Design

O design que vem da África

Luan Galani
27/08/2015 01:00
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Entrevista: Mugendi M’Rithaa — designer industrial.
Queniano de nascimento, o designer industrial Mugendi M’Rithaa, 51 anos, é uma das vozes mais representativas do mundo quando se trata de encarar o design como ferramenta de desenvolvimento para resolver as grandes questões de nosso tempo. Atualmente integra a direção executiva do Conselho Internacional das Sociedades de Design Industrial (Icsid), sediado no Canadá, e leciona na Universidade Tecnológica da Península do Cabo, na África do Sul. Já teve passagens por instituições da Índia, Botswana e Quênia, e hoje se dedica a tentar acabar com o que chama de “ditadura do design”.
“Temos de mudar o ‘Godesigner’ [Deus designer, do termo em inglês], aquele que se senta em um pedestal e dita as soluções de design sem reconhecer as necessidades do consumidor. Tamanha arrogância não tem lugar no mundo. Felizmente, os ventos da mudança já estão soprando”.
O que o inspirou a seguir carreira no design industrial?
Desde pequeno, eu era fascinado pela tecnologia e pela maneira como as coisas funcionavam. Depois que minha família se mudou para os Estados Unidos, enquanto meu pai fazia pós-graduação em farmácia, presenciei a ida do homem à lua, ao vivo pela tevê. Assistir a todo aquele maquinário funcionando foi inspirador.
Você é comprometido com a filosofia de que o design pode desencadear mudanças sociais profundas. Como isso acontece?
Os desafios enfrentados por países em desenvolvimento são tantos, que os designers também precisam ajudar. De tempos em tempos, por exemplo, ocorrem os Interdesigns, workshops de duas semanas que reúnem designers e comunidades locais, que trabalham juntos para desenvolver soluções para os problemas. O primeiro aconteceu em 1999, em Pretoria, na África do Sul. De lá, surgiram boas soluções para a distribuição de água, muito precária na região naquela época. Chegamos até a importar ideias da Austrália, que também sofria com os mesmos problemas.
Você disse que o design pode se tornar irrelevante para quem vive em países em desenvolvimento. Por quê? Como evitar que isso aconteça?
Isso ocorre quando o design foca somente nos produtos, ao invés de abraçar todo o serviço a ser prestado e o sistema em questão. Temos de mudar o “Godesigner” [Deus designer, do termo em inglês], aquele que se senta em um pedestal e dita as soluções de design sem reconhecer as necessidades do consumidor. Tamanha arrogância não tem lugar no mundo. Felizmente, os ventos da mudança já estão soprando e designers estão praticando o design participativo.
Quais as suas dicas para os profissionais que desejam praticar essa vertente?
Design participativo é essencialmente aquele que reconhece o tácito conhecimento que todas as pessoas têm do design. Então, co-design ou design participativo torna o consumidor final um co-criador do processo.
“A África não é pobre. Só não tem um monte de dinheiro.” A frase do professor Mafundikwa, famoso designer gráfico, faz referência à riqueza de práticas sustentáveis do continente africano. Que lições podemos aprender com a África?
Meu bom amigo Saki Mafundikwa tornou famosa essa frase para desafiar todos nós a ver a riqueza não tangível da África em oposição ao bem-estar proporcionado pelo dinheiro. Segundo ele, a África é extremamente rica em recursos naturais e matéria-prima. É uma maneira de encorajar o mundo a notar a riqueza que a África proporciona em capital social e humanidade.
A Cidade do Cabo tornou-se Capital Mundial do Design em 2014 para tentar se reinventar. Na sua opinião, a cidade atingiu o objetivo e conseguiu mudar o planejamento urbano segregacionista?
Um ano não é suficiente para desmantelar um sistema e práticas que levaram anos para se estabelecer. Contudo, o maior avanço para nós na Cidade do Cabo é o início do questionamento por um design socialmente transformador. Esse discurso robusto já começou a ressonar em outras cidades do mundo que têm contextos geopolíticos e socioeconômicos parecidos com os nossos. Esperamos ver esse novo movimento ganhar vida quando as pessoas perceberem que o design pode acabar com problemas complexos da configuração urbana.
Qual é o futuro do design, então, tendo em mente essa sua visão?
Acho que tudo caminha em direção à interdisciplinariedade e à inclusão dos diversos atores sociais no design. Destaco a popularização das impressoras 3D, que estão criando novos modelos de produção e distribuição. No futuro, esse formato irá impactar significativamente os modelos econômicos. São prospectos interessantes.

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