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“Se faço algo similar ao que já vi, é um esforço perdido”, diz grande nome do design italiano

Luan Galani
05/09/2022 23:59
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O designer italiano Marcantonio: ironia e relação entre homem e natureza são os principais ingredientes do seu trabalho | Marco Onofri/Divulgação

O designer e artista italiano Marcantonio, 46 anos, é um daqueles profissionais que nem precisa de seu sobrenome para ser identificado. A menção ao seu primeiro nome é imediatamente relacionada a criações originais, com temáticas fantásticas ou poéticas que surpreendem por abraçar a ironia sem perder a elegância. Suas peças integram catálogos de grandes marcas do mundo do design, como Qeeboo, Slide Design, Seletti e Natuzzi.
Natural de Ravena, mas residente em Cesena há décadas, o italiano veio ao Brasil esta semana para participar do evento que celebra sua escolha como designer do ano da BOOMSPDESIGN, durante a DW! 2022. O festival conta com cobertura especial de HAUS, em parceria com a Inove Design, que celebra 36 anos de marca e 26 anos de loja e está prestes a revelar sua nova identidade visual.
Em sua passagem pelo Lounge Bienal, dentro do Parque Ibirapuera, Marcantonio bateu um papo exclusivo com a HAUS.
Confira!
Por que a ironia é tão importante na maneira como você interpreta o mundo?
Gosto da ironia porque é algo muito sério. Se você quer jogar um jogo, tem que respeitar as regras do jogo, se não você não se diverte. A ironia é um ingrediente importante no projeto, pois bota um sorriso na boca das pessoas. Traz uma emoção. Design pode ser emocional. Isso é mais importante que um design normal, se posso dizer isso. Como essa mesa na nossa frente. A mesa é boa. Mas precisamos de algo a mais agora. Ser reconfortante. Algo relacionado à alma mesmo. Precisamos de poesia. Gosto de contar uma história. Como a tartaruga carregando os livros. Como os contos de fadas das nossas infâncias. Isso alivia nossa vida do estresse.
Turtle Carry, criação de Marcantonio para a Qeeboo, um suporte onde se pode apoiar o que o cliente quiser.
Turtle Carry, criação de Marcantonio para a Qeeboo, um suporte onde se pode apoiar o que o cliente quiser.
E como começou essas criações fantásticas? Como você soube que era essa a sua expressão?
Desde o começo tentei achar algo que fosse mais que as criações usuais que eu via ao meu redor. Para você entender: faço as coisas para mim. Para as minhas necessidades. Minha necessidade era criar algo muito especial. Porque eu preciso. Se faço algo similar ao que já vejo, é um esforço perdido. Outra cadeira igual à outra. Esperei. E quando tive certeza de ter uma ideia boa, coloquei em prática. Tinha menos animais, mas sempre tentei fazer um mix de uma forma diferente.
Falando em animais… a relação entre natureza e homem é um dos seus temas favoritos. Por quê?
Isso é muito forte em mim. Eu, você, não percebemos que nós somos a maior expressão da natureza. Nos esquecemos disso. Falamos da natureza como algo fora da gente. O tópico é importante também porque falar por meio dos animais é menos direto, é mais ingênuo. Se eu uso o corpo humano, por exemplo, em uma cadeira, as pessoas vão ver muitos símbolos, a forma do corpo, referências sexuais. Com o animal não. É direto. As pessoas relaxam e se lembram da infância. As pessoas se conectam imediatamente.
Peacock lamp, um trabalho numerado e exclusivo de Marcantonio.
Peacock lamp, um trabalho numerado e exclusivo de Marcantonio.
E qual a sua opinião sobre design democrático?
Comecei minha carreira querendo ser um artista. Tenho o mesmo objetivo quando faço um projeto ou quando faço uma escultura. É uma arte funcional, de uma forma democrática. Artistas e o mercado de arte, que é bem sofisticado… Você pode vender algo por 100 mil dólares. Mas quem compra isso? Um colecionador que começa a acreditar em você. Um trabalho que ele coloca em sua casa. Mas no design, temos 100 mil pessoas que compram seu trabalho e nem te conhecem. Compram porque acham bonito. Eu estou aqui por isso. Tenho certeza. Falo para muitas delas. A linguagem é simples, direta, especial.
Como é para você como um artista e designer criar em uma Europa em guerra, vivendo uma pandemia e ainda uma crise econômica?
É uma loucura. Todo dia penso nisso. Não me sinto confortável em pensar em beleza enquanto há guerra. E então penso, como falar de beleza quando as pessoas não têm comida? Se você realmente sabe o que é beleza, é educado para ser livre, a beleza te faz feliz, não atrapalha o outro. É como uma espiritualidade. Não posso entender a guerra. Sobre economia, eu me sinto culpado de alguma forma, mas não posso mudar as coisas. É o meu trabalho, é o que sou, é o que sei fazer. É minha vocação. Não faço coisas erradas, mas questiono isso sempre.
Love in Bloom, um vaso dourado gigante em forma de coração, criado por Marcantonio para a Seletti.
Love in Bloom, um vaso dourado gigante em forma de coração, criado por Marcantonio para a Seletti.
Como o Brasil te influenciou?
Comecei a sonhar com o design ao ver os Irmãos Campana. Porque eles fizeram um trabalho maravilhoso, alternativo no panorama do design. Era o que eu procurava, algo especial, fora da caixa, queria descobrir uma nova linguagem.
No que você está trabalhando agora que pode nos contar?
Fui comissionado como artista para expor na Art Basel Miami com uma escultura bem grande para a Armani. Estou aproveitando esse momento puramente artista. Usando bastante a minha mão. Com design, a gente usa o computador para ser bem preciso, então estou aproveitando a oportunidade. Não estou com pressa de fazer muita coisa. Faço com calma, entendendo cada passo. Se não, tem que correr. Curto, me traz visibilidade, mas prefiro fazer pensando com calma, estrategicamente.
Todos os designers são demandados para produzir muito todo ano. O que acha disso. Não é sustentável, certo?
Sim. Temos que nos perguntar o porquê das coisas. Podemos errar dessa forma. É algo bulímico. Enche de conteúdo, não damos conta, e depois vomitamos tudo. A pandemia nos ensinou isso. Vimos a natureza de uma forma ampla. Agora é o momento de fazer as escolhas certas. Hora de escolher bem e fazer apenas os movimentos certos. O mercado está saturado. Todo mundo é criativo. Não tenho a resposta.
Forest Chair, desenho de Marcantonio para a Scarlet Splendour.
Forest Chair, desenho de Marcantonio para a Scarlet Splendour.
Uma vez um designer italiano nos disse que o design italiano deveria ser menos fantástico. O que acha disso?
Eu não sou ele.
Você me destruiu agora (risos).
Não, não. Não sobre você. É que não sou alguém que dá opinião. Quero aproveitar ser quem sou, apenas. Não estou na posição de dizer aos outros o que é certo fazer. Estou bem em ser criticado. Meu desafio é mais difícil que para outros designers. Eu sempre preciso achar a fantasia certa e surpreender. Tento satisfazer eu mesmo. Tem que ter uma identidade, de usar nosso imaginário, como o Infinito para Natuzzi. Você olha e sabe que tem a ver com o infinito. Isso te conta uma história. É diferente. É um desafio. E eu gosto de aceitar esse desafio.

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