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Disparidades regionais

Quanto seu estado recebe de volta dos impostos enviados ao governo federal

Se de um lado, a cada real pago por São Paulo ao país, apenas 7 centavos retornam ao estado, de outro, o mesmo real enviado à União pelo Amapá rende outros R$ 3,97 de volta
Se de um lado, a cada real pago por São Paulo ao país, apenas 7 centavos retornam ao estado, de outro, o mesmo real enviado à União pelo Amapá rende outros R$ 3,97 de volta (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

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Os 27 estados brasileiros enviaram R$ 2,218 trilhões em impostos ao governo federal, no ano passado, mas só receberam de volta (em repasses feitos pela União aos governos municipais e estaduais) R$ 607,8 bilhões, o que representa pouco mais de um quarto do total arrecadado em tributos federais. Um levantamento feito pela Gazeta do Povo mostra que, em 2022, 15 estados pagaram mais ao governo federal do que receberam. O cruzamento dos dados da Receita Federal com os da Controladoria Geral da União (CGU) aponta disparidades regionais, com as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste pagando mais, e Nordeste e Norte recebendo mais. Se de um lado, a cada real pago por São Paulo ao país, apenas 7 centavos retornam ao estado, de outro, o mesmo real enviado à União pelo Amapá rende outros R$ 3,97 de volta.

Para chegar aos valores pagos pelos estados ao governo federal, foram somados todos os tributos federais arrecadados mensalmente por Unidade da Federação em 2022. Os dados são disponibilizados publicamente pela Receita Federal, que administra parte desses recursos. Já os repasses recebidos por municípios e diretamente pelos estados estão publicados no Portal da Transparência da CGU. Uma análise completa com todos os dados de pagamentos e recebimentos está disponível em um infográfico no fim desta reportagem.

Em termos absolutos, São Paulo é o estado que mais paga impostos federais: somente no ano passado, foram R$ 830 bilhões. Em seguida, aparecem o Rio de Janeiro (R$ 447 bi), Distrito Federal (R$ 158 bi), Minas Gerais (R$ 141 bi), Santa Catarina (R$ 107 bi), Rio Grande do Sul (R$ 102,8 bi) e Paraná (R$ 100 bi). Na outra ponta, entre os que menos pagam, estão  Amapá (R$ 1,79 bi), Roraima (R$ 1,8 bi) Acre (R$ 2 bi), Tocantins (R$ 4,8 bi), Rondônia (R$ 5,63), Sergipe (R$ 6,4 bi) e Piauí (R$ 6,7 bi).

Embora em termos absolutos o Rio de Janeiro tenha sido o estado que mais recebeu repasses federais em 2022 (foram R$ 69 bilhões), proporcionalmente o território fluminense está no top 3 do prejuízo: para cada real pago, apenas R$ 0,16 voltaram. Entre o Rio e São Paulo, neste ranking, está Santa Catarina, que recebeu somente R$ 0,13 por real pago. Já o Acre, embora tenha recebido o menor volume total (R$ 7,2 bi), na proporção é o segundo mais beneficiado: a cada real pago em tributos federais, outros R$ 3,58 voltaram ao estado. Roraima completa o top 3 dos lucradores, com R$ 1 valendo R$ 3,36 de volta.

Na região Norte, apenas o Amazonas aparece como estado pagador (foram R$ 21,8 bi pagos e R$ 12,6 bi recebidos, o que teria gerado um saldo negativo de R$ 9 bilhões). Porém, na opinião do economista Erik Alencar de Figueiredo, diretor-executivo do Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (do governo de Goiás) e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a grande isenção de impostos federais da Zona Franca de Manaus deveria ser computada entre os repasses ao estado, o que o colocaria em uma posição mais privilegiada.

Já o economista Leandro Roque, do Instituto Ludwig von Mises Brasil, um think tank que produz e difunde estudos econômicos voltados aos princípios do livre mercado, faz outra ressalva em relação ao Distrito Federal. Em artigo analisando os resultados da série histórica de 2009, ele classifica o resultado negativo do DF como uma “enorme distorção”. “O DF, como é sabido, possui a maior concentração de funcionários públicos federais – incluindo-se aí os nobres membros do congresso e dos ministérios – por quilômetro quadrado. Quando o dinheiro do salário deles (que vem de todo o Brasil) cai em suas contas bancárias, o imposto de renda retido na fonte é contabilizado como arrecadação federal. O mesmo é válido para o imposto de renda pago por todas as estatais, inclusive BB e CEF, que possuem sede em Brasília”, explica.

Em 2022, segundo dados da Receita e da CGU, o Distrito Federal pagou R$ 158 bilhões em tributos ao governo federal e recebeu R$ 38 bilhões, ficando com R$ 120 bilhões negativos. “O dinheiro que é espoliado de todo o resto do Brasil vai para o DF, cai na conta dos funcionários públicos e políticos e, em decorrência do IR que estes pagam, uma parte desse mesmo dinheiro é contabilizada como carga tributária que o DF paga ao governo federal”, detalha Roque.

Além disso, os repasses feitos ao DF são bastante volumosos e estão entre os maiores em termos absolutos, perdendo apenas para Rio de Janeiro (R$ 69 bi), São Paulo (R$ 59 bi) e Bahia (R$ 45 bi). Somente os dois primeiros, juntos, mandaram quase R$ 1,3 trilhão à União no ano passado.

Reprodução do erro ano a ano 

Analisando os dados, Figueiredo acentua como ano a ano os números se mantêm praticamente estáveis, chamando a atenção para como os indicadores sociais de estados com saldo positivo em recebimentos do governo federal “nunca mudam”. “A superação do subdesenvolvimento se dá a partir do trabalho, produção, produtividade e geração de emprego”, defende.

“Essa análise esbarra na visão federativa, que é vigente, a da redução da desigualdade. Dirão que a distribuição é assim justamente por causa das desigualdades regionais”, afirma o economista, chamando a atenção para como uma reforma tributária que centralize mais a arrecadação pode aprofundar o problema.

“O governo quer centralizar a arrecadação e distribuir para estados. A distribuição visa aprofundar ainda mais esses locais inviáveis. Em resumo, a pergunta é: vão continuar tirando dos que produzem mais? Eles querem continuar com esse modelo aí. Tirando do Paraná, Goiás, São Paulo, etc. e mandando para Maranhão, Piauí, Paraíba. E mais, colocando no bolo o ICMS, que é do estado e não do governo federal”, critica Figueiredo. “Diante dos resultados de pobreza, desigualdade entre outros indicadores não apresentarem avanços, vemos a reprodução do erro ano a ano”, completa.

São Paulo “burro de carga” 

Em junho do ano passado, o então governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), reclamou, em entrevista ao podcast Flow, do montante pago ao governo federal, dizendo que o estado deixou de ser a “locomotiva” do Brasil e passou a ser o “burro de carga”, destinando boa parte de sua arrecadação a “estados mais pobres”. Em 2021, segundo Garcia, o estado recebeu “15 vezes menos do que a gente manda”, beneficiando “estados pobres como Maranhão, Piauí e Acre”.

Na ocasião, o tucano reclamou do pacto federativo, estabelecido pela Constituição de 1988, como “não justo”. "Esse pacto federativo precisa ser revisto, continuando pensando numa federação, mas precisa ser menos injusto, porque os estados mais desenvolvidos, organizados, são penalizados, recebem menos", disse.

Estados e municípios inviáveis 

Em artigo publicado pela Gazeta do Povo, o empresário Edson José Ramon, presidente do Instituto Democracia e Liberdade (IDL) e ex-presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), critica a proliferação de estados e municípios incapazes de “sustentar a burocracia local por meio de tributos extraídos de empresas e cidadãos lá estabelecidos”, passando a depender de repasses federais. Assim, a realocação de recursos, “que deveria acontecer somente para amenizar fatores conjunturais”, no Brasil acaba suportando indefinidamente “estruturas políticas e burocráticas ineficientes e, muitas vezes, postas a serviço de fins privados”.

“O ideal é que o desenho da Federação brasileira fosse adaptado ao tamanho das economias regionais, ou seja, com a extinção de vários municípios e a transformação de alguns estados em territórios subordinados à administração direta da União. Isso permitiria a economia de gastos desnecessários, aliviando os brutais encargos que desorganizam a produção da riqueza”, defende.

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