“Matar plantas faz parte do processo de aprendizagem”, diz jardineira Carol Costa

Luan Galani
16/01/2018 17:59
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Fim de semana em Curitiba terá cursos de jardinagem com Carol Costa. Foto: Lucia Festi/Divulgação

Carol Costa foi por mais de 20 anos jornalista. Passou pelas redações da Abril, Globo, Record e Folha de São Paulo. Até ser fisgada pelo gosto em cuidar das plantas em 2012. Hoje é jardineira pop que atrai milhões de pessoas na internet com suas dicas de paisagismo e jardinagem no portal Minhas Plantas. Sua fama aumentou depois de apresentar o programa da GNT “Mais cor, por favor” e de ser colunista no quadro “Jardinaria”, da Band News FM. Em passagem breve por Curitiba, à convite do Atelier das Plantas, do Jardim da Marilua e da Agapanthus Floricultura, conversou com a reportagem sobre os mitos que cercam as plantas e as dicas de ouro para virar um bom jardineiro, mesmo que seja por hobby.
Existe ‘dedo podre’? Ou todo mundo pode mexer com plantas?
Todo jardineiro que conheço matou muita planta até aprender. O processo é o mesmo de aprender a cozinhar, aprender a dirigir. Vai subir na calçada, vai queimar um arroz. Faz parte do processo. Dá uma queda na estima da pessoa, mas supera, porque tem o tesão do aprendizado. Com a jardinagem é a mesma coisa. O diferencial é que você lida com um ser vivo. Ao contrário de você deixar o carro morrer e tudo bem. Do arroz queimar e você fazer outro. Aqui é um ser vivo e a planta morre. Muita gente começa na jardinagem porque ganhou um vaso de alguém e se sente instigado a fazer dar certo. É muito frustrante que não dê. Mas não tem jeito de aprender se não acontecerem pequenas tragédias no processo. Elas são extremamente educativas.
E quem tenta por diversas vezes e não acerta?
Tem muita gente que me escreve falando isso: adoro essa planta, mas já tentei umas dez vezes lá em casa e ela sempre morre. Tem 35 mil espécies de orquídeas, sem falar nos híbridos, e você vai ficar insistindo nessa que tá dando errado? Tenta outra. Já é um sinal dizendo que não vai dar certo na sua casa. E é na sua casa, não na sua mão. Porque você deve morar em um lugar que não bate sol suficiente ou que não tem o que aquela planta precisa.
Qual o primeiro passo para cuidar bem de uma planta?
Ajuda muito saber o nome da planta. Que pessoinha verde que você tá plantando? Insistir com o vendedor para descobrir o nome popular ou pelo menos do gênero. Com o nome você descobre de onde ela é, que tipo de condição ela está acostumada. Alecrim e lavanda, por exemplo, que são de clima mediterrâneo. O que tem lá? Chão com muita areia, conchinha no solo, solo alcalino, bem diferente dos tropicais, que são ácidos. Lá a água cai e já seca, com bastante sol e vento. Aqui as pessoas cuidam da lavanda como uma planta muito chique e exótica. Põe dentro da sala, onde não bate sol, protegida do vento. Ela começa a murchar, porque o Brasil é muito úmido para ela. Aí a pessoa faz o que? Põe água. A lavanda odeia água. Dica: tente sempre simular o lugar de origem da planta na sua casa. Outra dica: sempre tocar a terra com o dedo antes de regar. Com o tempo é igual pendurar a roupa, em que você toca para ver se secou mesmo. O toque te avisa. Não dá para ignorar os outros sentidos. Por isso, quando dou aula, não deixo usar pazinha. Não quero saber se tem madame com a unha feita. É com a mão. Esse mexer te passa muita informação, de textura, calor, bichinhos. É uma interação mágica. Use os outros sentidos. A Ana Maria Primavesi, que é uma engenheira agrícola austríaca que mora no Brasil há muitos anos e que se especializou em solos tropicais, ela coloca terra na boca. Consegue sentir se tem mais cálcio, mais fósforo.
Foto: divulgação
Foto: divulgação
Vale a pena investir em espécies que não se dão bem aqui? Ou precisamos valorizar as plantas nativas?
A gente precisa que as pessoas conheçam a diferença entre rosa e camélia, para começo de conversa. Porque estamos na jardinagem, em comparação com universo da gastronomia, que todo mundo conhece, que é pré-Masterchef. As pessoas não sabem a diferença. Como compõe jardim funcional se não sabe nem que plantas precisam ou como se chamam? Nas 100 perguntas que me chegam por dia, metade é de identificação. Depois disso dá para conversar mais sobre como fazer um jardim mais funcional.
O que tem a falar para quem diz que dá trabalho ter jardim?
Se dá trabalho e gasta tempo demais, não é funcional. Na natureza, toda tecnologia das plantas foi para diminuir recursos e tempo. Então, é sempre o atalho. Não faz sentido ter uma planta tropical de altíssima umidade, por exemplo, em Goiás, só porque a pessoa borrifa 8 vezes por dia. Você não faz mais nada da vida além de ser babá de planta. Não tem lógica. É coisa de gente excêntrica. O ideal é que o jardim funcione como extensão da sua casa sem te dar muito trabalho. E a gente se permite umas poesias com o jardim que não tem lógica da janela para dentro. Você não vai comprar uma cortina de papel que na primeira vez que molha ela despedaça. Você não vai comprar um sofá caríssimo que não pode ser sentado. Tem gente que lida desse jeito com as plantas. Compra planta linda que só fica florida dois dias por ano, te toma tempo e recurso, mas mantém porque é planta rara. Não tem lógica. Tem que ser mais funcional. Jardim é feito para te dar prazer.
Mas não dá trabalho mesmo?
Muita gente invoca com a jardinagem por causa disso. O que acontece é que a pessoa que nunca mexeu com planta resolve fazer um jardim todo trabalhado. No Rio de Janeiro, por exemplo, as pessoas têm tara por buxinho. É uma planta de origem asiática, da parte fria. Aquela bolinha de jardim inglês, que sem topearia fica uma amoreira, uma bagunça. E aí? Você vai ter jardineiro todo mês para sempre cortar no formato? No Rio vai mofar, é muito úmido. Como vai simular isso? Usa Clúsia, que é daqui e vai fazer a mesma coisa. Não é burrice. É falta de informação. Por isso não existe isso de dedo podre.
E como explicar as avós que tem mão boa para plantas?
Dizem isso, né. Mas qual a idade da sua vó? Pelo menos sessentinha. Então, faz pelo menos 40 anos que está na lida, tentando. E ela não te contou das que ela já matou quando era mais amadora.
E como se programar com tantos cuidados diferentes para cada planta?
É sua planta que tem que se adequar a sua casa, não o contrário. Exemplo: vou a uma concessionaria, vejo o carro, compro porque é bonito, apesar do preço. Levo, não sabe quanto bebe, se tem garagem. Nem cachorro as pessoas adotam assim. Todo mundo pesquisa antes, se é raça que combina com o perfil da família, se tem propensão a doenças, se é uma raça que cresce muito. Ninguém faz isso com planta. Não tem padronização. Cada uma exige um jeito diferente.
Plantas renovam a energia da casa?
Não existe lar sem planta. Em decorado, às vezes é lindo. Mas se não tem planta, na minha opinião não é acolhedor. Não é casa ainda. Elas mudam o clima, dão aconchego, são um resgate da nossa época de bicho da caverna peludo. Tem pesquisas sérias, não holísticas, que reiteram isso: que se morar a no máximo 20 minutos de uma área verde terá menos risco de ter diversas doenças.
Na decoração muita gente trata a planta como perfumaria. Como dar mais seriedade?
Bom lembrar que são seres vivos. E não são descartáveis. Decoração de fim de ano de shopping, por exemplo. Compra-se muito Bico-de-papagaio. Acaba o Natal, jogam tudo fora. Bromélia também. Elas são perenes, tem ciclos de vida superlongos. É um arbusto, é só plantar, até em vaso. Vejo um monte de orquídea em caçamba. Em São Paulo, há um fenômeno interessante: sabe onde tem as coleções mais incríveis de orquídeas? Ao lado da guarita de metal dos vigias das ruas chiques. A dona de mansão compra planta. Acaba a floração, joga fora, e o vigia pega, humaniza e põe a planta no entorno da guarita. Por que outros tratam a orquídea como descartável.

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