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A família imperial russa em 1913. Da esquerda para a direita: Olga, Maria, Nicolau II, Alexandra Feodorovna, Anastásia, Alexei e Tatiana | Wikipedia/ Domínio Público
A família imperial russa em 1913. Da esquerda para a direita: Olga, Maria, Nicolau II, Alexandra Feodorovna, Anastásia, Alexei e Tatiana| Foto: Wikipedia/ Domínio Público

Vivemos numa era moralmente confusa – poucas pessoas discordariam disso. 

A maioria de nós entende o que é certo e errado. Mas, se fôssemos pressionados a explicar por que acreditamos no que acreditamos, desconfio que haveria muitos olhares perplexos e respostas incoerentes. 

Justificando o assassinato 

Boa parte disso pode ser atribuída à ascensão do emotivismo, filosofia segundo a qual todos os juízos de valor (mesmo este) não passam muito de expressões de preferência ou sentimento, especialmente quando são juízos morais. 

 

Entretanto, mesmo que essa seja uma filosofia à qual muitas pessoas hoje adiram em princípio, elas a rejeitam na prática, como já notou o filósofo Alasdair Macintyre. Por exemplo, poucas pessoas concordariam que a afirmação “o assassinato é errado” não passa de uma preferência. A maioria das pessoas aceita esse postulado como verdade moral, mesmo que não consiga explicar exatamente por quê. 

A ideia do homicídio justificado intriga tanto grandes pensadores quanto pessoas desonestas há gerações. O assassinato como um bem utilitário é o elemento central da trama da obra-prima de Dostoiévski “Crime e Castigo”, por exemplo, uma das maiores obras literárias psicológicas já escrita. 

A decisão de Raskolnikov de assassinar uma idosa, dona de uma loja de penhores, se deve à sua ideia de que os homens excepcionais não são regidos pelas mesmas convenções morais que os homens comuns. É uma filosofia moral que Dostoiévski rejeita, mas suas ideias sobre as justificativas utilitaristas do assassinato – de que esse crime poderia ser um ato moral, desde que conduzisse a um bem maior – foram prescientes. 

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Um pouco mais de meio século mais tarde, em sua obra “A Moral Deles e a Nossa”, o revolucionário comunista Leon Trótski, um assassino em massa, explicou por que sob certas circunstâncias o homicídio se justifica – chega até a ser racional. 

“Um meio apenas pode se justificar por seu fim. Mas esse fim, por sua vez, precisa ser justificado”, escreveu Trótski. “Do ponto de vista marxista, que expressa os interesses históricos do proletariado, o fim se justifica se levar ao aumento do poder do homem sobre a natureza e à abolição do poder do homem sobre o homem.” 

Ele prosseguiu: 

Em primeiro e irredutível lugar, a moral revolucionária rejeita a servilidade em relação à burguesia e a arrogância em relação aos trabalhadores, ou seja, rejeita as características das quais são profundamente imbuídos os pedantes e moralistas pequenos burgueses. 

É claro que esses critérios não oferecem uma resposta pronta à pergunta sobre o que é permissível ou não em cada caso distinto. Não pode haver tais respostas automáticas. Os problemas da moral revolucionária estão fundidos com os problemas da estratégia e tática revolucionárias. 

Sob essa filosofia, fez sentido perfeito que Trótski ordenasse a morte dos filhos do czar Nicolau II – Olga Nikolaevna, Tatiana Nikolaevna, Maria Nikolaevna, Anastásia Nikolaevna e o czarevich Alexei Nikolaevich –, que foi o que ele fez. 

“Foi correto (como diz Trótski em outro lugar) matar os filhos do czar porque foi politicamente justificado”, escreveu o filósofo e historiador polonês Leszek Kolakowski em seu livro “As Principais Correntes do Marxismo”. 

Os fins versus os meios 

Trótski acabou caindo no desagrado de Stalin (um fenômeno nada incomum). Em consequência disso, seus dois filhos foram mortos nos expurgos de Stalin, uma atrocidade que Trótski condenou. 

“Por que, então, foi errado Stalin assassinar os filhos de Trótski?” indagou Kolakowski. “Porque Stalin não representava o proletariado.” 

Os assassinatos cometidos por Trótski foram justificados porque ele estava verdadeiramente do lado do proletariado, vocês entendem, sendo que Stalin apenas se fazia passar por defensor dos trabalhadores. 

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Uma filosofia moral como essa teria sido vista como insana pela maioria das pessoas ao longo da história humana – como é vista por muitas hoje –, mas é fruto de várias vertentes de filosofia moderna que percorrem nossa cultura: emotivismo, relativismo moral e utilitarismo. 

A lição a tirar de tudo isso? Pergunte-se por que você acredita no que acredita. E cuidado com as pessoas que procuram justificar seus meios apenas pelos fins que alcançam. 

Jonathan Miltimore é editor gerente da FEE.org

Tradução por Clara Allain

©2018 Foundation for Economic Education. Publicado com permissão. Original em inglês

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