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Criado pela Mundukide, uma ONG do País Basco parceira do MST, o brinquedo está à venda na internet pelo preço nada solidário de R$ 250.
Criado pela Mundukide, uma ONG do País Basco parceira do MST, o brinquedo está à venda na internet pelo preço nada solidário de R$ 250.| Foto: Paulo Polzonoff Jr./Gazeta do Povo

Há algumas semanas, me impus um desafio lúdico-jornalístico: testar o jogo de tabuleiro ‘Rumo à Reforma Agrária Popular!’, lançado pelo MST em comemoração aos 40 anos da fundação do movimento.

O primeiro passo, obviamente, foi adquirir o produto, à venda somente pela internet, no site da livraria Expressão Popular.

A loja virtual é especializada em obras de esquerda, com títulos como ‘Ocupar Escolas, Ocupar Terras’, ‘Educação e Marxismo Latino-americano’, ‘Ho Chi Minh: Textos Escolhidos’ e ‘Lula e a Política da Astúcia’, entre outros

Pelo preço nada solidário de R$ 250 (mais o valor do frete), arrematei o brinquedo e esperei sua chegada. E até que veio rápido, em menos de uma semana.

Criado pela Mundukide, uma ONG do País Basco parceira do MST, ‘Rumo à Reforma Agrária Popular!’ é tecnicamente bem feito.

Parece um daqueles jogos antigos, produzidos com um material resistente que em nada lembra o papelão molenga dos atuais.

Mas vamos ao test-drive.

Para jogar, são necessários no mínimo três participantes, todos acima de 8 anos de idade. Minhas cobaias foram os colegas de Gazeta do Povo Jones Rossi e Paulo Polzonoff Jr.

Anfitrião do certame, Polzonoff nos recebeu à brasileira, com churrasquinho e cerveja. No entanto, sentimos que ainda faltava alguma coisa para completar o clima.

Era a trilha sonora. Rapidamente descobrimos uma playlist temática dos sem-terra no Spotify e, aí sim, tínhamos a ambientação perfeita.

E dá-lhe Chico Buarque, Caetano Veloso, Geraldo Vandré, Elis Regina e afins durante a hora e meia seguinte.

Aliás, ‘Rumo à Reforma Agrária Popular!’ foi definido pela imprensa como o “Banco Imobiliário do MST” na época de seu lançamento.

Na verdade, está mais para outro clássico do gênero, o Jogo da Vida – pela sua concepção e, principalmente, duração (o troço levou uma vida para acabar).

O posto de “guardião das regras” ficou com Jones, que leu atentamente o livreto, cujo texto mais parece o roteiro de um esquete de humor.

“O objetivo do jogo é que toda a companheirada chegue à reforma agrária popular sem deixar ninguém para trás e com o maior número de sementes para semear o futuro”, diz o manual (a propósito, a palavra “companheirada” aparece infinitas vezes).

De acordo com a regra, “Começa quem plantou uma árvore mais recentemente”. Jones lembrou do pé de alguma coisa que semeou na infância e deu a largada na longa jornada.

Antes, porém, cada companheiro recebeu sua “peça de assentamento” (uma casinha colorida) e uma “cartela de forças”, para depositar as sementes adquiridas ao longo da partida e as chamadas “cartas de conquista”.

Estas últimas devem ser sacadas quando surge alguma ameaça. Como ordens de despejo, julgamentos, ataques extremistas a acampamentos, ações de grupos paramilitares, etc.

O pior de todos os perigos, contudo, é o “Período autoritário – 2019” (em referência ao ano da posse do ex-presidente Jair Bolsonaro).

Só não entendemos por que essa casa tem a cor negra, afinal se trata de um brinquedo politicamente correto (há, inclusive, referências aos assentados da comunidade LGBT).

Jogo conta a história do movimento e termina da forma que o repórter mais temia

Posicionado à direita de Jones, Polzonoff sintomaticamente demonstrou dificuldade em obedecer o sentido horário. Mas fomos firmes com ele e seguimos jogando o dado sempre pela esquerda.

A maioria das cerca de 120 casas do tabuleiro representa um episódio da história do MST.

Exemplos: “1979 – Ocupação das granjas Macali e Brilhante (RS)”, “1989 – Assassinato de Olívio Albani”, “1996 – Massacre de Eldorado de Carajás (PA)”. “2023 – Retomada de Democracia: eleição de Lula como presidente do Brasil”.

Tive muito azar com o dado, e acabei ficando para trás desde o início. Mas isso não me atrapalhou, pois há um limite de sementes a ser armazenado por cada companheiro, e as que sobram são distribuídas para os demais.

Além do mais, há várias casas que representam os congressos nacionais do movimento. Quem parar nelas, fica impedido de jogar para esperar os retardatários.

Ou seja, mesmo capengando pelo tabuleiro durante toda a partida, não fui mal. Pelo contrário.

No finalzinho, tirei no dado meu único seis da noite e acabei chegando primeiro na última casa, a tão sonhada “Reforma Agrária Popular” (antecedida pela fictícia “Brasil vira agroecológico: agrotóxicos são proibidos por lei” – o que certamente mataria de fome mais da metade da população do país).

Mas calma... Não me sagrei vencedor.

Segundo o manual, aconteceu o que eu mais temia. “O jogo termina em vitória se toda a companheirada chegar à casa ‘Reforma Agrária Popular’ com sementes.”

Como ninguém estava zerado, pois a ordem era compartilhar a produção excedente, os três encerraram a caminhada de lutas como campeões.

O socialismo não é mesmo maravilhoso?

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