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Solenidade de posse do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), José Múcio Monteiro Filho, e da vice-presidente da Corte, Ana Lucia Arraes Alencar, na sede do TCU.
Solenidade de posse do presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), José Múcio Monteiro Filho, e da vice-presidente da Corte, Ana Lucia Arraes Alencar, na sede do TCU.| Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Os Estados maquiaram R$ 11,4 bilhões em gastos em 2018. Segundo o Tesouro Nacional, ao criarem uma espécie de "orçamento paralelo", eles distorceram a transparência dos números, isto é, esconderam a verdadeira situação fiscal dos governos estaduais.

Chama a atenção o fato de os Tribunais de Contas estaduais ainda não terem feito nada a respeito disso, apesar de serem os responsáveis por analisar as contas.

O sistema de fiscalização conta ainda com o Tribunal de Contas da União (TCU), que tem nove ministros e analisa a prestação de contas da Presidência, do Congresso e de todos os órgãos ligados à administração pública, como autarquias, agências reguladoras e estatais. O parecer do TCU serviu como base para a denúncia de fraude fiscal que motivou o impeachment da então presidente Dilma Rousseff em 2015, por exemplo.

Esses órgãos são responsáveis por examinar as despesas dos agentes públicos e apontar irregularidades e superfaturamentos em obras e serviços. Em outras palavras, eles tentam evitar que recursos públicos sejam desperdiçados. Eventuais pareceres negativos podem resultar, inclusive, na inelegibilidade de governadores e prefeitos, de acordo com a Lei da Ficha Limpa.

Em teoria, os Tribunais de Contas são órgãos independentes e autônomos para fiscalizar os agentes públicos e suas despesas. Mas a prática no Brasil é bem diferente.

Independência de fachada

As auditorias dos Tribunais de Contas já chancelaram o que se tornaram diversos escândalos de corrupção. Exemplo disso são ex-governadores atualmente investigados pela Operação Lava Jato por beneficiarem empreiteiras ao fraudarem licitações e superfaturarem obras que tiveram as contas anteriormente aprovadas pelos Tribunais de Contas de seus estados. É o caso dos tucanos Aécio Neves e Beto Richa, além de Sérgio Cabral (PMDB).

No caso do Rio de Janeiro, investigações apuram uma denúncia que envolve cinco dos sete conselheiros do TCE-RJ. Eles teriam recebido propina para aprovar contas irregulares de obras públicas.

Além disso, 12 estados do país estão em situação fiscal delicada, segundo o Tesouro Nacional. No primeiro trimestre deste ano, cinco deles, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Goiás parcelaram os salários dos servidores. A atuação dos tribunais de contas se mostrou ineficiente para impedir a irresponsabilidade fiscal.

Cheio de parentes

Como o processo de nomeação dos conselheiros é predominantemente político, quando o mesmo grupo comanda o Executivo por vários ciclos eleitorais os tribunais de contas correm o risco de serem aparelhados.

Dois terços das indicações aos tribunais são feitas pelo Poder Legislativo e o terço restante pelo Poder Executivo. Há ainda uma cota constitucional para membros do Ministério Público ou servidores de carreira, mas essa cota nem sempre é respeitada. Em 2016, apenas 22% de todos os conselheiros do país eram promotores ou auditores — catorze conselheiros a menos do que determina a Constituição.

O requisito para a indicação é a idoneidade moral e o notável conhecimento jurídico, contábil, econômico, financeiro ou de administração pública. Na prática, um levantamento de 2017 feito pela ONG Transparência Brasil apontou que 80% dos conselheiros dos tribunais de contas estaduais são ex-políticos - ex-deputados, ex-secretários, ex-senadores, etc.

Os Tribunais de Contas também estão cheios de parentes de pessoas influentes dentro da política local. Segundo o mesmo levantamento, 31% de todos os conselheiros em 2016 tinham sido indicados ao cargo pelos próprios primos, tios ou irmãos governadores. No caso do TCE-RN, seis dos sete conselheiros tinham parentes na política naquele ano.

Além disso, uma pesquisa de 2014 feita pela ONG Transparência Brasil apontou que 44 dos 189 conselheiros dos tribunais de contas estaduais respondiam ações na Justiça. Entre eles, havia acusados de corrupção, falsidade ideológica, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, além de um condenado por homicídio.

Isto é, quase um quarto dos conselheiros respondiam por crimes enquanto eram pagos para evitá-los.

Mais de R$ 70 mil por mês

Os cargos de conselheiros dos tribunais de contas são muito bem remunerados. Com penduricalhos, a remuneração deles supera o limite constitucional de R$ 39,2 mil. Um exemplo ocorre no Tribunal de Contas de Mato Grosso, que paga um vale-livro que em janeiro chegou a R$ 70,9 mil. Além do cargo vitalício, os conselheiros têm direito a carro com motorista, diárias e, em alguns estados, verba para aluguel, 14º e 15º salários.

O orçamento dos tribunais de contas chega a representar até 87% do orçamento da Assembleia Legislativa, como ocorreu no Rio de Janeiro em 2014. O Tribunal de Contas consumiu, naquele ano, R$ 593 milhões do orçamento de R$ 681,5 milhões. Já no Amazonas, o TCE custou, no mesmo ano, R$ 185,6 milhões, sendo que a Assembleia do Estado tinha orçamento de R$ 222,8 milhões. Isto é, o TCE consumiu 83% do total.

Como funciona em outros países

Nos Estados Unidos o órgão similar ao Tribunal de Contas é o General Accountability Office, o GAO. O responsável é apontado por uma comissão que indica ao menos três pessoas para o cargo, dentre as quais o Presidente da República escolhe um.

Esse nome é sabatinado pelo Senado americano e, se confirmado, o conselheiro assume o cargo por 15 anos.

No Reino Unido, o órgão é o National Audit Office (NAO) - um desmembramento da Casa dos Comuns. Há atualmente 796 servidores no NAO. Eles são independentes do governo e não se subordinam a nenhum ministro. O responsável pelo NAO é escolhido em conjunto pelo Primeiro Ministro e pelo Public Accounts Committee, um comitê ligado à Câmara dos Comuns responsável por fiscalizar os gastos do governo. Essa escolha precisa ser aprovada pelo Parlamento.

Em sua origem, o modelo brasileiro foi inspirado no francês. Na França, o principal responsável do Court of Audit, criado na administração de Napoleão Bonaparte, é apontado pelo Presidente da República. Seu escritório central tem 700 servidores, mas há outros escritórios regionais, o que faz com que o número ao todo chegue a quase 1800 funcionários em todo o país.

Também inspirado no modelo da França, o Tribunal de Contas de Portugal é composto pelo conselheiro-presidente, nomeado pelo Presidente da República para mandato de 4 anos, e 16 juízes conselheiros nomeados a partir de concurso.

PEC propõe mudanças nos Tribunais de Contas

Diante dos problemas apresentados pelos Tribunais de Contas, tramita no Congresso a Proposta de Emenda à Constituição nº 329/2013, de autoria do à época deputado federal Francisco Praciano (PT/AM).

A PEC altera a forma de composição dos tribunais de contas, acrescentando um rol de condições pessoais impostas aos postulantes aos cargos de conselheiros, como ter nível superior nas áreas de Direito, Contabilidade, Economia ou Administração Pública.

Além disso, a PEC submete os Conselheiros e Ministros dos Tribunais de Contas ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ.

Atualmente, a PEC está na Comissão de Constituição e Justiça. Em maio deste ano, ela parecer favorável à sua admissibilidade por seu relator, o deputado Luiz Flávio Gomes (PSB/SP).

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