A organização Black Lives Matter removeu de seu site oficial uma página que incluía um texto condenando a "estrutura familiar nuclear prescrita pelo Ocidente".
A página, intitulada "Em Que Acreditamos", incluía várias posições políticas sem nenhuma relação aos casos de violência policial ou reforma da estrutura da Polícia. O jornal Washington Examiner descobriu no fim de setembro que a página havia sido removida:
"Página não encontrada. Desculpe, mas a página que você estava tentando acessar não existe", diz agora a página.
No entanto, o site Wayback Machine -- que permite visualizar versões antigas de sites da internet -- arquivou a página onde havia uma longa descrição dos princípios e objetivos da organização. Entre as opiniões expressas está o desejo de "romper" com a estrutura familiar tradicional:
“Nós rompemos com a exigência de estrutura familiar nuclear prescrita pelo Ocidente, apoiando-nos uns aos outros como famílias extensas e ‘aldeias’ onde se cuidam coletivamente uns dos outros, especialmente nossos filhos, na medida em que mães, pais e filhos estejam confortáveis”.
De acordo com o Examiner, o BLM não respondeu ao pedido de comentário do jornal, por isso não está claro se a página foi ou não deliberadamente removida.
Seja qual for o caso, o endosso do BLM a este tipo de argumento não é exatamente uma grande surpresa. Como Brad Polumbo mostrou, há efetivamente dois fenômenos black lives matter: a organização Black Lives Matter™️ e o movimento informal que quer mostrar que as “vidas negras importam”.
Este último envolve pessoas que lutam de boa-fé pela reforma policial, que acreditam que afro-americanos sofrem desproporcionalmente com a violência policial. A primeira, Black Lives Matter™️, é uma organização co-fundada por Patrisse Cullors, Alicia Garza, e Opal Tometi que tem raízes no marxismo.
“Na verdade, temos um viés ideológico”, disse Cullors sobre sua organização em 2015. “Somos marxistas treinadas. Somos super versadas em, tipo, teorias ideológicas”.
Como apontei em um artigo de 2017, Karl Marx estava interessado em abolir muito mais do que apenas o conceito de propriedade privada. No Manifesto Comunista, Marx e Frederick Engels defendem as tentativas dos comunistas de abolir a família tradicional.
“Abolição [Aufhebung] da família! Até mesmo os mais radicais ficam em estado de cólera por esta infame proposta dos comunistas”, escreveu Marx. “Em que fundação é baseada a família atual, a família burguesa? Sobre o capital, o ganho privado. Em sua forma completamente desenvolvida, essa família só existe entre a burguesia”.
Marx e Engels começaram a comparar a família nuclear com a prostituição pública, antes de explicar por que era natural e desejável que essa instituição “desaparecesse”.
“A família burguesa desaparecerá naturalmente quando seu complemento desaparecer, e ambos desaparecerão com o desaparecimento do capital”, escreveram Marx e Engels.
“A armadilha burguesa sobre a família e a educação, sobre a santificada correlação de pais e filhos, torna-se ainda mais repugnante, quanto mais, pela ação da Indústria Moderna, todos os laços familiares entre os proletários são rasgados, e seus filhos transformados em simples artigos de comércio e instrumentos de trabalho”, complementam.
E de onde vem toda essa hostilidade à família? Marx e Engels nos oferecem algumas pistas.
“A família moderna contém as sementes não apenas da escravidão (servitus), mas também da servidão, já que desde o início está relacionada aos serviços agrícolas”, escreveu Engels em A Origem da Família, Propriedade Privada e do Estado, citando Marx. “Ela guarda amostras em miniatura de todas as contradições que depois se estenderão por toda a sociedade e seu Estado.”
A hostilidade à família tradicional, no entanto, não morreu com Marx e Engels. Um dos primeiros passos que os bolcheviques deram após tomar o poder foi iniciar uma luta de décadas para abolir o casamento e enfraquecer a família tradicional.
“A questão era tão central para o programa revolucionário que os bolcheviques publicaram decretos estabelecendo regras para o casamento civil e o divórcio logo após a Revolução de Outubro, em dezembro de 1917”, escreveu a historiadora Lauren Kaminsky. “Esses primeiros passos foram destinados a substituir as leis familiares da Rússia por um novo marco legal que incentivaria relações sexuais e sociais mais igualitárias”.
Um artigo de 1926 do The Atlantic, escrito por uma mulher que vivia na Rússia na época, descreve esses esforços em detalhes. O termo “filhos ilegítimos” foi abolido, e foi aprovada uma lei que permitia que casais se divorciassem em “questão de minutos”.
A legislação foi introduzida para eliminar distinções entre esposas legais e amantes, incluindo a concessão de direitos de propriedade mesmo aos parceiros que não fossem casados.
“O resultado foi o caos”, escreveu a russa. “Os homens mudavam de esposa com o mesmo entusiasmo que demonstravam ao beber a recém-restaurada vodka com 40% de teor alcoólico”.
Cerca de meio século depois, o Partido Comunista Chinês introduziu uma versão diferente da orquestração familiar imposta pelo Estado. É “política do filho único” (que vigorou entre os anos de 1979 e 2015), a política de planejamento populacional mais extrema da história mundial, que impôs limites ao número de crianças que as famílias chinesas poderiam ter.
Décadas antes da política entrar em vigor, o presidente do partido, Mao Tsé-Tung (1893-1976), explicou por que era necessário que o Estado gerenciasse a procriação familiar e o estoque de potenciais trabalhadores.
“A (re)produção precisa ser planejada. Na minha opinião, a humanidade é completamente incapaz de se controlar”, disse Mao. “Existem planos de produção em fábricas, de produção de tecidos, mesas e cadeiras e aço, mas não há um plano para a produção humana. Isso é anarquismo — sem governo, sem organização e sem regras.”
Ainda hoje, a aversão à família tradicional continua forte entre os socialistas. Um artigo de 2019 no The Nation intitulado “Quer Desmantelar o Capitalismo? É Só Abolir a Família” oferece um vislumbre da crítica socialista moderna da instituição.
“Sabemos que a casa privada nuclear é onde a esmagadora maioria dos abusos pode acontecer”, explica a autora Sophie Lewis. “E depois há toda a questão de quais são seus objetivos: nos treinar para sermos trabalhadores, nos treinar para sermos habitantes de um sistema racialmente estratificado e de gênero binário, treinando-nos para não sermos gays.”
Para aqueles que acreditam de verdade no coletivismo, há pouca dúvida de que assuntos familiares privados também são assuntos de Estado.
O socialismo requer controle coletivo dos recursos, e os humanos são o mais importante dos recursos. É por isso que a família nuclear tradicional, que coloca autoridade nas mãos dos pais e não da comunidade, é uma afronta a tantos socialistas.
O estudioso Robert Nisbet explica que a família é um dos três pilares de autoridade fora do Estado, juntamente com a igreja e organizações civis. Todas essas três instituições oferecem aos humanos algo essencial para a experiência humana: a comunidade.
Nisbet acreditava que esses três pilares serviram como importantes contrapontos ao poder político centralizado, e é por isso que Nisbet viu o declínio da família, da igreja e das organizações civis na América como um mau presságio para a liberdade.
“A busca pela comunidade é um impulso que provém da natureza humana. Todos anseiam por participação e por um sentimento de pertencimento dentro de uma causa ou corpo maior do que a única pessoa”, escreveu Nisbet em A Busca pela Comunidade: Um Estudo sobre a Ética e a Ordem da Liberdade, de 1953. “Se o desejo pela comunidade não pode ser preenchido na igreja, na família, no bairro ou na localidade, então ele será preenchido pelo Estado central.”
Não está claro por que a organização Black Lives Matter™️ apagou o texto sobre a família anti-nuclear em seu site. O que está claro, no entanto, é que seu objetivo anteriormente declarado de “romper com a estrutura familiar nuclear prescrita pelo Ocidente” se encaixa num paradigma marxista que se estende por um século e meio.
Talvez a página removida reflita uma mudança de opinião. Por outro lado, poderia ser simplesmente uma tática para esconder suas raízes marxistas.
Como Dan Sanchez e eu escrevemos em um artigo recente da FEE, nas últimas décadas aqueles que defendem e divulgam o socialismo têm mostrado uma tendência a evitar o rótulo de marxistas, mesmo abraçando os ideais de Karl Marx.
“Há muitas pessoas que não querem se chamar de marxistas”, disse Eugene D. Genovese, um eminente acadêmico marxista, ao The New York Times em um artigo de 1989 sobre a integração do marxismo nas universidades dos EUA.
Não sabemos ao certo por que muitos indivíduos e grupos que defendem doutrinas enraizadas no marxismo tendem a rejeitar o rótulo de marxista — a confissão de Cullors em 2015 de que ela e Garza são “marxistas treinadas” parece ser um erro de franqueza — mas parece provável que os adeptos descobriram uma verdade básica observada pelo escritor Upton Sinclair.
“O povo americano até beberá do socialismo, mas ele não aceitará seu rótulo”, observou Sinclair em uma correspondência privada de 1951 com o colega socialista Norman Thomas.
Muitas pessoas e organizações de boa-fé apoiam o movimento que prega que as vidas negras importam porque acreditam que todas as pessoas merecem tratamento igual e o devido processo legal.
Mas os americanos devem ter cuidado para não confundir o movimento mais amplo sobre a importância das vidas negras com a Black Lives Matter™️, uma organização cujos objetivos podem ser antitéticos e contra a liberdade e a família — mesmo que eles não o digam mais.
Jonathan Miltimore é editor do FEE.org.
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