudo tem um limite, como eu falei. Chega uma hora em que os problemas se acumulam e a gente desanima. No Paraná, com elenco inchado e cheio de problemas, você consegue manter o grupo próximo e unido. Você se considera um motivador?

Não me considero um cara motivador, mas sim agregador. A época do treinador ser só "vamos!, vamos!" no futebol acabou. Sou um cara que procura agregar comissão técnica, tratar titulares e reservas da mesma maneira. Não me coloco num pedestal e faço eles perceberem que estou ao lado deles, que estamos em uma engrenagem. Acho que assim eles se doam mais e aceitam melhor as suas decisões. Na minha carreira tem sido assim.

Vivenciando essa crise do Paraná, como você analisa as reivindicações do Bom Senso FC e a atual conjuntura do futebol brasileiro?

Todas as reivindicações do Bom Senso são plausíveis, não há nada de absurdo. A gente imita muita à Europa e diz que lá as coisas são melhores que aqui, mas a gente não adequa o calendário nosso ao deles. Não entendo o porquê. Deveríamos adequar o calendário, é opinião minha. Que a gente tivesse a humildade de reconhecer isso. Também acho que a CBF deveria cuidar apenas da Seleção e os clubes do Campeonato Brasileiro. Os clubes tinham que fazer uma liga, como é feito na Inglaterra e em outros países. As emissoras vêm e querem tudo igual à Europa. Então que paguem igual à Europa, para transmitir os jogos. Faz o calendário igual à Europa. Ligas igual à Europa. Hoje os clubes têm uma receita que é divida entre a CBF e os clubes. A partir do momento em que sai a CBF, sobra mais para os clubes, que ficam maiores nas negociações. Mas infelizmente, também os próprios clubes são individualistas e querem apenas o máximo para si.

Você escala o time do Paraná com volantes modernos, que têm qualidade para marcar e atacar. Além disso, o time costuma ter muita posse de bola. É assim que você gosta de trabalhar?

Quanto mais jogadores de qualidade você tiver jogando do meio para trás, mais você terá condições de chegar ao gol adversário. A gente busca gente que saiba jogar, independentemente da posição. Hoje o futebol caminha para isso. Em um cenário ideal, qual seria o esquema tático preferido do Claudinei?

Se eu pudesse montar o elenco com todas as peças que quisesse, atuaria no 4-4-2, com dois atacantes abertos, que tentam o drible, e dois meias chegando por dentro. Aí você precisa de um meia clássico, como o Lúcio Flávio, e outro que chegue na área e goste de marcar gols, como o Ricardo Goulart, do Cruzeiro, e o próprio Alex, do Coritiba. Esse pra mim é o esquema ideal, mas não tendo isso, temos que nos adaptar. Você é um treinador que gosta de revelar jogadores. Como você se sente ao ver que um de seus pupilos se consolidou no futebol profissional?

São pequenas vitórias que você tem na carreira e tenho muita felicidade nisso. A gente não revela ninguém, o talento é do jogador. A gente apenas identifica isso. Tenho receio com pessoas que dizem que revelaram esse, descobriram aquele. O segredo é identificar. E isso me dá muito prazer.

Atualmente, você tem algum treinador que serve de referência para o seu trabalho?

Não gosto de falar em referências, mas respeito o Guardiola. Só que é difícil eu falar isso porque nunca assisti um treino dele, para saber se o dia a dia influencia no campo. E a gente está falando de um treinador que tem os melhores jogadores à disposição, um cenário ideal. Ele vai ser minha referência o dia em que pegar um time mais ou menos e fazer um grande trabalho. Hoje a referência do Brasil é o Marcelo Oliveira, atual campeão, ganhando tudo. Se a gente for usar referências hoje tem que ser ele. Internacionalmente, as referências são o Guardiola, Ancelotti, Mourinho, gostaria de um dia estar próximo deles no dia a dia para conhecer melhor.

Quais as suas ambições como treinador de futebol? Aonde você se vê chegando?

Meu sonho é sempre vencer, ganhar sempre e eu pretendo ganhar o máximo que puder. Aonde esses bons trabalhos vão me levar a gente não pode dimensionar. Tenho sim vontade de trabalhar fora do Brasil, independentemente da onde for, é um negócio fantástico conviver com outras pessoas, outra cultura. Isso tenho sim, de trabalhar um dia fora do Brasil. Não sei quando, não sei se vou conseguir, mas eu hoje tô muito feliz com o que conquistei até agora. Se você me falasse em 2003, quando parei de jogar, que em 10 anos eu teria treinado o Santos, dirigir o Montillo, Edu Dracena, Durval, se fosse uma cigana eu não ia nem pagar, eu ia dizer que era mentira. Isso aconteceu porque trabalho no dia a dia. Não faço projeções, porque quando você projeta muito, você coloca a sua felicidade no futuro e não alcança muito. Hoje minha alegria é chegar aqui, encontrar a comissão técnica, os atletas , conversar, chegar em casa e ver meus familiares. Minha alegria está nisso.

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