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Dr. Raj Panjabi, diretor-executivo da Last Mile Health, instituição de caridade que envia trabalhadores de saúde comunitários para alguns dos cantos mais remotos da África. Panjabi, que ensina na Harvard Medical School, planeja usar um Prêmio TED de US$ 1 milhão e outro US$ 1,25 milhão que veio com seu Prêmio Skoll para Empreendedorismo Social para financiar o treinamento de profissionais de saúde comunitários na Libéria e em outros países em desenvolvimento. | KAYANA SZYMCZAK/NYT
Dr. Raj Panjabi, diretor-executivo da Last Mile Health, instituição de caridade que envia trabalhadores de saúde comunitários para alguns dos cantos mais remotos da África. Panjabi, que ensina na Harvard Medical School, planeja usar um Prêmio TED de US$ 1 milhão e outro US$ 1,25 milhão que veio com seu Prêmio Skoll para Empreendedorismo Social para financiar o treinamento de profissionais de saúde comunitários na Libéria e em outros países em desenvolvimento.| Foto: KAYANA SZYMCZAK/NYT

O dr. Raj Panjabi, 36 anos, é um dos fundadores e diretor executivo da Last Mile Health, entidade de caridade que leva atendimento médico aos rincões mais remotos da Libéria.

No começo deste ano, ele recebeu os prêmios Skoll para empreendedorismo social – honra no valor de US$ 1,25 milhão – e o TED (US$ 1 milhão). Professor da Faculdade de Medicina de Harvard, Panjabi pretende usar o dinheiro para financiar o treinamento de agentes comunitários de saúde na Libéria e em outros países em desenvolvimento. 

Nós conversamos durante três horas em seu escritório em Boston. Uma versão editada e resumida dessa conversa pode ser lida a seguir. 

Por que a organização se chama Last Mile Health (saúde da última milha)? 

Porque existe um bilhão de pessoas pelo mundo morando em comunidades tão distantes dos serviços de saúde que podem morrer de doenças das quais ninguém precisa morrer. 

Elas moram em pequenos povoados isolados que nenhum médico ou enfermeiro visita. Estão além da "última milha" do sistema de saúde organizado. Na Libéria, estive em distritos onde as pessoas caminhavam durante dois dias para chegar a uma clínica. 

Para resolver isso, estamos nos associando com o governo liberiano para criar um modelo no qual leigos desses vilarejos rurais são contratados para atuar como agentes comunitários de saúde. Nós ensinamos a eles cerca de 30 práticas que podem salvar vidas. 

Então, lhes damos mochilas com suprimentos médicos e smartphones conectados a enfermeiros de clínicas. Via telefone, os profissionais supervisionam e ensinam. 

Uma pergunta óbvia: por que é importante fazer isso? 

A primeira razão é moral: por que deveríamos deixar alguém morrer de uma doença que não mata as outras pessoas. 

Também existem motivos econômicos e de segurança.

Os pontos cegos no serviço de saúde rural podem se tornar centros de doenças. A epidemia de ebola de 2013-14 começou numa região isolada de Guiné. O paciente zero foi um garoto chamado Emile. 

A enfermidade se espalhou rapidamente e não foi detectada porque as primeiras vítimas estavam longe demais do alcance da saúde pública. Em questão de três meses, ela atravessou fronteiras e entrou nas cidades. Nós perdemos 11 mil pessoas na Guiné, Serra Leoa e Libéria. 

O senhor diz "nós" – o senhor é africano? 

Eu nasci em Monróvia, a capital da Libéria. Não sou cidadão. Meus pais são da Índia. Quando eu tinha nove anos, estourou a guerra civil. O exército rebelde de Charles Taylor marchou sobre Monróvia. Algumas embaixadas estrangeiras organizaram voos de fuga. Minha mãe fez a mala. 

No aeroporto, os estrangeiros foram separados dos liberianos e puderam embarcar nos aviões que partiam; os liberianos, não. Minha família e eu fomos colocados no compartimento de carga de um velho avião militar. A escotilha ficou aberta e eu pude ver os outros liberianos, incluindo soldados, tentando escapar. 

Nunca vou me esquecer de como foi abandonar essas pessoas na pista de decolagem. 

Aonde sua família foi? 

Primeiro para Serra Leoa. Por fim, terminamos em High Point, Carolina do Norte, EUA, onde uma família nos abrigou. Minha irmã e eu crescemos como adolescentes norte-americanos comuns. Estudei na Universidade da Carolina do Norte. O plano era estudar Medicina e trabalhar em High Point. 

Então, aconteceu o 11 de setembro. Isso trouxe lembranças da Libéria e me fez pensar nas raízes do extremismo. Também li o livro de Paul Farmer, "Pathologies of Power" (patologias do poder), que me fez perceber que a medicina poderia ser uma forma de transpor a desigualdade, uma das causas do extremismo. 

Logo, eu estava repensando meu futuro. Queria voltar à África Ocidental para encontrar uma forma de atender aqueles que deixei para trás. 

Como o senhor fez isso acontecer? 

Comecei pesquisando programas que haviam levado atendimento médico às zonas rurais pobres. Enquanto estudava medicina, fui ao Alasca, onde o Community Health Aide Program permitiu o acesso às áreas mais remotas. Eles conseguiram isso treinando moradores para oferecer serviços de saúde. 

Então, em 2005, levei minha então noiva, Amisha Raja, agora minha esposa, para conhecer o lugar onde nasci. Após a guerra civil, havia 51 médicos no país inteiro. Nós dois fomos voluntários em uma clínica rural. 

O primeiro paciente que vi, um recém-nascido, morreu de pneumonia nos meus braços. Eu nunca tinha visto algo do gênero. A mãe morava longe demais da clínica para ter acesso ao atendimento pré-natal. 

Quando voltei aos Estados Unidos, escrevi uma proposta para fundar uma clínica baseada no que observei no Alasca. Amisha e eu levantamos os fundos para a Last Mile Health em nosso casamento. Em vez de lista de presentes, pedimos doações em dinheiro. 

Nós conseguimos US$ 6 mil, o suficiente para contratar e formar 30 agentes comunitários de saúde. Agora, temos mais de 500 trabalhando diretamente para nós. 

Houve alguma resistência ao fazer isso? 

Não do governo. O ministro da Saúde foi positivo. A Libéria era então governada por Ellen Johnson Sirleaf, primeira mulher eleita presidente na África, e ela estava aberta a novas ideias. Com outros parceiros, a Last Mile Health agora dá suporte ao governo auxiliando a treinar dois mil de seus agentes de saúde. 

Entretanto, a retórica geral entre os profissionais locais era a de não ser possível levar saúde às zonas rurais – então, por que tentar? O que esses críticos não reconheciam era como as novas tecnologias haviam mudado as coisas. 

Os smartphones podem ligar trabalhadores leigos a enfermeiros supervisores em clínicas que podem orientá-los sobre o que eles estão vendo. Existem aplicativos agora que ajudam a diagnosticar doenças – ao menos em casos simples. 

Por exemplo, uma criança em uma vila tem falta de ar. Existe um relógio que ajuda a contar o número de respirações. Se estiver acima de 50 por minuto, pode significar pneumonia. A agente comunitária de saúde tem antibióticos na mochila. 

Uma vida que poderia ter se perdido pode ser salva. 

O que mais há na mochila da Last Mile? 

Um termômetro digital para checar febre, aparelho de pressão arterial para examinar mulheres grávidas, zinco para desidratação, kits de teste para malária. 

Agora, isso é uma novidade.

Temos um kit de exame que custa US$1 e que pode ser levado a qualquer lugar e ser utilizado sem eletricidade.

Em 15 minutos, ele consegue dizer se o paciente tem malária. Antes disso, o exame somente poderia ser feito por uma pessoa treinada. 

O senhor se considera liberiano? 

Bem, aquele lugar me deu muito: a sensação de propósito e sentido, mas eu sou um cidadão norte-americano. 

Sempre penso que parte do que aprendi na Libéria sobre aumentar o acesso ao atendimento médico se aplica aos EUA. Nós perdemos muitos lugares onde os agentes comunitários de saúde ajudariam. Pense em quanta dor existe nas regiões rurais dos Estados Unidos sem médicos. 

Na Carolina do Norte, pessoas morrem de coisas das quais não precisariam morrer.

Dr. Raj Panjabi, diretor-executivo da Last Mile HealthKAYANA SZYMCZAK/NYT
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