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Jeanne Louise Calment viveu por 122 anos e 164 dias, a idade mais avançada verificada em qualquer pessoa do mundo, na história. Suas entrevistas revelavam o alto astral da centenária: “Eu só tive uma ruga, e estou sentada nela”, disse ela aos repórteres quando completou 110 anos. 

Calment morreu em 1997 em Arles, França, onde passou grande parte de sua vida impressionantemente longa. Ninguém mais, que tivesse registros precisos, viveu além de 120 anos.

A questão sobre se há um limite para o tempo de vida humano é antiquíssima. Um atuário chamado Benjamin Gompertz propôs em 1825 que as taxas de mortalidade aceleram exponencialmente à medida que envelhecemos. Sob o que é conhecido como a lei de Gompertz, a probabilidade de morrer duplica a cada oito anos. Essa parece ser a regra para pessoas com idades entre 30 e 80 anos. 

Mas os pesquisadores discordam sobre o que acontece com as taxas de mortalidade nas idades muito avançadas. Um novo estudo, publicado na revista Science, indica que o Ceifador de repente tira o pé do acelerador. 

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“O objetivo era resolver uma controvérsia sobre se a mortalidade humana tem a mesma forma que a mortalidade em muitas outras espécies”, disse o autor do estudo Kenneth Wachter, professor emérito de demografia e estatística da Universidade da Califórnia em Berkeley. Estudos mostram que as taxas de mortalidade se estabilizam em animais de laboratório, como moscas da fruta do Mediterrâneo e vermes nematoides. “Achamos que conseguimos resolver a questão”, disse ele. 

As taxas de mortalidade aceleram até os 80 anos, desaceleram e depois se estabilizam entre as idades de 105 a 110 anos, concluíram os autores do estudo. A lei de Gompertz, nessa visão, termina em uma linha reta. 

Para ser claro, estamos falando da aceleração das taxas de mortalidade, e não das próprias probabilidades. Essas ainda não são boas. Apenas duas em 100 mil mulheres vivem até 110; para os homens, as chances de se tornar um supercentenário são de duas em um milhão. Aos 105 anos, de acordo com o novo estudo, as chances de sobreviver até o seu 106º aniversário estão em torno de 50%. É mais um cara ou coroa de 50% de chances para 107, depois novamente para 108, 109 e 110. 

Liderada por Elisabetta Barbi, da Universidade Sapienza de Roma, e por especialistas do Instituto Nacional Italiano de Estatística, a nova pesquisa rastreou todos na Itália nascidos entre 1896 e 1910, que viveram até os 105 anos de idade ou mais. Os dados incluíram 3.836 pessoas, das quais 3.373 eram mulheres e 463 eram homens. O registro nacional italiano, que exige atualizações anuais dos cidadãos, fornece informações mais precisas do que os dados da Previdência Social dos EUA. “A Itália provavelmente tem os melhores dados disponíveis”, disse Wachter. 

Sem limites rígidos

O estatístico Holger Rootzen, da Chalmers University of Technology, na Suécia, considerou o estudo uma “análise muito cuidadosa e boa” que revela um platô de mortalidade entre os 105 e os 110 anos. 

Usando dados similares de longevidade do Japão e de países ocidentais coletados pelo Instituto Max Planck de Pesquisa Demográfica, Rootzen rejeitou a noção de um limite rígido para a vida humana em um artigo publicado em dezembro na revista Extremes. Ele previu que seria possível no próximo quarto de século que alguém atingisse a idade de 128 anos. 

Dois anos atrás, pesquisadores da Faculdade de Medicina Albert Einstein argumentaram na Nature, com base em dados de longevidade de 40 países, por um limite máximo em torno de 115. Na visão deles, o tempo de vida de Calment foi um golpe de sorte. 

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Referindo-se à pesquisa mais recente, Brandon Milholland, que trabalhou no estudo da Nature como doutorando, disse que era "altamente improvável" que as curvas de mortalidade se nivelassem tão repentina e completamente. 

"Há mais do que essas duas opções", disse Milholland. Em um comunicado, seu coautor, Jan Vijg, geneticista da Faculdade de Medicina Albert Einstein, chamou a escolha entre um platô definido ou a lei de Gompertz de uma "falsa dicotomia". 

"As variações de erro são grandes", disse Milholland, o que deixa espaço para curvas mais íngremes nos dados italianos. Ele concordou que a lei de Gompertz deve terminar, porque as taxas de mortalidade não podem dobrar além de 100%. Mas este estudo não o convenceu de que as taxas de mortalidade param de aumentar em torno de 50%.

Jogo de dardos

Rootzen contestou as conclusões do artigo da Nature estimando um limite no tempo de vida, dizendo que os autores tinham cometido um erro estatístico: sim, as chances de viver além de 115 são baixas, mas isso não significa que existe um limite, disse ele. Ele usou o exemplo de jogar dardos em um alvo. Você pode não acertar o centro do alvo em 10 arremessos. Mas atire milhares de dardos em um alvo, e talvez você acertará. 

“Eles simplesmente não entendem esse problema, se você fizer mais tentativas” – mais dardos no alvo, ou mais pessoas vivendo até idades muito avançadas – “então o recorde aumenta”, disse Rootzen. 

Os números dos muito velhos estão crescendo. Na Itália, por exemplo, quatro pessoas nascidas em 1896 viveram até 105 anos ou mais. Mais de 600 pessoas nascidas em 1910 viveram o mesmo tempo. Entre 1896 e 1910, a mortalidade infantil na Itália melhorou, disse Wachter. Nas décadas posteriores, o cuidado de pessoas de 80 e 90 anos melhorou também, aumentando o número de centenários. 

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“Quando entendemos as interações entre nossa herança genômica e todos esses outros fatores práticos bem estudados, como nutrição e comportamento, vamos entender por que as pessoas são capazes de fazer esse progresso até os anos 80 e 90 e estendê-lo”, ele disse. 

Até agora, os muito mais velhos entre nós surgiram de todas as esferas da vida. “As recomendações de estilo de vida – exercite-se, come isso ou aquilo – são bastante eficazes em idades mais jovens, mas não parecem desempenhar um papel em idades mais avançadas”, disse Rootzen. 

Calment disse que ela fumou dois cigarros por dia até os 119 anos, e só então deixou o hábito porque ela não conseguia enxergar bem o suficiente para acender o cigarro.

©2018 The Washington Post. Publicado com permissão. Original em inglês

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