Entre os eventos políticos que marcaram a modernidade europeia, aquela com menor destaque aqui no Brasil, sem dúvidas, sempre foi a Revolução Gloriosa. Uma revolução que não teve o charme heroico dos sonhos de Francis Bacon, Jean-Jacques Rousseau e Denis Diderot, nem o fedor necrófilo que os ideólogos ainda hoje veneram e aplaudem na Revolução Francesa e Bolchevique. Porém, definitivamente, a Revolução Gloriosa foi o evento histórico-político mais marcante na modernidade para aquilo que mais tarde chamaríamos nas ciências sociais de “bases éticas para a liberdade individual e política” ‒ ou “a revolução que reordenou a mentalidade europeia rumo à liberdade”. Em suma, entender a Revolução Gloriosa é entender os fundamentos da mentalidade de liberdade que o Ocidente gestou como aparato institucional eficiente contra tiranias e tiranetes, é entender o valor mais crucial que sustenta a própria sociedade democrática.
Para compreendê-la, entretanto, temos antes que dar um passo atrás em relação aos eventos que a antecederam e caracterizaram, a fim de considerar as centelhas políticas, filosóficas e, principalmente, religiosas que acenderam tal pira histórica e transformaram o Ocidente todo em menos de 300 anos.
Os antecedentes
Carlos I, rei da Inglaterra e Irlanda de 1625 a 1649, era religiosamente controverso ‒ algo muito ruim se você tivesse vivido nos séculos XVI e XVII na Inglaterra. Casou-se com uma católica fanática, a francesa Henriqueta Maria de França, e tinha uma simpatia pública pelos católicos apesar de se apresentar como protestante, nomeando até mesmo bispos e arcebispos anglicanos com toda a devida devoção pública e religiosa. Politicamente, por sua via, ele travou uma guerra contra o parlamento inglês, pois sinceramente acreditava nas prerrogativas tradicionais e divinas de um rei. Carlos I queria uma receita do tesouro maleável e irrestrita às suas políticas e sonhos militares, além de um Parlamento menos intervencionista em assuntos administrativos do reino. Seu avanço sobre a Magna Carta de 1215 gerou a famigerada, e também pouco estudada por aqui, Guerra Civil Inglesa de 1642 a 1649.
Após a derrota, o rei fugiu brevemente do trono, tentou estabelecer uma aliança com a Escócia ‒ terra de seu pai ‒, mas, sem sucesso, foi entregue ao Parlamento que, naquela altura, estava sedento de vingança. Em suma, Carlos I não retrocedia e recusava-se a se submeter a uma monarquia constitucional de denominação protestante. Algo inédito então ocorre naquelas bandas, pois, após o seu julgamento, além de ser destituído do trono, Carlos I foi condenado e morto, a Inglaterra então passa brevemente a experimentar uma República tão confusa e pouco estabelecida que muitos historiadores e demais estudiosos se referem a esse período apenas como “interregno”, interregno esse que dura oficialmente até 1660.
Carlos II ‒ filho de Carlos I ‒ já tinha sido proclamado rei em 1647 pelo Parlamento, era o filho mais velho de Carlos I, porém ele assume o trono somente em 29 de maio de 1660 sob um forte clamor popular. Carlos II, todavia, padecia da mesma “fraqueza” de seu pai, não tanto politicamente, pois tinha um sentido mais liberal de governo, todavia o monarca era tendente ao catolicismo, e casou-se nada mais nada menos do que com Catarina de Bragança, filha de Dom João IV, rei de Portugal, um dos reinos mais católicos da Europa naquele século.
O Parlamento, fortemente calvinista e puritano, sabia das ligações de seu rei com os católicos portugueses e franceses, para muitos o coroado era mais um papista disfarçado a sentar no trono. A medida de retaliação dos parlamentares foi passar o Código Clarendon, que estabelecia a Igreja Anglicana como a oficial e dava poderes quase políticos a determinados clérigos. Para alguns, isso era uma medida de freio político a intervenções católicas externas, principalmente da França; para outros era uma medida legalmente autoritária de protestantes que começavam a perseguir os católicos ingleses com cada vez mais argúcia e crueldade.
Carlos II tentou remediar a situação desfavorável com decretos e tratativas parlamentares de tolerância aos católicos, no entanto tais medidas fizeram que sua ação pública facilmente se tornasse cada dia mais turva e, por fim, intragável. O fideísmo protestante, aliado ao cenário bélico internacional no mundo religioso, principalmente com a França, mas não raro também com a Espanha, fazia que um rei com tendências católicas fosse extremamente malvisto ‒ nessa altura, a popularidade que o conduziu ao trono já havia se esvanecido.
Fato é que, desde 1670, Carlos II tentava criar um ambiente livre para os católicos dentro da Inglaterra, Irlanda e Escócia. Em 1672, fez sua famosa Real Declaração de Indulgência aos católicos e protestantes dissidentes, decreto esse que logo foi cassado pelo Parlamento e, logo após isso, surgiu o famoso “complô papista”: uma história criada por Tito Oates, que buscava incriminar católicos que participavam do círculo íntimo do monarca. O polemista publicou panfletos em que afirmava haver um complô para matar o rei e seu irmão Jaime. Tal criação de Tito inflamou ainda mais a opinião pública contra os católicos no ciclo interno do poder inglês. Tudo piorou muito quando descobriram que o sucessor do trono, o irmão de Carlos II, Jaime, era um confesso católico; após a fé católica de Jaime ser descoberta, parlamentares tentaram criar uma lei intitulada: Exclusion Bill, que tinha o intento de cancelar a sucessão do trono inglês, todavia os parlamentares mais conservadores cassaram rapidamente a medida ‒ apesar de a mesma ter reverberado por muito tempo após a sua queda.
Depois de tais acontecimentos, foram criados, quase que organicamente, dois partidos no parlamento, os tories e os whigs, os primeiros eram de linha tradicional e tendiam a defender a tradição monarquista e os direitos de reinado forte e autônomo, e os whigs eram avessos aos poderes constituídos do rei e às muitas das concessões que o Parlamento dava ao trono. Carlos II foi um dos que acreditaram no complô papista que supostamente o ameaçava e a seu irmão. Foi então que, de fato, começaram os atos concretos que mais tarde determinaram a Revolução Gloriosa, pois, em 1681, ele dissolveu o Parlamento e reinou soberano até a sua morte em 1685, mas antes, em 1683, muitos whigs sumiram, foram mortos ou exilados através de perseguições de apoiadores do rei, obviamente que tais atos foram relacionados a determinações do monarca.
A Revolução Gloriosa e seus porquês
Carlos II não teve filhos com Catarina de Bragança ‒ porém, ilegítimos, teve inúmeros ‒, e, assim, o trono foi herdado pelo católico Jaime II e Jaime VII ‒ Jaime II na Inglaterra e Irlanda e Jaime VII na Escócia — a fim de simplificar a descrição, iremos nos referir a ele, daqui em diante, apenas como Jaime. Após a morte do pai, Carlos I, Jaime foi para França ainda muito jovem, também passou temporadas na Espanha. Assim sendo, não é nada difícil imaginar a influência católica que ele deve ter recebido dos familiares da mãe e do próprio ambiente de formação nacional de sua juventude naqueles reinos católicos. No entanto, seu catolicismo demorou a ser assumido, o que aconteceu somente após casar-se com a sua primeira esposa, Ana Hyde. Em 1668 ou 1669, não se sabe ao certo, ele recebeu a hóstia consagrada, selando assim oficialmente a sua conversão ao catolicismo romano.
Todavia, tudo isso se manteve praticamente em segredo naquele momento e teve a clara desaprovação de seu irmão, Carlos II. Em 1673, Jaime ainda não era rei, cargo que assumiu somente em 1685, após a morte do irmão, e que exerceu apenas por três anos, porém, naquela época, ele já era um influente funcionário da corte, além de sucessor imediato de Carlos II. Desconfiados do catolicismo de Jaime e querendo reafirmar a posição política e social da Igreja Anglicana no Estado, os parlamentares elaboraram um “Ato de Prova”, onde todos os civis e administradores públicos deveriam jurar sua fé à Igreja Anglicana e recusar os dogmas católicos que contrastavam com a fé daquela igreja. Jaime se recusou a jurar.
Todavia, em 1683, dado o complô que supostamente queria mata-lo, sua imagem foi brevemente restaurada entre a população, pois, se ele era verdadeiramente católico, por que tais católicos conspiradores queriam matá-lo afinal? Entretanto, seu catolicismo era real, e, após seu segundo casamento, com a confessamente católica Maria de Módena, e o nascimento de seu filho, em 1688, Jaime Francisco Eduardo Stuart, estava mais do que claro à aristocracia anglicana e aos fiéis histéricos que o trono da Inglaterra, Escócia e Irlanda seria papista se nada fosse feito.
O Grande articulador da queda de Jaime seria o seu sobrinho e genro, Guilherme de Orange, antigo sucessor ao trono ‒ antes da chegada do Jaime Francisco ‒ e marido de Maria II, filha mais velha de Jaime. Era quase unânime no establishment anglicano e político que, agora que Jaime tinha um sucessor masculino ao seu trono, algo de efetivo era preciso ser feito a fim de parar a invasão católica.
A postura quase absolutista e os avanços constantes de decretos e perseguições de Jaime àqueles que discordavam de suas políticas ajudaram Guilherme a ser bem visto na Inglaterra, e não raro ele era pintado como um possível resgatador da alma protestante da nação. O seu panfleto, lançado no mesmo ano de nascimento do filho de Jaime, Declaração de Motivos, foi um sucesso de propaganda invejável até os dias atuais. Foi assim que ele convidou sete lordes ingleses e, com ajuda de 25 mil homens e a improvável “vira casaca” do comandante de Jaime, John Churchill ‒ isso mesmo, parente distante de Winston ‒, que gradativamente a posição de resposta de Jaime ao golpe de seu genro se tornou não somente inviável, como até mesmo ridícula. O sentimento popular anticatólico na Inglaterra era avassalador naquele momento, e o católico Jaime definitivamente também não se ajudava no campo político.
Em resumo, a posição política mais clara de Jaime era a sua favorável abertura religiosa aos católicos e protestantes dissidentes, isso incluía obviamente uma disputa política contra o establishment anglicano. Contra a imagem pública de Jaime constava um crescente avanço de decretos contrários à divisão tradicional do poder político afirmado na venerável Carta Magna de 1215, o que gestava uma sensação constante de que o rei verdadeiramente buscava restaurar um absolutismo no país.
Além disso, Jaime forçou tradicionais universidades protestantes a aceitarem católicos à revelia das vontades daquelas instituições livres, consagrou Exércitos Católicos dentro do território inglês e até concedeu permissão para uma escalada de aberturas de conventos, seminários e abadias católicas em Londres, tudo à revelia da opinião pública e parlamentar. Sua amizade com o primo francês, Luís XIV, só piorava muito a sua defesa, pois o monarca francês, em 1685, havia revogado o Édito de Nantes, que dava liberdade religiosa aos protestantes dentro da França, iniciando assim uma escalada de perseguição aos dissidentes dentro daquele país. Os parlamentares viam a proximidade de Jaime e Luís XIV como não só comprometedora, mas também ameaçadora.
Por outro lado, é fato que o Parlamento pouco perdeu em seu poder sob o reinado de Jaime para além da propaganda eficiente dos protestantes, e, apesar de Jaime ser carente de carisma e tato político, é fato que sua luta pela tolerância religiosa logo mais se verteria em pautas dentro do próprio Parlamento, inclusive dentro do próprio partido Whig. Basta lembrarmos que um dos parlamentares mais famosos na luta por tal tolerância social e religiosa na Inglaterra ‒ menos de 100 anos após tais eventos ‒ foi o parlamentar whig Edmund Burke, filho de mãe católica e pai anglicano.
A Revolução Gloriosa foi praticamente pacífica, excluindo-se duas breves batalhas que logo cessaram. Fato é que Jaime era inadequado para o cargo ante aquela pressão social toda, não tinha tato político e nem a maleabilidade religiosa de seu pai Carlos I. Após a derrota das tropas de Jaime na Batalha de Reading, sua esposa e filho fogem para a França, em 9 de novembro de 1688, e, em 23 de dezembro do mesmo ano, Jaime toma o mesmo rumo. Em 13 de fevereiro de 1689, o agora Guilherme III e Maria II são sagrados rei e rainha da Inglaterra, Irlanda e Escócia. Em 16 de dezembro daquele mesmo ano é oficializada a Declaração de Direitos, documento que sela o final da Revolução Gloriosa.
As consequências
A Revolução Gloriosa foi, ao mesmo tempo, uma medida política institucional, aristocrática e popular. Pela primeira vez, a Europa havia visto um movimento quase que uníssono com relação à uma reação política contra avanços absolutistas de um soberano. Instituições, clero, aristocratas e plebe tinham um entendimento comum: não podemos retroceder ante os avanços da Magna Carta.
Não que Jaime II não tivesse apoiadores internos, não que não houvesse resistência de tradicionalistas no Parlamento e até parlamentares favoráveis à volta do absolutismo, havia tudo isso, porém a grande percepção social, aquilo que talvez seja melhor expresso como “senso comum”, era a inconteste crença de que o rei deveria ser limitado e que o Parlamento deveria ser o contrapeso no poder. Essa é a impressão, por exemplo, de Daniel Hannan em seu maravilhoso livro 'Inventing Freedom: How the English-Speaking Peoples Made the Modern World' [Inventando a liberdade: como os povos de língua inglesa criaram o mundo moderno, em tradução livre, sem edição no Brasil].
Hannan argumenta que a relação da história do povo inglês e a liberdade é bem mais antiga que a Revolução Gloriosa, mas é justamente naquele instante que a mentalidade liberal daquele povo é colocada em prova. A tentação era a de retornar a um status quo mental relativamente seguro sob um absolutismo sacralizado, ou a opção madura de tomar para si o ônus da responsabilidade consciente ante os seus direitos e deveres sociais constituídos; escorar-se em um reinado de poder tradicional e estética pomposa, ou ficar com a liberdade individual e política, além das consequências de um amadurecimento civilizacional indispensável.
Para o autor, a escolha popular e parlamentar de depor Jaime e reafirmar o poder limitador da Carta Magna aos avanços absolutistas de um rei instituído foi um ato consciente de validação popular a uma ética liberal, o nascimento do liberalismo político. Aliás, foi a partir disso que a Europa encontrou na Inglaterra, Irlanda e Escócia um modelo instituído de governança social moderna, baseado em freios e medidas jurídicas para inviabilizar a tirania e os diversos tipos de despotismos. Mais tarde, o grande teórico político Charles-Louis de Secondat, mais conhecido como Barão de Montesquieu, escreveria o famoso O Espírito das Leis, onde elaboraria teoricamente a partição jurídica e política dos poderes do Estado.
A consciência liberal e o nascimento da modernidade
Em 'Edmund Burke: redescobrindo um gênio', de Russell Kirk, o filósofo político americano argumenta que o parlamentar whig Edmund Burke ‒ também conhecido como pai do conservadorismo moderno ‒ sequer via a Revolução Gloriosa como uma revolução, mas sim como uma medida para pausar uma revolução absolutista.
"Persistiu nos Estados Unidos a impressão popular errônea de que, de algum modo, Burke era 'a favor' da causa revolucionária norte-americana. Na verdade, Burke nunca favoreceu revolução alguma ‒ com exceção da Revolução Gloriosa de 1688, que ele disse não ter sido uma revolução feita, mas evitada, e, portanto, absolutamente, não fora uma revolução."
O grande erro de Jaime foi tentar, intolerantemente, criar uma via de tolerância ao catolicismo; a tolerância forçada não passa de uma intolerância com boa desculpa. Não cabe agora discutir se Jaime queria a liberdade religiosa para transformar a Inglaterra em um feudo do catolicismo romano ou se, por princípio, acreditava mesmo que a modernidade deveria dar um passo rumo à coexistência pacífica entre as matrizes cristãs ‒ repito, pauta essa que Burke defendeu até o fim de sua vida mesmo sendo um anglicano whig.
Fato é que, a partir da Magna Carta de 1215, a tolerância para violência contra a consciência individual se tornava cada vez menos aceita na Inglaterra; e, ainda que, na época, tal violência fosse praticada contra certas minorias, como contra os católicos irlandeses e protestantes de matrizes menores, a evolução gradual dessa percepção de liberdade individual gestada pelos sucessivos eventos de limitação de poder do rei e de grupos com disposições ditatoriais, elaboração de leis de ordem a ratificar valores intrínsecos como a liberdade de livre interação e consciência, tudo isso fez com que a mentalidade comum inglesa se voltasse a um progresso liberal.
O historiador Paul Hazard, em 'A crise da consciência europeia:1680-1715', resume o senso comum da época com a seguinte afirmação: “Empregar a força em matéria de consciência? Que horror! Que infâmia!”. E, antes, em 'Reflexões sobre a revolução na França', Burke também já havia dito de forma categórica que “a Revolução [Gloriosa] foi iniciada para preservar nossas antigas e indisputáveis leis e liberdades e a antiga constituição de governo, que é nossa única segurança em termos de lei e liberdades”.
Assim sendo, não foi à toa que tenha sido o iluminismo britânico que, posteriormente construiria na modernidade uma “sociologia de moral”, como dizia Gertrude Himmelfarb em 'Os caminhos para a modernidade: os iluminismos britânico, francês e americano'. “Moral”, pois foi essa tal consciência de liberdade dos ingleses que possibilitou à Europa uma percepção ética mais profunda do que seria uma autonomia do indivíduo e das instituições nacionais com relação ao modelo administrativo do governo.
Os ingleses inventaram a liberdade política tal como a conhecemos hoje. Aliás, foram eles que tornaram o conceito mesmo de liberdade o centro norteador da política e da filosofia política europeia nos séculos seguintes, tanto que a Revolução Francesa e Americana tiveram na Revolução Gloriosa o seu modelo central de ação ‒ ainda que as consequências, porquês e métodos tenham variado muito, principalmente com relação àquela praticada na França.
Não foi por sorte que a indústria moderna tenha surgido na Inglaterra, que o livre mercado tenha encontrado em Liverpool e Londres seu primeiro berço seguro para crescer. Quando um filósofo escocês, Adam Smith, destrinchou a filosofia econômica da riqueza em 'A riqueza das nações', ou quando em 'Teoria dos sentimentos morais' ele estabeleceu na livre interação entre os indivíduos ‒ a empatia ‒ o elo definidor na construção de uma sociedade ordeira e livre, teve que ser sim um escocês, pois somente alguém que estava mergulhado naquela cultura e consciência social poderia entender o funcionamento daqueles fenômenos através das experiências pessoais e da análise científica acurada.
Foi a união entre ética da liberdade que inflamou o rei João a assinar a Magna Carta com os demais signatários, e as instituições de Estado como instrumentos de limitação de poder que geraram na Inglaterra um terreno confortável para o crescimento da liberdade ‒ em todas as suas aplicações e sob todos seus aspectos ‒, como diz Naill Furguson em 'Civilização: Ocidente x Oriente': “É claro que as instituições são, em certo sentido, produto de cultura. Mas, uma vez que formalizam um conjunto de normas, costumam ser aquilo que mantém uma cultura no rumo certo, determinando até que ponto esta conduz ao bom comportamento, e não ao mau”.
Assim, a consciência liberal que tomou ingleses, irlandeses e escoceses é a mistura de uma ativa cultura política das instituições de Estado com a assimilação moral dos valores sociais que gradualmente foram tomados como indisputáveis pela população inglesa. E me parece ser mais fácil entender isso estando submergido naquele ethos; isto é, foi a Inglaterra, Irlanda e Escócia que estabelecerem os pressupostos do liberalismo pois foi lá que o liberalismo nasceu.
O grande trunfo daquele reino, inédito naquele instante, foi unir instituições de Estado e cultura popular sob um princípio comum de liberdade e leis de limitação do poder absoluto; os ingleses conseguiram fazer, a custo de pouco sangue ‒ se comparado às guerras e revoluções que antecederam e sucederam a Revolução Gloriosa ‒, uma remodelagem interna de suas consciências pessoais e, consequentemente, de suas culturas e instituições.
Por isso, quando Daniel Hannan afirmava que os ingleses inventaram a liberdade no sentido moderno, ele não estava exagerando, ele estava apenas conceituando um fato histórico. Não se trata de uma elevação cega e devocional daquele reino, definitivamente não era um reino utópico, não estou afirmando que as suas intenções e escolhas sempre foram santas e acertadas, estou dizendo antes que eles elaboraram uma visão de mundo adequado à prosperidade e à dignificação do homem, tudo isso aliado a uma ação comum que erigiu na modernidade uma capacidade ímpar de análise e prática política pautada numa nova ética, numa ética de liberdade. Quando hoje lutamos e exigimos respeito às nossas liberdades fundamentais, sejam elas quais forem, devemos isso sim aos que um dia conseguiram unir a ética liberal abstrata ao pragmatismo político da liberdade, devemos mais aos ingleses do que normalmente supomos.
Diferentemente do informado no texto, Catarina de Bragança era filha de Dom João IV, e não de Dom João VI.
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