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Equipe da Toti Diversidade, plataforma brasileira de ensino e inclusão de pessoas refugiadas e migrantes no mercado de trabalho de tecnologia.

Toti Diversidade

Com formação tecnológica para refugiados, startup mira no impacto social e quer criar os novos programadores do mercado

Maria Clara Dias, especial para o GazzConecta
18/05/2023 13:57
Quando fundou a sua startup, o estudante universitário Caio Rodrigues buscava alternativas capazes de solucionar um dos problemas mais agudos da sociedade: a desigualdade social encarada por refugiados no Brasil. Junto de outros seis colegas de turma, eles criaram, em 2016, a INCARE, um projeto acadêmico focado na empregabilidade e na oferta de condições sociais dignas para essas pessoas.
A atuação da INCARE estava pautada na crença de que o dia a dia de imigrantes no Brasil ainda esbarrava em inúmeros percalços legais e sociais. Juntos, problemas como a adaptação ao idioma local, o acesso à moradia de qualidade e o retorno ao mercado de trabalho derrubavam a qualidade de vida de refugiados que buscavam por aqui novas oportunidades. O tema também estava em alta em 2016, ano em que o Brasil registrou aumento no número de imigrantes refugiados, especialmente da Síria, em razão do êxodo causado pela guerra no país.
Ainda sob o formato de INCARE, o projeto universitário de Caio e seus colegas fazia parte do chamado Enactus, um projeto global que conecta acadêmicos e organizações para a construção de projetos de impacto social pelo mundo.
O trabalho da INCARE começou com uma série de entrevistas com imigrantes congoleses, que compõem a terceira maior nacionalidade em número de refugiados no Brasil, de acordo com a Agência da ONU para Refugiados. “Buscávamos comunidades de pessoas refugiadas no Facebook e eventos que reuniam aquelas pessoas. Queríamos estar próximos de algum modo”, conta Rodrigues, fundador e atual diretor de negócios da Toti.
Depois de meses de conversas, os estudantes identificaram três dores principais para os refugiados do país: a ausência de documentação, o acesso à moradia e a empregabilidade. “No início, aquilo não era uma empresa, apenas um projeto universitário com a ideia de mudar o mundo", diz, ao lembrar da época em que o projeto não havia sido pensado para ser uma startup. “Até ali, não sabíamos que queríamos empreender. Mas sabíamos que queríamos criar algo que pudesse ir além das provas e das paredes da sala de aula”.
Diante desse cenário, a INCARE passou então a atuar na frente de empregabilidade, oferecendo cursos profissionalizantes presenciais para refugiados no Rio de Janeiro. As primeiras turmas tiveram acesso a aulas de gastronomia, primeiros socorros e empreendedorismo, com dicas de vendas e gestão para comerciantes.

O início da Toti

Um mergulho mais profundo na conjuntura do mercado de trabalho naquele ano fez Rodrigues perceber as oportunidades em focar na área de tecnologia. “Lembro de pensar: 'mas não sei programar uma linha de código, como ensinar tecnologia a outras pessoas?'”, conta. O curto tempo de formação, o número considerável de oportunidades de emprego na área e a alta média salarial, porém, convenceram ele a apostar no nicho.
A primeira turma de formação profissionalizante em tecnologia, com foco em programação, desenvolvimento de software e criação de páginas web foi em 2018. Naquele ano, a INCARE deixou seu caráter acadêmico e passou a ser uma empresa de fato. Nascia ali a Toti Diversidade. “Foi um MVP ao extremo”, brinca. “Em acelerações, sempre nos questionavam sobre como íamos monetizar o trabalho. Por isso, começamos a encarar a Toti como um negócio, com uma proposta de valor direcionada a empresas”.
Em 2019, a Toti formou oito pessoas, e todas foram contratadas pelo mercado logo depois. No ano seguinte, o negócio deu um salto graças a um novo modelo de ensino digital implementado em plena pandemia. “Começamos a alcançar pessoas de muitas regiões e isso nos potencializou muito”, diz. Além do formato online, uma parceria com a agência da Organização das Nações Unidas para Migrações (OIM) também teve parte neste crescimento.
A grande reviravolta, contudo, aconteceu em 2022, a partir da consolidação de um modelo de atuação B2B centrado em parcerias com empresas e organizações interessadas em formar mão de obra tecnológica e, posteriormente, também contratá-la. Além disso, a startup também oferece às companhias clientes o acesso a um banco de talentos com refugiados já formados em turmas anteriores.
Atualmente, a Toti conta com uma metodologia própria de ensino e 49 professores que se revezam entre si em diferentes disciplinas de cursos de programação e desenvolvimento front-end. Desde a fundação, a startup já formou 660 pessoas refugiadas de 35 nacionalidades, com uma taxa de empregabilidade “pós-curso” de 80%. Desse total, 360 foram apenas em 2022.
Com sete turmas paralelas neste primeiro semestre de 2023, a Toti quer ampliar cada vez mais o acesso aos cursos profissionalizantes com a ajuda de tecnologia e de parceiros institucionais estratégicos. Um exemplo de parceria recente é a com o Instituto Nu, do Nubank, que irá formar 750 pessoas ao longo de 18 meses junto à Toti.
O desafio da empresa daqui em diante, segundo Rodrigues, é o de encontrar novos parceiros dispostos a financiar projetos de maior escala e alcance. “Nosso principal objetivo é fortalecer projetos, em educação ou formação, para que essas possam acessar o mercado de trabalho”, diz. Apesar do desafio em ampliar o impacto de seus cursos profissionalizantes, Rodrigues está confiante de que a Toti crescerá a partir da inclinação do mercado ao ESG, termo que descreve a adoção de critérios ambientais, sociais e de governança. “Quanto mais empresas tiverem clareza sobre seus investimentos nessa frente, principalmente se o social fizer sentido para elas, mais iremos avançar''. diz.
Para auxiliar empresas parceiras e financiadoras a compreenderem melhor seu impacto a partir do apoio à Toti, a startup oferece relatórios de impacto ao final de cada curso, para que empresas tenham visibilidade do uso dos recursos direcionados à instituição.

Rumo à Agenda 2030

A Toti Diversidade, como empresa de impacto, está diretamente ligada aos 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU, uma espécie de cartela que determina as grandes metas almejadas para a próxima década, do ponto de vista social e ambiental.
O principal deles, para a startup, é o ODS número 1, de erradicação da pobreza a partir da implementação de medidas e sistemas de proteção social para os mais pobres e vulneráveis. “Nosso público, muitas vezes, se encontra em situação de vulnerabilidade. Então essa meta é vital para nós”, diz. Além disso, a Toti também se relaciona a outros três objetivos: Trabalho decente e crescimento econômico (ODS 8), redução das desigualdades (ODS 10) e educação de qualidade (ODS 4).
Segundo o fundador, do lado do desenvolvimento econômico, o destaque está na média de aumento de renda na faixa dos 200% para os formados pela Toti. “Temos alunos com aumento de renda de 1.000%, sem mencionar que 60% dos alunos costumavam estar desempregados antes da Toti. É um impacto gigante”, revela. “Estar alinhado às ODS é algo muito significativo para a gente. Usamos isso em todas as nossas apresentações para clientes e parceiros. Esse é nosso propósito”, conclui.

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