
Ouça este conteúdo
Um novo passo na ciência pode significar o fim da espera por um transplante de órgão. A criação de "miniórgãos" em laboratório acaba de alcançar um nível inédito.
Cientistas conseguiram criar órgãos em miniatura em versões cada vez mais aprimoradas. Em avanço recente, os chamados organoides formaram vasos sanguíneos próprios desde os estágios iniciais. A pesquisa foi publicada na revista Nature.
“Esses modelos demonstram, de fato, o poder desta abordagem”, afirmou Oscar Abilez, pesquisador da Universidade de Stanford (EUA) e um dos autores do artigo em entrevista à Nature.
VEJA TAMBÉM:
O que são os miniórgãos e como eles "ganharam vida"?
Os organoides são simulações em 3D do coração, fígado, pulmões e intestino, desenvolvidas para substituir testes em animais. Pesquisadores alcançaram níveis de perfeição inéditos.
Utilizados por anos em testes de medicamentos e pesquisas, em substituição àqueles realizados com animais, os organoides tradicionais não continham os vasos para transporte de oxigênio e nutrientes. Por esse motivo, seu tamanho, funcionalidade e amadurecimento eram limitados.
As primeiras tentativas para vascularizar os miniórgãos envolviam o cultivo de tecidos de vasos em uma placa, combinando-os com outros tipos de células para formar estruturas chamadas de “assembloides”. No entanto, esses modelos apresentavam limitações de estrutura e maturidade.

Órgãos, como os rins, necessitam de vasos para filtrar o sangue e produzir urina com vestígios das trocas celulares. Já os pulmões dependem deles para a troca de gases.
A partir de células-tronco pluripotentes, que são capazes de se transformar em qualquer tipo de célula, os pesquisadores induziram as células a formarem vasos ao mesmo tempo que o tecido dos órgãos. A descoberta é um avanço na medicina.
A descoberta foi feita de forma casual, em meio a testes
A nova técnica surgiu por acaso: enquanto cultivavam células epiteliais (que revestem os órgãos), vários grupos – como o da Universidade de Michigan – notaram que os organoides formaram espontaneamente células de vasos sanguíneos. Antes consideradas “contaminantes indesejáveis”, essas células passaram a ser estimuladas para se transformarem em órgãos em miniatura intestinais.
Quando transplantados para roedores, os organoides de pulmão amadureceram e formaram diversos tipos de células, inclusive as típicas dos alvéolos – as estruturas onde a troca gasosa acontece. Em 3D, as células recriaram espontaneamente sacos alveolares, indicando que a presença de vasos permitiu o desenvolvimento de tecidos mais complexos.
Técnicas similares foram empregadas para criar organismos de intestino, coração e fígado. No caso do coração, os miniórgãos continham músculos, vasos e até células nervosas. Os vasos, inclusive, ramificaram-se em tubos finíssimos que penetravam outros tecidos do simulacro de “coração” primitivo. Os organoides hepáticos também demonstraram uma rica rede vascular.
Ainda não há uma regulação específica que envolva esse tipo de descoberta, pensadas para sanar problemas de propriedade, consentimento e proteção de dados.
Algumas regulamentações relacionadas a material genético de origem humana estabelecem que a propriedade pode pertencer ao doador ou ao laboratório, conforme informações da National Library of Medicine.
Apesar dos avanços, esses modelos representam apenas os estágios iniciais. Para que funcionem como órgãos reais, será necessário o desenvolvimento de vasos sanguíneos maiores, tecidos de suporte e até vasos linfáticos – que são responsáveis por drenar fluidos e eliminar resíduos.
Ou seja, as pesquisas ainda têm um longo caminho a percorrer antes de gerar órgãos próprios para transplante.



