As irmãs Alice e Beatriz contaram com aulas particulares durante a pandemia para poder absorver o conteúdo da escola.
As irmãs Alice e Beatriz contaram com aulas particulares durante a pandemia para poder absorver o conteúdo da escola.| Foto: Arquivo pessoal

Até março de 2020, quando instituições de ensino de todo Brasil suspenderam as aulas em função da pandemia de Covid-19, cerca de 48 milhões de estudantes da Educação Infantil até o Ensino Médio e profissionalizante deixaram de lado a rotina de ir para o colégio diariamente. Em grande parte das casas, esse protocolo foi substituído por novas ferramentas e formas de receber o conteúdo. No entanto, apesar das novidades tecnológicas, a psicopedagoga Isabel Cristina Hierro Parolin destaca que a pandemia pode ter mudado a metodologia usada na educação. Porém, a forma de aprender e de ensinar permanece a mesma de antes.

“As pessoas tiveram que se adaptar às aulas on-line, mas não levaram em consideração a forma como uma pessoa aprende. Ela aprende se aproximando do objeto a ser aprendido, precisa se apropriar daquilo. É ela quem faz o movimento. A partir daí ela tem que dar sentido próprio. Se não fizer isso, não aprende”, explica a psicopedagoga, que é consultora de instituições públicas e privadas na área da aprendizagem humana e tem 25 livros publicados sobre o assunto.

A advogada Delamare Bonfim, mãe de Alice, 9 anos, e Beatriz, 7, acredita que suas filhas só conseguiram absorver o conteúdo repassado pela escola graças ao “suporte extra” providenciado pela família. Ou seja, além do material remoto, tinham assistência dos familiares e de uma professora particular, que dava aulas presenciais para as duas, durante 2h30, todos os dias, no horário do contraturno. “Foi um grande investimento, mas valeu à pena. Caso contrário, não teriam aprendido”, analisa.

Para Delamare, esse período acabou mostrando que é possível estudar e trabalhar de dentro de casa e que as crianças são bastante flexíveis e adaptáveis, além de tirarem proveito para aprender em todas as situações.

TERRITÓRIO

Isabel Parolin concorda que várias coisas devem permanecer na área da educação no pós-pandemia, mas destaca que a experiência de ensino e de aprendizagem foi muito diferente nas diversas localidades brasileiras, em função da diversidade socioeconômica. “Existiu uma parcela muito grande de alunos que não teve acesso à escola. Outro grupo teve acesso apenas a uma escola informativa, que entregava a aula, a informação pela televisão, como se fosse uma notícia, ou por outros meios, como o rádio ou o impresso. Isso é uma escola que só manda um grupo de informações. Outras até tinham interação real com os professores, mas não a ponto de propiciar o dar sentido próprio ao objeto. Quando isso não acontece, não se muda comportamento e não há aprendizagem”, observa.

Pesquisas realizadas durante a quarentena comprovam isso. Enquanto as escolas da rede privada puderam oferecer mais recursos humanos e tecnológicos tanto aos professores quanto aos estudantes, naquelas que compõem a rede pública o desafio foi maior. Um estudo realizado pela Undime/Consed mostrou que, até o início de maio de 2020, 85% das redes estaduais e 60% das secretarias municipais que responderam à pesquisa ofereceram atividades remotas aos estudantes.

A psicopedagoga destaca que o período de isolamento social mostrou que não se aprende em qualquer lugar ou com qualquer pessoa. “Tanto que as famílias não deram conta disso. O fato de não ter o território da escola impediu que muitas pessoas desenvolvessem o papel de aluno. Para muitos, estar em casa não os permitia ‘ser alunos’. Ligavam a aula, mas não prestavam a atenção, não ligavam a câmera, não assumiam o papel de aluno”, pontua.

De acordo com a especialista, o componente humano é fundamental nas relações de ensino-aprendizagem. Ela ressalta que isso não descarta o uso das novas plataformas. Porém, componentes como a proximidade, a comunicação, a presença, a ligação afetiva e a observação são muito importantes. “O que não pode ser esquecido é que, para aprender, as pessoas precisam se sentir vinculadas, se sentir pertencentes a um grupo e sentir que compõem um par educativo com quem está ensinando”, ressalta a psicopedagoga.