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O que o Sermão da Montanha nos ensina sobre o “adultério do coração”

Detalhe do quadro "O Sermão da Montanha" (1877), do pintor dinamarquës Carl Bloch.
Detalhe do quadro "O Sermão da Montanha" (1877), do pintor dinamarquës Carl Bloch. (Foto: Wikimedia Commons)

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Em um mundo obcecado por excessos, o teólogo e pastor americano Rich Villodas desafia a lógica dominante com um convite inspirador: trocar a busca desenfreada por prazer imediato pela jornada de integridade proposta por Jesus.

No livro “O Caminho Estreito” (editora Mundo Cristão), Villodas revisita o Sermão da Montanha para mostrar como os ensinamentos de Cristo, longe de serem restrições, são portas para uma vida autêntica, marcada por paz, alegria e conexão profunda com Deus.

O trecho que você vai ler a seguir aborda um dos temas mais urgentes da obra: o cuidado com os relacionamentos íntimos em tempos de pornografia e envolvimentos descartáveis.

Jesus não dá um parecer definitivo para todas as perguntas que temos com relação à ética sexual, mas ele é claro quando diz que Deus se importa profundamente com os desejos e com a maneira como lidamos com eles. O que fazemos com nossos desejos sexuais está ligado ao nosso relacionamento com Jesus.

Sei como isso pode parecer estrito, mas Jesus está nos conduzindo a uma parte bela do caminho estreito onde, em vez de usarmos uns aos outros com lascívia, amamos uns aos outros com pureza e bondade. Dentro de todos nós, desejamos esse tipo de vida — uma vida que seja livre, fiel e repleta de frutos.

Infelizmente, nosso mundo transforma o sexo em uma mercadoria de uma maneira que explora e objetifica os outros, e é por isso que — como veremos a seguir — Jesus critica veementemente a ética sexual de sua época (e a nossa também).

Como de costume, Jesus não se preocupa apenas com o comportamento, mas chega à raiz do problema. Em uma cultura antiga que desaprova o adultério, ele sabe que alguém, tecnicamente, pode nunca cometer adultério ao mesmo tempo que abriga todo tipo de cobiça no coração e na mente.

Ao transformar o adultério em um pecado interior, não apenas exterior, ele fala com todos os que nutrem a cobiça, sejam solteiros ou casados:

Vocês ouviram o que foi dito: “Não cometa adultério”. Eu, porém, lhes digo que quem olhar para uma mulher com cobiça já cometeu adultério com ela em seu coração. (Mateus 5.27-28)

Em nossa era de smartphones dominados pela pornografia, Jesus compara o olhar cobiçoso ao adultério! Quem nunca deu esse tipo de olhar nos dias de hoje? Como se isso já não fosse bastante forte, Jesus leva a questão para outro nível:

Se o olho direito o leva a pecar, arranque-o e jogue-o fora. É melhor perder uma parte do corpo que ser todo ele lançado no inferno. E, se a mão direita o leva a pecar, corte-a e jogue-a fora. É melhor perder uma parte do corpo que ser todo ele lançado no inferno. (Mateus 5.29-30)

A traição mais profunda

O adultério é uma traição, talvez a mais profunda. Quando duas pessoas fazem votos uma à outra diante de Deus e de uma comunidade, elas prometem amar a outra durante as alegrias e dificuldades da vida.

Nos casamentos cristãos, nós nos casamos não apenas em uma igreja, mas para a igreja. Em outras palavras, nosso amor está exposto para todos, apontando as pessoas para o compromisso apaixonado de Deus com a igreja e com o mundo em geral.

Jesus menciona tudo isso, mas depois vai além. Ele apresenta o caminho estreito de resistir ao adultério do coração. Ele nos chama a confrontar nossa cobiça

Jesus sabe que a maioria das pessoas, tanto naquela época quanto agora, diria: “Eu cumpri esse mandamento. Não cometi adultério. Não dormi com ninguém fora do meu casamento”. Ou, se não formos casados, simplesmente ignoramos essa parte.

Mas calma aí! Jesus nos lembra novamente de que pertencer a ele e viver em seu reino significa que nossos desejos, pensamentos e intenções devem ser moldados por seu amor.

No Sermão do Monte, o conceito de cobiça é semelhante ao de ira: ambos podem ser silenciosamente alimentados no coração, corrompendo a alma, mesmo que não evoluam para adultério ou assassinato de fato.

Quando Jesus diz: “Quem olhar com desejo”, ele não está se referindo a uma atração passageira; ele quer dizer alimentar intencionalmente uma fantasia ilícita. Enquanto houver cobiça, o amor não pode estar presente.

Cobiça tem a ver com consumo. Amor tem a ver com comunhão.

Cobiça tem a ver com tomar. Amor tem a ver com dar.

A cobiça usa. O amor honra.

A cobiça diminui o outro. O amor valoriza o outro.

Fomos criados por Deus para desfrutar de comunhão uns com os outros. Fomos criados por Deus para ter relacionamentos caracterizados por dignidade e respeito.

Tragicamente, vivemos em uma sociedade em que a norma é consumir os outros para nosso próprio prazer. Assim, somos moldados para satisfazer nossos desejos como e quando quisermos.

Somos condicionados a acreditar que os relacionamentos são apenas um meio para um fim sexualmente satisfatório. Essa é uma realidade perigosa que predomina em nossos dias.

Pessoas "digissexuais"

Por causa do impacto da pornografia em nossa cultura, somos condicionados a criar relacionamentos imaginários que afetam negativamente nossa capacidade de ter uma conexão genuína com os outros. Observe estas estatísticas impressionantes:

• Os sites de pornografia recebem mais tráfego mensal do que Netflix, Amazon e X juntos.

• 35% de todos os downloads da internet estão relacionados à pornografia.

• 34% dos usuários da internet foram expostos a pornografia indesejada por meio de anúncios ou pop-ups.

• Pelo menos “30% de todos os dados transferidos pela internet são de pornografia”.

De acordo com um estudo, “Para adolescentes e jovens adultos, não reciclar é mais imoral do que ver pornografia”. E o problema se torna ainda mais complicado à medida que a tecnologia avança.

No Journal of Sexual and Relationship Therapy [“Jornal de terapia sexual e relacionamentos”], pesquisadores no Canadá prenunciaram que estamos caminhando para um dia (e talvez já estejamos lá) em que “alguns preferirão ter relacionamentos amorosos com robôs sexuais em vez de seres humanos”. O dr. Neil McArthur, professor de Filosofia e diretor do Centro de Ética Profissional e Aplicada na Universidade de Manitoba, escreveu:

É plausível dizer que chegou a era do sexo virtual imersivo […] À medida que avançam, essas tecnologias serão cada vez mais adotadas, e muitas pessoas passarão a se identificar como “digissexuais” — pessoas cuja principal identidade sexual se dá por meio do uso da tecnologia. Muitas pessoas descobrirão que suas experiências com essa tecnologia se tornarão parte integrante de sua identidade sexual, e algumas preferirão essas experiências às interações sexuais diretas com outros seres humanos.

Esses avanços tecnológicos revelam que, cada vez mais, a cultura vê o sexo mais como uma mercadoria a ser consumida do que como um convite a amar bem outro ser humano. Essa distinção — entre consumo e comunhão — é fundamental para entendermos o caminho estreito de Jesus.

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Conteúdo editado por: Omar Godoy

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